Arte e tecnodiversidade na ativação da cultura indígena kaingáng*

Arte y tecno diversidad en la activación de la cultura indígena Kaingáng

Art and Techno Diversity in the Activation of the Kaingáng Indigenous Culture

Cuadernos de Música, Artes Visuales y Artes Escénicas, vol. 16, núm. 2, 2021

Pontificia Universidad Javeriana

Kalinka Lorenci Malmann **

Universidade Federal de Santa Maria, Brasil


Andreia Machado Oliveira ***

Universidade Federal de Santa Maria, Brasil


Joceli Sirai Sales ****

Universidad Federal de Santa María, Brasil


Recepção: 19 Dezembro 2020

Aprovação: 22 Março 2021

Publicação: 01 Julho 2021

Resumo: O presente artigo aborda uma prática artística colaborativa com as comunidades indígenas Kaingángs do Rio Grande do Sul, Brasil, denominada “DNA: Afetivo Kamê e Kanhru”, a qual propõe ações em arte e tecnologia que dialoguem diretamente com a cultura indígena Kaingáng. Essa prática originou um jogo digital que pretende ativar os saberes indígenas tradicionais em meio aos processos contemporâneos globais. Desse modo, buscamos pensar o papel das tecnologias emergentes sob as culturas minoritárias na atualidade e a urgência de um discurso que propõe um avanço tecnológico não universal e generalista. Nesse ponto, trazemos o conceito de cosmotécnica, do filósofo chinês Yuk Hui, que propõe refletirmos como as tecnologias atuais correm o risco de serem opressoras e verticalizadas, replicando os processos invasivos de colonização e civilização dos nossos povos originários. Esse artigo é amparado também em conceitos de autores como Gilbert Simondon, filósofo da tecnologia, Grant H. Kester, teórico da arte socialmente engajada, e com contribuição de autores da etnia Kaingáng, os quais descrevem a cosmologia Kaingáng de modo singular e enriquecedor. A partir dos discursos instaurados entre a arte colaborativa, a tecnologia, a cultura e a cosmologia Kaingáng, compreende-se que as práticas em arte, que acontecem de modo colaborativo em comunidade, sugerem o protagonismo desses grupos, vinculados a sua cultura específica. Portanto, quiçá, tais práticas atreladas ao uso das tecnologias possam estar contribuindo para uma tecnodiversidade, ou seja, uma tecnologia mais inclusiva, múltipla e democrática.

Palavras-chave:arte, jogo digital, cultura indígena kaingáng, tecnodiversidade, colaboração, cosmologia kaingáng.

Resumen: Este artículo aborda una práctica artística colaborativa con las comunidades indígenas Kaingángs en Rio Grande do Sul, Brasil, denominada “DNA: Afetivo Kamê e Kanhru”, que propone acciones en arte y tecnología que dialogan directamente con la cultura indígena Kaingáng. Dicha práctica dio origen a un juego digital que tiene como objetivo activar los saberes indígenas tradicionales en medio de los procesos contemporáneos globales. De este modo, buscamos reflexionar sobre el papel de las tecnologías emergentes en las culturas minoritarias en la actualidad y la urgencia de un discurso que proponga un avance tecnológico no universal y generalista. En este punto, traemos el concepto de cosmotécnica, del filósofo chino Yuk Hui, que propone reflexionar sobre cómo las tecnologías actuales corren el riesgo de ser opresivas y verticalizadas, replicando los procesos invasivos de colonización y civilización de nuestros pueblos originarios. El presente artículo también se apoya en conceptos de autores como Gilbert Simondon, filósofo de la tecnología, Grant H. Kester, teórico del arte socialmente comprometido, y con contribuciones de autores de la etnia Kaingáng, que describen la cosmología Kaingáng de una manera única y enriquecedora. A partir de los discursos establecidos entre el arte colaborativo, la tecnología, la cultura y la cosmología Kaingáng, se entiende que las prácticas en el arte, que se desarrollan de manera colaborativa en la comunidad, sugieren el protagonismo de estos grupos, ligados a su cultura específica. Por tanto, es posible que tales prácticas ligadas al uso de tecnologías puedan estar contribuyendo a una tecno diversidad, es decir, una tecnología más inclusiva, múltiple y democrática.

