Memória e transformação: o papel das narrativas na criação artística do Coletivo Estopô Balai*
Memoria y transformación: el papel de las narrativas en la creación artística del Colectivo Estopô Balaio
Memory and transformation: the role of narratives in the artistic creation of the Estopô Balaio Collective
Daniela Mota Silva , José Eduardo Silva
Memória e transformação: o papel das narrativas na criação artística do Coletivo Estopô Balai*
Cuadernos de Música, Artes Visuales y Artes Escénicas, vol. 20, núm. 1, 2025
Pontificia Universidad Javeriana
Daniela Mota Silva 1 danielamotasilva.85@gmail.com
Universidade do Minho, Portugal
José Eduardo Silva jeduardosilva@elach.uminho.pt
Universidade do Minho, Portugal
Recepção: 04 Julho 2024
Aprovação: 17 Setembro 2024
Publicação: 01 Janeiro 2025
Resumo: Narrar um facto ou um acontecimento vivenciado, é refazê-lo dentro de si, reconstruindo caminhos e elevando-o a uma nova perspecti- va. Quando essa narração acontece no contexto da prática artística, abrem-se possibilidades para reconfigurar o passado, criar conexões com o presente e impulsionar o futuro através desta ação. Quando a memória individual é refeita tendo a arte teatral enquanto meio ativador, somos capazes de posicioná-la no contexto da memória coletiva, nos inserindo assim, enquanto sujeitos de uma história par- tilhada. Desta maneira, o artigo presente tem como intenção refletir sobre o trabalho artístico desenvolvido pelo Coletivo Estopô Balaio, grupo teatral residente no bairro do Jardim Romano, na cidade de São Paulo - Brasil. Com mais de 10 anos de atuação no território si- tuado no extremo leste da capital paulista, seus processos criativos são permeados pelas memórias e histórias de vida dos moradores da região, produzindo desta forma novos discursos e reforçando la- ços identitários entre os moradores e o seu bairro. A intenção deste trabalho é ressaltar a importância fundamental das artes, principal- mente aquelas ancoradas nas práticas artísticas comunitárias, para a manutenção e preservação de narrativas alternativas à contínua tendência de homogeneização dos saberes e dos modos de vida. Para isso, serão utilizados como suportes teóricos, a análise da per- formance inscrita sob o signo da Oralitura de Leda Maria Martins e da Escrevivência de Conceição Evaristo, além do conceito de Práti- cas criativas de re-existência cunhado por Adolfo Achinte.
Palavras-chave:práticas artísticas comunitárias, oralitura, escrevivência, práticas criativas de re-existência, memórias, narrativas contra-hegemónicas.
Resumen: Contar un hecho o un acontecimiento vivido es rehacerlo dentro de sí, reconstruyendo caminos y elevándolo a una nueva perspectiva. Cuando ese relato sucede en el contexto de la práctica artística, se abren posibilidades para reconfigurar el pasado, crear conexiones con el presente e impulsar el futuro a través de esta acción. Cuan- do la memoria individual es rehecha teniendo el arte teatral como medio activador, somos capaces de posicionarlo en el contexto de la memoria colectiva, insertándonos así, como sujetos de una his- toria compartida. De esta manera, el presente artículo tiene como intención reflexionar sobre el trabajo artístico desarrollado por el Colectivo Estopô Balaio, grupo teatral residente en el barrio del Jardim Romano, en la ciudad de São Paulo - Brasil. Con más de 10 años de actuación en el territorio situado en el extremo este de la capital paulista, sus procesos creativos son permeados por las memorias y las historias de vida de los habitantes de la región, produciendo de esta forma nuevos discursos y reforzando lazos identitarios entre los habitantes y su barrio. La intención de este trabajo es resaltar la importancia fundamental de las artes, princi- palmente aquellas ancladas en las prácticas artísticas comunitar- ias, para la manutención y preservación de narrativas alternativas a la continua tendencia de la homogenización de los saberes y los modos de vida. Para eso, serán utilizados como soportes teóricos, el análisis del performance inscrito bajo el signo de la Oralitura de Leda Maria Martins y de la Escrevivência de Conceição Eva- risto, además del concepto de Prácticas creativas de re-existênciaacuñado por Adolfo Achinte.
Palabras clave: prácticas artísticas comunitarias, oralitura , escrevivência , prácticas creativas de re-existencia, memórias, narrativas contra-hegemónicas.
Abstract: To recount a fact or a lived event is to remake it within oneself, rebuilding pathways and elevating it to a new perspective. When this recounting happens in the context of artistic practice, possi- bilities open to reconfiguring the past, creating connections with the present, and boosting the future through this action. When individual memory is remade with theatrical art as an activating medium, we can position it in the context of collective memory, thus inserting ourselves as subjects of a shared history. Therefore, this article intends to reflect on the artistic work developed by the Estopô Balaio Collective, a theater group based in the Jardim Romano neighborhood, in São Paulo - Brazil. With over 10 years of performance in the territory located in the east end of the São Paulo’s capital city, their creative processes are permeated by the memories and life stories of the region’s inhabitants, thus pro- ducing new discourses and reinforcing identity ties between the inhabitants and their neighborhood. This work intends to highli- ght the critical importance of the arts, mainly those embedded in community artistic practices, to maintain and preserve alter- native narratives to the continuous tendency of homogenization of knowledge and ways of life. For this purpose, the analysis of the performance under the sign of Leda Maria Martins’ Oralitura and Conceição Evaristo’s Escrevivência will be used as theoretical supports, in addition to the concept of creative practices of re-existence coined by Adolfo Achinte.
Keywords: community artistic practices, oralitura , escrevivência , creative practices of re-existence, memories, counter-hegemonic narratives.
“Nas linhas de cada uma de minhas
mãos correm os rios invisíveis desta
cidade. E em cada rio uma história”
(Texto da atriz Keli Andrade em cena no
espetáculo “A Cidade dos Rios Invisí
veis” do Coletivo Estopô Balaio.)
Introdução
> A memória está inscrita sob o signo da subjetividade e, como tal, difere mediante o contexto em que é narrada, por aquele/a que narra e para quem suas lembranças são dirigidas. Diferentemente da história, que é constituída por factos concretos, escolhidos tendo a luz do passado como guia de análise e de discurso, a memória se encarrega de apresentar uma multiplicidade de vozes que se transformam e se refazem tendo o presente enquanto condutor de suas narrativas. Para Pierre Nora, historiador francês e referência neste campo de estudos, memória e história se opõem uma a outra, em uma relação dialética. Enquanto a primeira está permanentemente em evolução, aberta ao esquecimento e pertencendo ao coletivo, mas também ao indivíduo; a segunda pertence a todos, mas ao mesmo tempo a ninguém, pois a matéria sob a qual é feita está inscrita na legitimação de um passado que não existe mais. Nas palavras do autor:
A memória se enraíza no concreto, no espaço, no gesto, na imagem e no objeto. A história se liga às continuidades temporais, às evoluções e às relações das coisas. A memória é um absoluto e a história só conhece o relativo. (1993, 9)
Apesar de se situarem em instâncias que à primeira vista se mostram tão distintas, tanto a memória quanto a história podem vir a ser importantes elementos de inspiração para a prática artística, em especial para as artes performativas. Dentre elas, por exemplo, a prática do teatro, no seu ecletismo de formas, promove a gramatização e objectivação dos corpos num espaço relacional e interpessoal. Corpos esses que, através da ação, manifestam vivências, memórias e saberes laten- tes que foram sendo incorporados (embodied), como resultado da imersão em diferentes culturas e formas de experienciar o mundo (Silva 2016). Segundo Hans-Thies Lehmann, dado que não há recordação individual independente da colectiva “o teatro constituise como espaço de memória e exibe uma manifesta relação com o tema da historicidade” (2017, 287). O teatro gira em torno da memória, e, esta, é indissociável de uma qualquer espécie de comprometimento entre o indivíduo e o contexto histórico que se enforma. Acresce a isto que, sobretudo na linha de trabalhos teatrais, ditos pós-dramáticos, temos assistido a um aprofundamento da tensão entre o ficcional e o real, constatável através de espetáculos e performances (entre outros objetos estéticos), os quais se utilizam de fatos históricos, memórias de seus intérpretes ou de espaços e situações reais, como elementos poéticos para a criação. Isto acaba ocorrendo como consequência da pluralidade fragmentária que foi tomando conta do teatro depois do desaparecimento do “triângulo drama, ação, imitação” (Fernandes 2010, 44) e, que se acentuou nos finais do século XX. Com a ruptura e a quebra da ilusão da realidade, que os modelos pós-dramáticos vieram a propor, as utilizações do real enquanto referência dramatúrgica e de estilo acabaram trazendo para a cena uma aproximação crítica aos problemas da sociedade, gerando uma relação mais estreita entre o teatro e a comunidade naquilo que o pesquisador Óscar Cornago definiu como “utopias da proximidade” (2010). Ele se utiliza deste termo, que aparece pela primeira vez na obra “Estética Relacional” do crítico francês Nicolas Bourriaud, para definir o que é hoje o material de trabalho do teatro contemporâneo. Segundo o autor:
Hoje a arte - também a arte performativa - fala-nos de pequenas revoluções num tempo de projetos medidos à escala global, a revolução da comunicação face a face, a relação com o outro como conflito - social – é a base da prática cénica e política. A história avança numa contínua redescoberta de si mesma, e a última coisa que o palco parece ter redescoberto é que o que importa não está dentro dele, mas fora, ali em frente ao ator, olhando-o em silêncio 2 . (Cornago 2010,12)
A busca por construir narrativas que dialogassem com as questões reais da sociedade e de seus espectadores fez com que, nas últimas décadas, proliferassem projetos e ações artísticas que, além de utilizarem histórias locais e reais de uma comunidade específica, optassem também por inserir os membros da comunidade na cena poética. Estes tipos de prática são de particular interesse para nós, pois promovem, através da criação artística, a interligação entre atores profissionais e não profissionais, entre actores e não-actores, ou em alguns casos somente entre pessoas da própria comunidade, reunindo um conjunto de origens, contextos, objectivos e subjectividades diversas. Estes fenómenos artísticos se inserem dentro do que é denominado como Práticas Artísticas Comunitárias (Cruz 2022; Matarasso 2019), também recebendo, em alguns lugares, nomes como Teatro Aplicado (Prentki and Abraham 2021), ou Teatro Comunitário/na Comunidade (Coutinho 2010; Ker- shaw 1992; Nogueira 2007), entre outros.
Estas formas de criação teatral têm como base fundamental a noção de arte enquanto recuperação/reconstrução identitária e enquanto processo relacional (Bourriaud 2008). Seus projetos artísticos estão intimamente ligados às histórias locais das comunidades onde estão inseridas (Nogueira 2008) e seus participantes são convocados a partilhar his- tórias e memórias como forma de celebração de suas identidades e como manutenção e preservação dos pensamentos ancestrais de sua comunidade (Adame 2017). Segundo a definição de Baz Kershaw:
Sempre que o ponto de partida [de uma prática teatral] for a natureza de seu público e sua comunidade. Que a estética de suas performances for talhada pela cultura da comunidade e da sua audiência. Neste sentido estas práticas podem ser categorizadas enquanto Teatro na Comunidade 3 . (1992, 5)
Colocar no palco os próprios integrantes da comunidade para narrarem suas histórias, ou mesmo tomar inspiração em suas narrativas de vida e nas memórias do território para a criação de material dramatúrgico de um espetáculo, tem demonstrado ser uma poderosa forma de empoderamento e denúncia de injustiças e entropias sociais, ou seja, um impor- tante acto democrático de participação cívica e política (Silva e Menezes 2016). Para além disso, este tipo de ações enforma modos de reflexão sobre o passado e as memórias sociais de um determinado grupo reconstruindo, entre aqueles que delas partilham, um traço identitário e cultural em comum. Desta forma nos interrogamos: pode a arte dar novos significados às narrativas vividas e, através da ação performativa, inscrever novas memórias no território onde atua? Será capaz de recuperar memórias e saberes de sua população para (re)construir significados coletivos?
Para tentarmos responder a estas questões iremos nos valer da experiência, atuação e criação artística do Coletivo Estopô Balaio, grupo teatral que se instalou na periferia da cidade de São Paulo (Brasil), para exemplificar e ressaltar, o que nos parecem ser boas práticas desenvolvidas pelo grupo no seu contexto local de ação. Destacaremos uma série de processos de criação artística concebidos pelo coletivo, cujas composições dramatúrgicas foram fundamentadas em histórias, memórias e saberes da população, que analisaremos, sob a ótica de dois conceitos diferentes: a Oralitura (Martins 2003) e a Escrevivência (Evaristo 2020). A intenção é refletir sobre a importância do tipo de atuação deste coletivo teatral, que com suas bases ancoradas nas práticas artísticas comunitárias tem vindo a visibilizar as memórias e vivências do território em que se situa. Queremos salientar a relevância destas manifestações artísticas na reinvenção dos lugares de memória (Nora 1993) e na possibilidade de criação de práticas criativas de re-existência (Achinte 2017).
Coletivo Estopô Balaio [de] Criação, Memória e Narrativa
Fundado em 2011 por um grupo de artistas migrantes oriundos da região nordeste do Brasil, o Coletivo Estopô Balaio se instalou no Bairro do Jardim Romano, no extremo leste da cidade de São Paulo. Localizado nos confins da metrópole, o Jardim Romano é o último bairro da cidade fazendo divisa com dois municípios, Itaquaquecetuba e Guarulhos. O bairro é cortado pelo Córrego Três Pontes, que recebe as águas oriundas de seu afluente, o Rio Tietê, e apesar de ficar em um local de proteção ambiental os seus moradores sofrem diariamente com a falta de infraestrutura básica, como água encanada e saneamento, sendo a localidade alvo de constantes cheias e alagamentos provocados pelas inundações do Rio Tietê.