Palabras clave: arte, juego digital, cultura indígena kaingáng, tecnodiversidad, colaboración, cosmología kaingáng.

Abstract: This paper discusses a collaborative artistic practice with the Kaingángs indigenous communities of Rio Grande do Sul, Brazil, called “DNA: Afetivo Kamê e Kanhru,” which proposes actions in art and technology in direct dialogue with the Kaingáng indigenous culture. This derived in a digital game with the purpose of activating the traditional indigenous knowledge amidst global contemporary processes. Thus, we seek to think about the role of emerging technologies under minority cultures today and the urgency of a discourse that proposes a non-universal and generalist technological progress. At this point, we bring the concept of cosmotechnics, by Chinese philosopher Yuk Hui, who proposes reflecting on how current technologies are at risk of being oppressive and vertical, replicating the invasive processes of colonization and civilization of our original peoples. This paper is also supported by concepts from authors such as Gilbert Simondon, philosopher of technology, Grant H. Kester, theorist of socially engaged art, and contributions from Kaingáng authors, who describe Kaingáng cosmology in a unique and enriching way. Based on the discourses established between collaborative art, technology, culture, and Kaingáng cosmology, it is understood that practices in art, which take place in a collaborative way in the community, suggest the importance of these groups, linked to their specific culture. Therefore, perhaps, such practices linked to the use of technologies may be contributing to a techno diversity, that is, to a more inclusive, multiple, and democratic technology.

Keywords: art, digital game, kaingáng indigenous culture, techno diversity, collaboration, kaingáng cosmology.

> A partir de uma prática artística colaborativa na comunidade indígena kaingáng, a qual se utiliza das tecnologias emergentes, problematizamos a tecnologia atrelada à cultura a fim de pensarmos as culturas minoritárias na contemporaneidade e a urgência de um discurso que propõe um desenvolvimento tecnológico não universal e generalista. Nesse estudo, interessa-nos pensar os usos das tecnologias digitais ligadas às práticas artísticas colaborativas em comunidade, em especial as comunidades Kaingáng, que, ao seguir diretrizes da arte socialmente engajada, se utilizam das tecnologias dentro dos limites éticos e diante das necessidades reais do outro étnico e cultural.

Tais tecnologias emergentes atravessam, interagem e modificam cada vez mais nossos modos de vida. Essa perspectiva coloca em pauta a necessidade de problematizarmos as tecnologias com o intuito de distanciar a noção primeira de um processo global tecnológico, progressista e hegemônico, visto que o generalismo tecnológico tende a apagar as culturas minoritárias e seus modos de vida específicos. Desta maneira, a “tecnologia não é antropologicamente universal; seu funcionamento é assegurado e limitado por cosmologias particulares que vão além da mera funcionalidade e da utilidade” (Hui 2020, 16). Ainda, a visão da tecnologia como elemento unificado e global é utópica, pois, segundo o filósofo Yuk Hui (2020), existe uma multiplicidade de cosmotécnicas, sendo que o conceito de cosmotécnica diz respeito à unificação do cosmos e da moral por meio das atividades técnicas, sejam elas da criação de produtos ou de obras de arte (Hui, 2020). A cosmotécnica diz respeito tanto à diversidade cosmológica como à tecnológica implicadas em cada cultura particular.

No âmbito artístico, as tecnologias contemporâneas surgem de modo inter e transdisciplinar, dissolvendo disciplinas específicas, tanto em nível de procedimentos e conceitos operacionais quanto de produções colaborativas (Ascott 2003 e Couchot 2003). De modo geral, ao tecer trocas com campos como hackerativismo, cultura maker, digital humanities, software culture, critical image science, critical studies, etc. (Grau 2011 e Manovich 2013), a arte e tecnologia voltam-se sobre aspectos de multiplicidade, hibridação, colaboração, ubiquidade, sinestesia e interatividade em propostas artísticas. Atualizam processos em propostas que envolvem telemática, sistemas expandidos, ecossistemas, inteligência artificial, cartografias culturais, redes colaborativas, visualização de dados, internet das coisas, internet dos corpos, etc., e invoca outras concepções espaço-temporais e outras formas de ver, sentir, pensar, agir e se relacionar em processos éticos e estéticos colaborativos.