A origem do nome do grupo advém de uma expressão popular nos estados do Nordeste do Brasil e que tem como significado uma grande agonia, a vontade incontrolável de falar sem conseguir se controlar. Nas palavras dos integrantes do grupo: “nesse sentido, quando dizemos que fulano deu o Estopô Balaio é que não se aguentou e estourou” (Balaio 2011). A história dos artistas com o bairro tem início de uma maneira inusitada, uma vez que as crianças do bairro foram as responsáveis pela criação do elo com os moradores da região. Quando o ator Jhoao Junnior, acompanhado pelas atrizes Ana Carolina Marinho e Recy Freire, começaram a ministrar aulas de teatro no CEU Três Pontes, um espaço público que articula diferentes equipamentos educacionais e culturais (como escolas de educação infan- til, quadras de desporto, bibliotecas, teatros, entre outros), começou a haver um primeiro contacto e identificação com as histórias e trajetórias de vida da população daquela região.
As aulas de teatro decorriam dentro do Programa de Iniciação Artística - PIÁ, desenvolvido pela Secretaria de Cultura da cidade de São Paulo e tinham como finalidade promover a iniciação artística de crianças e adolescentes entre os 6 e os 13 anos. Propondo a interação entre participantes, familiares e artistas-educadores, o objetivo do programa de iniciação artística é o desenvolvimento de processos artístico-pedagógicos, tendo a ludicidade e a experimentação como formas de estimular a potência criativa de seus participantes. Através deste projeto teatral se dá a entrada dos artistas no Bairro do Jardim Romano que, por ser uma região formada e constituída, em sua grande maioria, por migrantes oriundos de vários estados da região Nordeste do Brasil, logo fez com que os artistas se vissem, de certa maneira, representados e acolhidos pelos seus conterrâneos. De alguma forma, as histórias de vida de ambos, artistas e moradores, convergiam para um ponto em comum: terem feito a escolha de migrar para “a cidade grande” como possibilidade de encontrar novas oportunidades de crescimento em suas vidas.
É através deste primeiro contacto com as crianças participantes do projeto teatral PIÁ que os artistas passam a estabelecer uma relação com o território. Durante a oficina de teatro as crianças começaram a narrar histórias e situações por si vividas durante a última enchente, ocorrida em 2010, que deixou o bairro alagado durante três meses. Esta grande cheia que assolou o local obrigou os moradores a conviverem com todo o tipo de dificuldades que ela resultaram. Além de terem de se locomover em embarcações improvisadas como portas de frigoríficos ou pedaços de portas de madeira, o contacto indesejado com ratos, cobras e outros animais tornou-se constante. Foi por meio destas narrativas que os artistas enxergaram, neste evento trágico, uma forma de utilizar a arte como elemento poético para a recriação das memórias da população. Nas palavras da atriz Ana Carolina Marinho, fundadora e integrante do Coletivo:
As histórias fabulares contadas pelas crianças de pescaria no asfalto, peixes gigantes que pulavam nas ruas e o barco de porta de geladeira revelavam um dispositivo poderoso de enfrentamento de traumas sociais: a contação de história. O episódio traumático da forte enchente de 2009 para 2010 que durou 3 meses, com a água em algumas ruas a mais de 1m de altura era narrado pelas crianças a partir do olhar da ludicidade. Quase um ano depois, era assim que as crianças olhavam para seu passado: com histórias para contar. E a força destas narrativas nos conduziu na Trilogia das Águas. (2021, s.p.)
O olhar infantil sobre aquela situação dramática, que infelizmente fazia parte do cotidiano daquela comunidade devido às constantes inundações ocorridas no bairro, revelou a capacidade das crianças para lidar com um facto que era, causador de um trauma social, ou seja, a possibilidade concreta de estas memórias poderem ser ressignificadas através da ludicidade. A arte assume assim o papel de reinventora das experiências vividas naquilo que o professor afro-colombiano Adolfo Achinte chama de práticas criativas de re-existência (2017). Para este pesquisador a tarefa deste tipo de prática artística é transformar aquilo que foi silenciado “em algo significativo para as comunidades, de tal maneira que a re-existência epistémica e cultural não fique só nos processos de visibilização, mas possa consolidar um projeto político que construa poderes locais democráticos e participativos. 4 ” (2017, 55)
É através deste primeiro contacto com as trajetórias dos moradores da região que os artistas percebem um chamado que os uniu àquele território: a memória migrante nordestina aliada às enchentes que assolavam o Jardim Romano os convocava a mergulharem nas narrativas daquela população. O contacto com uma moradora específica, Keli Andrade, foi fundamental para que essa relação se instaurasse de maneira efetiva. Por já ter uma experiência amadora prévia com teatro, e também por estar inserida na comunidade, ela passa a ser uma importante ponte entre os artistas e os moradores. É ela que, através de sua fala em uma das conversas com Jhoao Junnior, traz para o coletivo a imagem que iria ser fundamental para a construção da simbologia e do imaginário que acompanhariam o grupo nesta nova empreitada artística: Água, Lama e Pó.
A Trilogia das Águas – Narrativas ancoradas na resiliência.
A arte, por estar inscrita no campo do sensível, é capaz de gerar significados que nos ajudam a adquirir novas capacidades para lidar com as nossas questões pessoais e novos significantes para interagir com o mundo exterior de forma mais empoderada. Através destes novos significados e significantes passamos a ter a capacidade de olhar para a realidade e, intervir nela para a modificar (Achinte 2017). As práticas artísticas geradas dentro de processos que têm o teatro e comunidade como alicerce, procuram assumir o sujeito como criador e dono da sua narrativa, ou seja, protagonista de sua própria história. Desta forma, promovem um olhar crítico que procura visibilizar as condições socioculturais em sua totalidade, levando em consideração diferentes aspectos identitários como: género, diversidade étnica, cultural e política.
Antes de os artistas terem passado a compartilhar o território com os moradores do Jardim Romano, eles adentraram no local como estrangeiros, estando situados no limite fronteiriço entre personagens-visitantes e indivíduos-conterrâneos. Compartilhavam com os habitantes uma memória social que era comum a todos enquanto sujeitos-migrantes, mas estavam distantes da realidade precária concreta vivida por aqueles moradores. Cientes destas questões e por serem possuidores de um olhar sobre a arte com o viés comunitário e participativo, procuraram se colocar em posição de escuta, abrindo seus sentidos para aquilo que a comunidade tinha para dizer. Neste exercício ouviram dos moradores narrativas que versavam sobre suas experiências de vida, sobre a chegada em São Paulo, sobre as dificuldades enfrentadas nesta cidade grande que os empurra para suas margens e os invisibiliza enquanto protagonistas da sua própria história. É neste contexto de escuta e reflexão que a moradora e participante do Coletivo Estopô Balaio, Keli Andrade diz: “na minha vida sempre teve três atos: água, lama e pó” (Junnior 2021).
Resolvendo utilizar esta analogia para a criação artística, o grupo se lançou em uma pesquisa que envolveu uma coleta de narrativas dos moradores sobre a enchente que tinha assolado o bairro no ano anterior. Unindo, na dramaturgia, as memórias fantásticas das crianças, e os relatos reais dos moradores do bairro, nasceu, em 2012, o primeiro espetáculo do Coletivo: Daqui a Pouco o Peixe Pula. A água era a personagem principal da dramaturgia e permeava todos os relatos contados pelos artistas-moradores. O processo artístico uniu os integrantes da comunidade (crianças, jovens e adultos do bairro) aos artistas-estran- geiros, na direção e parte técnica em um processo de construção colaborativa que teve como eixo central o teatro enquanto meio de intervenção social e política. Nas palavras do diretor Jhoao Junnior:
O espetáculo foi concebido para espaços públicos, pois esta água se derramou sobre ruas e calçadas e as crianças ficavam às margens das águas esperando os peixes pularem para serem pescados. As ruas agora eram o espaço de intervenção do teatro que estava naquele contexto disputando uma parte do imaginário dos moradores do bairro que era permeado pelas águas da enchente. (2021, s.p.)
Podemos dizer que, por meio da performance, ocorre um processo de transformação das narrativas pessoais daqueles que atuam. Sobre os seus corpos, carregados de memórias vividas, inscrevem-se agora novas vivências e lembranças geradas durante o movimento de construção criativa. As memórias pessoais e sociais passam a ser corporificadas e, neste movimento relacional, o corpo se assume enquanto corpo-tela (L. M. Martins 2021) gramatizando-se em novos gestos performáticos que exprimem e ampliam saberes e sentidos. Este gesto não é simplesmente uma representação mimética, com um sentido narrativo ou descritivo, ele vem carregado de performatividade e de oralidade transformando-se em Oralitura. Segundo a professora Leda Maria Martins no cerne deste conceito está a ideia de que a inscrição cultural de um povo ou coletivo, não estaria somente na “letra caligrafada no papel” (2003, 77) mas em todas as manifestações performáticas produzidas pelo corpo. Ainda neste sentido, a autora nos diz que a representação performática destes gestos pela voz e pelo corpo contém na matriz do termo:
a inscrição cultural que, como letra (littera) cliva a enunciação do sujeito e de sua coletividade, sublinhando ainda no termo seu valor de litura, rasura da linguagem, alteração significante, constitutiva da alteridade dos sujeitos, das culturas e de suas representações simbólicas. (1997, 21)
A memória dos saberes se inscreveria assim sem nenhum tipo de hierarquia dos sentidos, sendo todos eles necessários para a manutenção dos pensamentos e narrativas daquela coletividade. Abrindo-se a estas novas memórias e saberes que estavam a surgir do contacto entre o teatro e a comunidade, o Coletivo Estopô Balaio decidiu na montagem seguinte colocar o enfoque da sua pesquisa nas memórias pessoais de seus moradores. Deslocando-se do espaço público da rua para o espaço privado do lar, a intenção agora era não só trabalhar a memória social do bairro em torno dos alagamentos (a visão coletiva do acontecimento), mas também trazer as perspectivas da memória individual dos habitantes sobre o mesmo. Pensando na metáfora da água, da lama e do pó, neste momento a água que invadiu as casas já havia abaixado sobrando naquele cenário somente a lama, que borrou e alterou as vivências daqueles indivíduos. Desta maneira o grupo se encaminhou para a construção do seu segundo espetáculo: O que sobrou do rio, que teve a sua estreia em 2013 nas ruas do bairro e que tinha como intenção “mergulhar na memória privada da enchente através da imagem da casa. Assim, foi criada uma instalação cénica a partir da imagem de uma casa do bairro composta por cómodos que representavam alguns moradores”. (Junnior 2021)
Este espetáculo une os artistas-residentes e os artistas-estrangeiros todos em cima do mesmo palco, diluindo as barreiras entre os artistas e a comunidade, passando a gerar uma maior aproximação entre eles. Partindo do mesmo princípio da coleta das memórias e narrativas dos moradores do bairro para a construção de uma dramaturgia, a questão levantada pelo grupo neste espetáculo é: como é que a casa, que foi profanada pelas águas, ainda conseguiria manter sua essência de abrigo e proteção? Como é que, o lar, se manteria num local capaz de prover segurança física, emocional e existencial, depois que o rio que transbordou o invadiu? Foi na tentativa de responder a estas perguntas que se construiu a dramaturgia e logo o espetáculo tornouse um sucesso no bairro. Nas palavras da atriz Ana Carolina Marinho:
A partilha do palco entre todos nós virou um acontecimento no bairro. Com uma caixa de som e um microfone acoplado em carros e bicicletas, convidávamos os moradores para ouvirem as suas histórias transformadas em teatro, para ver seus parentes e amigos no palco. A plateia estava sempre lotada. (2021, s.p.)
Com estes dois primeiros espetáculos o teatro foi se firmando na comunidade como um importante espaço de reflexão, de crítica e de análise social da realidade vivida por aquelas pessoas. Com a crescente necessidade de se estar em contato com os moradores, os integrantes do grupo sentiram que já não era possível estar ali no bairro somente como visitantes convidados e inauguraram, no Jardim Romano, a Casa Balaio, espaço artístico e educacional que tinha como intuito ser a sede da companhia, mas também um espaço de capacitação e criação para a comunidade. Dentro da Casa Balaio passaram a desenvolver uma intensa programação artística, que se mantém ativa até hoje, com sessões de cinema, oficinas culturais, saraus, shows musicais entre outras atividades. A proposta era interligar os diferentes saberes criativos que a comunidade já possuía (como a arte do graffiti, a música dos rappers, as danças de rua, entre outros), com a prática do teatro e das artes performativas. É possível perceber que, com estas ações e atividades, o grupo se posiciona ativamente, não apenas enquanto construtor de memórias individuais e colectivas, mas também enquanto gerador de novos discursos, impulsionando e mobilizando a comunidade, em um movimento de expansão de sua realidade, através de seus espaços de discussão contra a exclusão social, as carências sociais, a racialização e a violência genocida do estado a que está submetida. Neste sentido, as práticas artísticas comunitárias se mostram um “território propício para dar lugar à configuração de novas representações que dinamizam e ativam processos e políticas nos domínios da vida social e da instituição artística 5 ”. (Achinte 2017, 47)
Um fator que começa a gerar incômodo nos integrantes do grupo, agora já formado tanto pelos artistas migrantes quanto por integrantes da comunidade, é a dificuldade de se inserir nas programações culturais convencionais promovidas por espaços e teatros no centro da capital, ou mesmo para conseguir colocar seus espetáculos e o Jardim Romano nos roteiros teatrais. Por estarem situados no extremo da cidade, havia uma grande dificuldade em atrair público, que fosse de locais para lá das fronteiras do bairro, para assistir às suas peças e é a partir desta adversidade que surge a ideia para o próximo espectáculo da companhia, que viria a fechar a Trilogia das Águas: A cidade dos rios invisíveis.