Arte, comunidade e colaboração

Atualmente, existem diversas referências artísticas de trabalhos em arte e tecnologia que são concebidos com comunidades. Trazemos a proposta “DNA Afetivo: Kamê e Kanhru” para discutir o cenário que se apropria da arte e tecnologia em diálogo com a cultura dos povos originários. A equipe do LabInter (LabInter n.d.) desenvolve a referida proposta em conjunto com comunidades indígenas Kaingáng no estado do Rio Grande do Sul (RS), Brasil, sendo uma prática artística colaborativa que incentiva o não esquecimento da língua e dos modos específicos de organização social da cultura indígena Kaingáng, os quais são ativados por ações inventivas e criativas em arte, ciência e tecnologia. Atualmente, há índios Kaingáng nos estados brasileiros do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e sul de São Paulo. Essa população está estimada em, aproximadamente, 34.000 índios Kaingáng espalhados por várias comunidades ou territórios indígenas.

O projeto “DNA Afetivo: Kamê e Kanhru” tem uma trajetória que se inicia em 2016 com a realização da pesquisa de mestrado, “DNA Afetivo Kamê e Kanhru – Prática artística colaborativa em comunidade kaingáng”, no Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais da Universidade Federal de Santa Maria de autoria da artista e pesquisadora Kalinka Mallmann com colaboração do indígena, atualmente professor de história, Joceli Sirai Sales, e orientação da professora Dra. Andreia Machado Oliveira, e tem continuidade na pesquisa de doutorado atual de Kalinka Mallmann. Desde o seu início, acontecem constantes encontros na aldeia Kaingáng, Terra Indígena do Guarita, em formato de laboratórios de criação audiovisual. Esses laboratórios dialogam com a temática da valorização da cultura Kaingáng e a produção de narrativas digitais (vídeos, fotografias, áudios, fotos manipuladas digitalmente, desenhos digitais, entrevistas). Em julho de 2017, acontece o primeiro laboratório de criação audiovisual na escola EEIEF Gormecindo Jete Tenh Ribeiro. Essa ação na aldeia inicia com um encontro com as crianças em sala de aula, para uma conversa sobre as marcas kamê e kanhru e seus elementos simbólicos (Mallmann 2018). Também foram produzidos desenhos digitais que tratassem dessa mesma temática (Figura 1).

Laboratório de criação na escola EEIEF Gormecindo Jete Tenh Ribeiro.
Figura 1.
Laboratório de criação na escola EEIEF Gormecindo Jete Tenh Ribeiro.


Fonte: LabInter.

Laboratório de criação na Terra Indígena do Guarita.
Figura 2.
Laboratório de criação na Terra Indígena do Guarita.


Fonte: LabInter.

Em um segundo momento, Joceli Sales e as crianças propuseram uma caminhada, reconhecendo o amplo território da aldeia. Nesse deslocamento, as crianças tinham autonomia para fotografar, filmar e intervir digitalmente nas fotografias, mapeando de forma espontânea a comunidade (Mallmann 2018) (Figura 2).

Em novembro de 2018, foi realizado um mapeamento na aldeia Terra do Guarita (km 10), em que pequenos grupos entrevistaram cada residência, assinalando em um mapa analógico do território, as famílias kamê e as kanhru. Nessa atividade as crianças tiveram autonomia para produzir narrativas digitais com o uso de tablets. Essa ação proporcionou às crianças uma realidade expandida, que passa a incorporar temporalidades e espacialidades simultaneamente (Mallmann et al. 2019, 134).