A peça foi inspirada no livro As Cidades Invisíveis de Italo Calvino e teve a sua estreia em 2014. Utilizando o elemento pó, como metáfora, o grupo procurou refletir sobre esta água que invadiu o bairro, tornou-se lama, e por fim secou, sendo levada pelo vento, como pó. Será que este pó carregou consigo as marcas destas memórias traumáticas? O que ficou no corpo-tela depois desta experiência de trauma social? Ao refletir sobre este corpo era necessário lançar um olhar sobre a cidade e sobre os moradores que vivem nesta região da periferia. Foi procurando refletir sobre estas questões que a dramaturgia da peça recuperou elementos dos outros dois espetáculos feitos anteriormente, para construir uma peça itinerante que conduziria os espectadores do centro da cidade, (estação Brás 6 ), até o Jardim Romano, tendo a cidade e os vagões do trem como cenário. O público é rececionado pelos atores na estação central e, juntos, partem em uma viagem-espetáculo rumo ao bairro por meio de uma dramaturgia sonora transmitida em fones de ouvido e dispositivos de mp3. Esta abordagem refletia sobre a rotina de viagem destes corpos-periféricos presentes nos vagões e nas paisagens observadas através das janelas do trem.
Chegando ao Jardim Romano, a segunda parte da peça explora o bairro e sua vida cotidiana conduzindo o público até as margens do rio denunciando as dificuldades e problemas enfrentados pelos moradores. Tanto o vagão do trem, como as ruas do bairro e o rio se convertem em palco e cenário para o convívio e partilha do sensível, tornando-se assim “umbrais transformadores” (Caballero 2011, 38), já que a ação teatral neste caso convoca os espectadores à reflexão sobre a precariedade a que o bairro e as pessoas que lá vivem estão expostas, iluminando estes dramas sociais por meio da ação liminar do teatro.
A experiência adquirida na construção da Trilogia das Águas aprofundou as bases do trabalho artístico do grupo fazendo com que se refletisse sobre o tipo de arte que se estava produzindo e suas implicações conceptuais e sociais. Neste sentido três eixos centrais se destacam e parecem estruturar os processos criativos do grupo:
O teatro como espaço para documentar a memória, através da coleta das memórias sociais do bairro e das narrativas individuais dos moradores;
A gestão e produção de seus processos criativos tendo as Práticas Artísticas Comunitárias como condutoras do percurso;
A utilização de espaços alternativos para a apresentação artística, tendo a cidade e o bairro como cenário e suporte de criação.
Partindo da investigação destes três elementos centrais e imbuídos das experiências vividas principalmente com sua última criação As cidades dos rios invisíveis, os elementos do grupo partem em busca de alargar o diálogo entre as margens em que estão situados (o Jardim Romano) e o centro da cidade de São Paulo, estabelecendo, entre ambos os locais, cruzamentos e fraturas. É desta necessidade de se falar de outras memórias, de outros corpos-migrantes que também habitam o “continente São Paulo”, que surge uma nova trilogia: Nos Trilhos abertos de um Leste Migrante sobre o qual falaremos mais a seguir.
Escrevivência – a escrita de si como lugar de reconstrução da memória
A busca por encontrar alguma poesia no meio da selva de concreto, de desigualdades e da desesperança que habita uma cidade tão grande como São Paulo, pode parecer, a princípio, uma tarefa hercúlea, destinada somente aos loucos ou neste caso, aos artistas. Mas encontrar este olhar poético tendo as narrativas de vida de uma população, que, só na cidade de São Paulo conta, com mais de 11 milhões de habitantes, pareceu ao Coletivo Estopô Balaio um desafio quase antropológico e uma oportunidade para se repensar a cidade e seus moradores. Foi por isso que durante três anos, uma vez por semana, os integrantes do coletivo se dirigiam às estações de trem da cidade para oferecer um serviço à população: a escrita e o envio de cartas, de forma gratuita, para qualquer lugar do mundo. Não importando para quem fosse e para onde fosse, a intenção desta ação era aprofundar a relação e o diálogo com o outro através da escrita de si.
Esta atividade recebeu o nome de Ateliê de Memória e Narrativa e passou a ser o objeto de investigação criativa do grupo através dos personagens/pessoas que foram se apresentando a eles ao longo deste caminho. Durante todo o processo criativo, inúmeras cartas foram escritas e diversas histórias de vida foram sendo narradas, desde aquelas que contavam sobre grandes amores perdidos, até outras que falavam sobre histórias de arrependimentos e lágrimas e, principalmente, histórias que descreviam a saudade da sua terra natal e a dureza em se viver na cidade grande. A escrita, neste caso, tem como função estabelecer uma relação de diálogo direto com a memória, sendo um retorno a ela, mas também a continuação de sua narrativa através das atualizações do presente daquele que narra num processo de afirmação identitária. Para o sociólogo Michael Pollak a memória seria um fenómeno que se constrói tanto individualmente quanto socialmente, sendo fundamental para a construção da nossa identidade e para “o sentimento de continuidade e coerência de uma pessoa ou de um grupo em sua reconstrução de si” (1992, 204).
Este processo de recolha de narrativas deu origem a três espetáculos diferentes: Carta 1: A infância, promessa de mãe. Carta 2: A vida adulta, a mulher e Carta 3: A Velhice, o artista. Todos estes espectáculos foram estreados no ano de 2017, tendo sempre a história de vida de uma pessoa como protagonista e como elemento de inspiração para a criação teatral. A proposta da dramaturgia era ir ao encontro destas personagens-remetentes (neste caso Martha, Janaína e Seu Vital), e conhecer um pouco sobre suas histórias de vida e sobre como suas lembranças se misturavam com a história e a memória social da cidade de São Paulo e também da América Latina. Nos dois primeiros espetáculos Carta 3 e Carta 2 o público é guiado através de um áudio-guia pelas linhas 10 e 11 da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos - CPTM, partindo da estação Brás e com destino a Rio Grande da Serra e Guaianases, respetivamente. Utilizando-se da cidade como cenário e palco para as narrativas contadas, o grupo convida os espectadores a refletirem sobre o processo migratório e sobre como os acontecimentos políticos e sociais do país influenciam a nossa jornada individual, principalmente, em relação ao impacto que a cidade tem nas nossas vidas e nas nossas subjetividades.
No espetáculo que abre o tríptico Carta 3: A Velhice, o artista ficamos a conhecer a narrativa de vida do Seu Vital, um senhor de 74 anos que migrou do estado de Minas Gerais para São Paulo em busca de melhores condições de vida. Seu sonho sempre foi ser músico e tocar sanfona, mas por conta das dificuldades da vida se viu obrigado a abandonar a ideia, tendo ido trabalhar na indústria metalúrgica, em uma época que o movimento sindical e operário era bastante forte e ativo na cidade de São Paulo. Em cena, o Sr. Vital traz à tona suas memórias como metalúrgico, sua juventude e os desafios da terceira idade. Saindo da estação Brás com rumo a Rio Grande da Serra, o trem exibe diversas paisagens pela janela, incluindo fábricas abandonadas e locomotivas antigas, revelando a dinâmica urbana dos anos 60. Os cursos enlameados dos rios ao longo do percurso evocam sua infância, levando a reflexões sobre Mariana, sua cidade natal, e sobre o Rio Doce, vítima do movi- mento predatório da mineração e daqueles que se consideram proprietários das águas. Em meio às preocupações sobre o envelhecimento, o Sr. Vital levanta questionamentos acerca da restrição dos idosos em casas de repouso, privados de liberdade e de poder de decisão sobre os seus próprios destinos.
Em seguida ficamos a conhecer a história de Janaína, uma nordestina nascida no estado de Pernambuco, que é a personagem principal da Carta 2: A vida adulta, a mulher. Aos 15 anos, a jovem foi entregue a um homem que se tornou seu marido e com quem viveu durante 18 anos, enfrentando um relacionamento abusivo que a sujeitou a diferentes tipos de violências. O desejo de comemorar os 15 anos, uma idade simbólica, foi abruptamente interrompido pela imposição de uma maturidade precoce sobre si. Motivada pelos seus filhos, Janaína finalmente conseguiu se libertar desse relacionamento tóxico e se mudou para São Paulo, trazendo consigo uma bagagem repleta de sonhos. Após seis anos na cidade, ela encontrou um novo propósito como segurança na estação central da CPTM, no Brás. O Coletivo Estopô Balaio elaborou a ideia de recriar a festa de 15 anos que Janaína nunca teve, porém, no local que ela escolheu: a estação de trem onde trabalha. Neste local inusitado, o público testemunha a metáfora da transformação da jovem em mulher, mas desta vez celebrando com uma festa. A jornada, que parte da estação Brás com destino a Guaianases, tem como objetivo buscar um bolo de aniversário para a festa improvisada na estação de trem, aberta a todos os presentes.
A peça que encerra a trilogia Carta 1: A infância, Promessa de Mãe, conta a história da imigrante Martha Zelaya, trabalhadora da indústria têxtil, e de seu filho Erick. Depois de sair da Bolívia e perder o contacto com a sua família, Martha faz a promessa de não cortar os cabelos de seu filho até o conseguir levar para conhecer a sua família na sua terra natal. Este espetáculo foi o primeiro que o grupo concebeu para ser apresentado em teatros convencionais, e tinha no elenco os protagonistas das cartas Martha e Erick, juntamente com outros integrantes do Coletivo. A proposta do grupo era refletir sobre as dificuldades enfrentadas pelos inúmeros imigrantes latino-americanos que vivem na cidade de São Paulo: das promessas de lucro fácil e de enriquecimento no Brasil, à dura realidade de trabalho, análogo a escravidão, nas lojas e fábricas de roupas na região central da cidade.
Os três espetáculos optam por narrar as trajetórias individuais de seus personagens tendo a cidade de São Paulo como coadjuvante de suas narrativas. A malha viária da capital é cenário para estes encontros efémeros entre o público e o coletivo de artistas simulando o fluxo migratório a que os autores das cartas foram submetidos. Neste vai e vem de milhões de pessoas, que cruzam diariamente os transportes públicos da cidade, somos convidados a ampliar o olhar e enxergar na cidade e em seus habitantes narrativas que se cruzam e se aproximam gerando um ato poético onde antes só existia cegueira e indiferença. Este ato de narrar sobre si, mas que reverbera na narrativa do outro, que o Coletivo Estopô Balaio propõe com esta trilogia, vai ao encontro do conceito de Escrevivência proposto pela autora Conceição Evaristo, como forma de “borrar o passado através do ato da escrita” (2020, 30).
A expressão Escrevivência combina os vocábulos “escrever e vivência” e está relacionada com a ideia de abrir espaço para as memórias do cotidiano que são silenciadas, nomeadamente, quando estas se referem a sujeitos que são invisibilizados e desconsiderados enquanto narradores da sua própria história. O termo se destaca por sua estreita relação com a oralidade, mesclando o passado com o presente, e também experiências individuais com as coletivas. Mais do que uma escrita que se encerra no indivíduo, a Escrevivência carrega em si a vivência de toda uma comunidade. Estas vivências são, em sua grande maioria, de mulheres e homens negros de periferias que, através da escrita, procuram ficcionalizar suas histórias numa narrativa que dê voz à sua versão dos factos e valorize as suas subjetividades. Na perspectiva da autora, toda vez que narramos um fato, de certa forma, o reinventamos, gerando novos significados para as nossas memórias e inscrevendo nelas novos testemunhos que inspiram um olhar diferenciado sobre a história oficial. Neste ato de (re)escrever sobre si estamos também falando sobre o outro e de como as nossas histórias se cruzam e, principalmente, se complementam, como acontece no caso das histórias contadas pela trilogia do coletivo, sobretudo, quando este “outro” é também um sujeito invisibilizado e esquecido pelas narrativas oficiais dominantes. Nas palavras da autora:
Escrevivência, antes de qualquer domínio, é interrogação. É uma busca por se inserir no mundo com as nossas histórias, com as nossas vidas, que o mundo desconsidera. Escrevivência não está para a abstração do mundo, e sim para a existência, para o mundo-vida. Um mundo que busco apreender, para que eu possa, nele, me autoinscrever, mas, com a justa compreensão de que a letra não é só minha. (2020, 35)
O que o Coletivo Estopô Balaio procura trazer com os seus espetáculos é a busca por uma reinvenção da narrativa e da memória tanto da cidade quanto de seus habitantes, abrindo espaço para que aquelas histórias que seriam consideradas de menor valor possam ser representadas, reinscrevendo assim, os lugares da memória da comunidade através da arte e do teatro. O teatro assumiria, neste caso, um papel contra-hegemónico duplo enquanto “manifestação estética e enquanto exercício arquivístico” (Santos 2018, 331). Esta perspectiva se torna ainda mais radical quando o grupo decide não só repensar as narrativas oficiais da cidade de São Paulo, mas sim as de todo o continente latino americano, tema que será abordado na última parte deste artigo.
Nuestra América – cruzamentos entre o Nordeste, o Brasil e a Abya Yala.
E se todo um território simplesmente sumisse do mapa de um dia para o outro, levando consigo toda a sua história? E se pudéssemos apagar todas as nossas memórias e recriá-las, recontando-as sob o ponto de vista daqueles que foram marginalizados e excluídos? E se a história contasse agora não mais sobre aqueles que colonizaram e impuseram à força, os seus modos de vida, mas sim sobre aqueles que já cá estavam? Essa é a proposta do mais recente projeto artístico do Coletivo Estopô Balaio, iniciado em 2020, denominado Trilogia da Amnésia. Novamente o grupo se dedica à construção de três espetáculos para tentar dar conta de narrar e recriar a história mestiça e étnica do território onde se instalou, materializada por uma pesquisa dos fluxos migratórios e pela sua ampliação, buscando agora uma consciência indígena através dos corpos urbanizados.
O espetáculo Reset Nordeste, o primeiro deste novo tríptico, teve sua estreia em 2020 em pleno confinamento imposto pela pandemia de covid-19 e foi o único a ser criado em ambiente virtual por conta das restrições sanitárias que o momento impunha. Aproveitando-se desta limitação o grupo propôs imaginar um futuro distópico onde todo o território do Nordeste Brasileiro simplesmente some do mapa por conta do aumento das águas do Oceano Atlântico. O sumiço da região é o ponto de partida para abordar a questão da invisibilidade de várias comunidades indígenas presentes nesse território (sobretudo vindas das regiões Sul e Sudeste do país), bem como para questionar a estigmatização da identidade nordestina. O público é convidado a interagir com os atores por meio do sistema interativo criado pelo grupo, ou mesmo serem só observadores das personagens virtuais que adentram o território da dark web para tentar solucionar o misterioso caso.
Múltiplos espaços se sobrepõem na peça, o ambiente virtual versus o ambiente real; o território do Nordeste versus seus vizinhos do Sul e do Sudeste, como uma forma de desconstruir estereótipos e lutar contra o apagamento, redutor da diversidade e complexidade dos seres humanos e de suas culturas. O fruto deste apagamento está em grande parte na história oficial que dita qual memória deverá ser lembrada e qual deverá ser esquecida, estabelecendo assim prioridades entre elas. Neste sentido são criados locais específicos, os lugares de memória, para que estas narrativas escolhidas possam permanecer muitas vezes reforçando o laço de opressão entre elas. Para Pierre Nora os lugares de memória são antes de tudo, restos. Só existem porque não há “memória espontânea” (1993,13) e, por isso, precisamos criar datas, arquivos, monumentos para encarcerar estes fatos em locais específicos. Segundo o autor se “habitássemos ainda nossa memória, não teríamos a necessidade de lhe consagrar lugares. Não haveria lugares porque não haveria memória transportada pela história” (1993, 8). Na tentativa de ir ao encontro e reelaborar suas memórias, o grupo não procura apagar tudo aquilo que já foi construído, mas sim, reconstruir suas narrativas dando-lhes novos contornos e matizes por meio do ato estético. Nas palavras de Anna Zêpa, atriz integrante do grupo:
Quando falamos na Trilogia da Amnésia e nomeamos os espetáculos com Reset, a ideia não é esquecer tudo que somos, não é renegar quem somos, nem abrir mão das nossas memórias afetivas. A ideia é resetar, desfazer, diluir esse “quando” homogeneizante que nos colocaram (e nós também nos colocamos) para recomeçarmos uma ideia múltipla e diversa de Nordeste, pois assim somos. Precisamos nos preocupar também com qual memória estamos construindo hoje. E é sobre isso. (2021, s.p.)
Na busca por habitar estas memórias o coletivo estreia em 2023 o segundo espetáculo da Trilogia da Amnésia, Reset Brasil. O enfoque continua a ser a reinvenção das narrativas e a busca por reencontrar uma memória que foi sufocada e abafada pelos colonizadores, diante da ocupação do território que denominaram Brasil. Retomando a proposta itinerante já feita em espetáculos anteriores, a viagem-espetáculo de trem parte da estação Brás em direção ao Bairro de São Miguel Paulista, vizinho ao Jardim Romano, bairro-residência do grupo, e o público é convidado a sonhar um novo Brasil. Na pesquisa histórica realizada pelo grupo para a construção da peça descobriu-se que o território que hoje abarca os bairros de São Miguel Paulista, Jardim Romano e Itaim Paulista era, antes da chegada dos portugueses, uma região pantanosa chamada de Ururay, que foi palco de uma importante resistência indígena na época colonial: o Cerco de Piratininga.
Ocorrida em 1562, foi o maior levante indígena que aconteceu na região de São Paulo, unindo índios de diferentes tribos como os Guaianás, Carijós e Guarulhos contra os jesuítas que habitavam a região. Este momento histórico serve como uma metáfora para a criação artística deste novo espetáculo, na busca por uma reconfiguração simbólica do encontro desses corpos nativos na sociedade atual. Onde estão os descendentes dos indígenas que participaram deste momento histórico? Quais regiões da cidade foram sequestradas e apagadas em favor da construção de uma narrativa que privilegia somente a história dos “vencedores”? Nesta reinvenção de imaginários e de memórias, os integrantes do grupo se veem representados por estes corpos ancestrais, espelhando a mistura de povos que deu origem ao país Brasil. Muitos deles são descendentes dos indígenas da Abya Yala e também dos povos originários de África, emergindo nesta representação como símbolos de resistência e resiliência ao longo do tempo, lutando pela preservação de suas visões de mundo e enfrentando os desafios de rescrever a história sob uma perspectiva contra-colonial.
Neste momento o grupo prepara a criação do terceiro e último espetáculo desta nova trilogia: Reset América Latina, com sua estreia prevista para agosto deste ano. Para fechar o ciclo de recriar imaginários, esta nova peça se debruçará sobre o continente latino-americano como um todo, se questionando e refletindo sobre aquilo que nos aproxima e nos distancia de nossos irmãos latino-americanos. O que aconteceria se toda a América Latina, desaparecesse do mapa? Quais seriam as implicações para o sistema-mundo atual? O grupo pretende ir além destas questões apresentadas e mergulhar nas feridas, deixadas pelo passado colonial, que cobrem todo este território. Pois dentro do projeto colonizador a que toda a América Latina foi submetida está contido este deslocamento que posiciona o território Brasil, enquanto um irmão distante de seus vizinhos, reforçando o apagamento tanto cultural como histórico a que toda a região foi sujeita.
O que o Coletivo Estopô Balaio faz, com sua arte e com todo o movimento artístico e reflexivo que se gera através dela, é reconfigurar estes lugares de memória, tornando-a num movimento que enxerga o passado como vivo, dinâmico, e que não fica preso às narrativas que já foram escritas e contadas. A arte que o grupo produz, mostra-se, desta forma, um terreno propício para conceber a realidade como uma tarefa de construção social que deve ser pensada e discutida pelo coletivo. Um plano, onde todos podem e devem ter espaço e voz para produzir e conceber novas memórias e histórias, fazendo com que tanto os espectadores quanto os artistas ampliem seu universo de subjetividades e de visões de mundo.
Considerações Finais
Enquanto sujeitos ocidentalizados e inseridos em uma cultura capitalista, de cariz colonialista, patriarcal e predatória, tendente a homogeneizar e suprimir formas alternativas de viver, fazer e pensar, temos ainda muito para compreender e, sobretudo, aprender, sobre a visão de mundo que os povos originários nos apresentam. Há inúmeros exemplos de diferentes regiões e comunidades que nos mostram que há outras possibilidades de conceber mundos mais plausíveis e viáveis. Os povos indígenas equatorianos através da sua filosofia Amawtay Wasi nos dizem que precisamos “aprender a desaprender para re-aprender de outra maneira 7 ” (Achinte 2017, 07). Já o povo Aimará, originários da região andina da América do Sul, nos trazem a perspectiva que devemos “colocar o passado à nossa frente como se fosse algo que conseguimos ver concretamente porque já aconteceu. O futuro viria atrás, desconhecido.” (Zêpa 2021)
Nesta linha de pensamento, o trabalho desenvolvido pelo Coletivo Estopô Balaio ao longo dos últimos 12 anos vai ao encontro dos pensamentos acima plasmados. A intensa produção artística do grupo está completamente direcionada para a produção de novas formas de viver, de fazer e de pensar, convidando a uma reflexão sobre a arte e o papel que ela pode desempenhar em uma comunidade. Através de um trabalho comprometido e continuado, resultante de uma profunda conexão com o território para a recuperação e valorização das suas populações (vivências, memórias, saberes actuais e ancestrais), o grupo demostrou ser possível recriar a realidade, construir novas narrativas e (re)aprender outras formas de existir. Neste sentido, toda a trajetória de criação do coletivo se insere naquilo que Adolfo Achinte chamou de práticas criativas de re-existência, já que busca “formas de reelaborar a vida reconhecendo-se enquanto sujeitos da história” (2017, 19). Ao mesmo tempo, o transitar por esta re-existência passa diretamente pela construção da memória não como uma questão daquilo que se recorda, mas sim pensando o sentido existencial que se dá para estas lembranças. Ou seja, olhar para o passado como aquilo que já foi, mas que pode ser revisto e refeito para integrar novos olhares e novas perspectivas.
As três trilogias apresentadas neste artigo não dão conta de toda a produção artística do grupo, que realiza diversas outras atividades ligadas a diferentes esferas da arte: círculos de leitura, festivais de cenas curtas, laboratórios de dramaturgia, Slam de poesias, intervenções musicais, produção de webséries, entre outras. A atuação de grupos como o Coletivo Estopô Balaio, evidencia, entre outras coisas, que é possível promover alterações sociais significativas através da revisitação do pensamento ancestral de um território. Gerar um pensamento crítico frente aos problemas estruturais a que estas comunidades estão submetidas e reafirmar o papel da arte enquanto espaço liminar de transformação, criador de novas conexões, lógicas e significados, que pode, na sua melhor forma, ter profundas implicações psicológicas, sociais e políticas.
A arte desenvolvida pelo grupo nos mostra que é possível tomar posição enquanto sujeitos ativos dentro de nossa comunidade, desconstruir estereótipos e repensar as narrativas hegemónicas que moldam as nossas realidades. Capacitando, desta forma, a construção de relacionamentos, conhecimentos e significados que sejam de fato transformadores e capazes de nos conectar enquanto coletividade. O teatro que o coletivo produz está imerso em sua comunidade, no dia a dia do bairro, numa ocupação simultânea de vida e da arte, que, longe de funcionar sempre de maneira pacífica, está sujeito aos tensionamentos e questionamentos que a adoção deste tipo de comprometimento e posicionamento suscita. Quando olhamos para os espetáculos produzidos, percebemos que há uma estética que é ancorada na ética enquanto modo de enxergar o outro. Há um contínuo trabalho sobre as memórias, marginalizadas e ancestrais, que são sistematicamente excluídas dos relatos da história, tendo em vista a evidenciação da sua sabedoria, em um movimento que une Oralitura e Escrevivência como forma de biografar a comunidade e o seu território.
A trajetória do Coletivo Estopô Balaio diz muito sobre o tipo de arte que as práticas artísticas comunitárias são capazes de produzir e gerar. Elas nos revelam o teatro nas suas formas mais puras e brutas, enquanto fenómeno de conexão intra e intersubjectiva. Tendo no teatro o ponto referencial para se estar, se ver e criar em comunidade, este tipo de arte se assume não apenas como tentativa concreta de buscar identidades grupais ou existências coletivas, mas também de resgatar a possibilidade de construção da identidade individual (individuação) que só se torna possível no seio de um colectivo. Trata-se de um teatro onde somos capazes de nos enxergar enquanto sujeitos históricos, habitar nossas memórias e construir novas narrativas na relação com o outro. Um teatro que busca seu lugar de pertencimento e de territorialidade em uma confluência liminar entre o território e a cultura produzida por ele e tendo em vista a sua constante transformação. Por fim, encerramos com uma fala do grupo sobre o trabalho que tem vindo a ser desenvolvido por si no Jardim Romano: “Somos um mutirão de artistas que acredita na possibilidade de que o teatro também possa ser uma forma de retomada, formação crítica, organização política, conscientização étnica e de classe. Nunca fizemos “só” teatro. Teatro é meio, não fim.” (Balaio 2023)
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Notas
2
Tradução própria
3
Tradução própria
4
Tradução própria
5
Tradução própria
6
A estação integrada do Brás é uma importante ligação ferroviária da cidade de São Paulo, ligando o centro da capital a diversas regiões periféricas. Com ligações entre os trens da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos - CPTM e o Metrô de São Paulo, interliga sete linhas de transportes diferentes.
7
Tradução própria
*
Artigo de reflexão. Parte da pesquisa de doutorado de
Daniela Mota Silva, apoiada e financiada por Bolsa
de Doutoramento FCT – Fundação para a Ciência e a
Tecnologia, I.P., no âmbito do projeto 2022.13311.BD., sob
orientação do professor Dr. José Eduardo Silva.
Autor notes
1
O Centro de Estudos Humanísticos é apoiado pela FCT – Fundação para a Ciência e a Tecnologia, I.P., no âmbito do projeto UIDB/00305/2020 https://doi. org/10.54499/UIDB/00305/2020
Informação adicional
CÓMO CITAR: Mota Silva, Daniela
y José Eduardo Silva. 2025 “Memória e transformação: o papel das narrativas na
criação artística do Coletivo Estopô Balaio” Cuadernos de Música, Artes Visuales y Artes Escénicas 20 (1): 64-87. https://doi.org/10.11144/javeriana.mavae20-1.mtce