A partir de 2019, os laboratórios de criação audiovisual passam também a acontecer na comunidade Kaingáng de Santa Maria, RS. Essas oficinas ocorreram na escola Kaingáng Augusto Opê da Silva, onde as crianças da escola também participaram do processo de criação do jogo digital. Em um dos laboratórios foi proposto que as crianças indígenas interagissem através da criação de imagens para um jogo 2D, desenvolvido com colaboração da escola Kaingáng de outra comunidade, na Terra do Indígena do Guarita (Km 10). Esse jogo é uma versão digital e em rede1 do jogo ancestral denominado Tigre e Cachorro, o qual é uma espécie de jogo de tabuleiro, porém deriva de um jogo ancestral desenhado no chão com gravetos (Figura 3). Inicia-se o jogo com dois participantes, com a finalidade de encurralar o tigre. O jogo se assemelha ao jogo de dama, entretanto os participantes atuam conjuntamente e colaborativamente, visando o pensamento ancestral Kaingáng de complementaridade e união.


Printscrean do jogo 2D do Tigre e Cachorro.
Figura 3.
Printscrean do jogo 2D do Tigre e Cachorro.


Fonte: LabInter.

No projeto artístico colaborativo “DNA Afetivo Kamê Kanhru” utilizam-se constantemente esses laboratórios de criação nas escolas Kaingáng e encontros com os atores sociais dessas comunidades (anciões, diretores das escolas, professores, lideranças, etc.). Ao posicionar suas vontades, possibilidades e limites, a comunidade ganha espaço para colocar os seus posicionamentos (Mallmann et al. 2019, 142), haja vista que o fomento que norteia uma proposta colaborativa em arte diz respeito diretamente aos grupos locais e às comunidades em questão. O artista tende a abrir mão da autonomia relacionada aos fazeres, proporcionando mais voz e visibilidade a esses grupos (Mallmann et al. 2019).

Na perspectiva de práticas artísticas colaborativas, nas últimas décadas, alguns artistas realizaram uma arte efetiva e afetiva relacionada a esses lugares específicos, com as próprias comunidades locais (Lippard 2001).

Esses projetos artísticos colaborativos, vinculados a grupos ou comunidades específicas, ocorrem deslocados das instituições artísticas e espaços legitimados em arte e requerem um período de tempo alargado para sua realização. Tais práticas interagem com o público em meio a sua rotina e espaço comum de convivência coletiva. (Mallmann et al 2019, 131)

Identificamos uma postura contemporânea em comum que via na criatividade da ação coletiva e nas ideias compartilhadas, uma forma de apropriação do poder pelos artistas, produzindo um empoderamento social (Bishop 2006). As práticas artísticas colaborativas revelam um conjunto de especificidades comuns, tais como: trocas efetivas com a comunidade e/ou grupos, engajamento com questões sociais locais, entrelaçamento com outras áreas do conhecimento e autoria coletiva (Mallmann 2018). E, mais importante que estes apontamentos, além de serem proposições processuais sociais destacadas de um objeto estético resultante, em que a troca relacional torna-se a própria práxis criativa (Kester 2006). Com o tempo, mais metodologias ganharam legitimidade e permitiram que os artistas pudessem trabalhar juntos em uma variedade de modalidades colaborativas em projetos artísticos — como coletivos, laboratórios de criação, oficinas, encontros, produção de vídeos, etc. — que, numa geração anterior, teriam sido descartados como arte comunitária (Kester 2011, 9).

Em projetos colaborativos, os diálogos entre os participantes tornam-se uma importante ferramenta utilizada para reconhecer um problema, uma necessidade ou para dar voz à uma questão comum ao grupo. Visto que as práticas colaborativas são também dialógicas, as reuniões, os laboratórios de criação e os encontros são métodos considerados efetivos. (Mallmann et al. 2019, 132)

Neste sentido, podemos pensar em modos de fazer para/com o outro em propostas de arte socialmente engajadas (Helguera 2011). Esses modos acontecem em meio ao protagonismo dos grupos sociais e suas urgências e não apenas como uma proposição imperativa e isolada por parte dos artistas.

A arte é compreendida como agente de transformação que “foca na criatividade e iniciativa social” (Canclini 1980, 32-33) e visualiza a produção artística como um lugar possível. Reinaldo Laddaga (2006) discorre que “a arte de hoje está contaminada de processos abertos, intensificados pela conversação, dilatando o tempo e o espaço das experiências entre os sujeitos” (21). Tais metodologias trazem em si um processo recíproco entre todos os agentes participantes, ao compartilharem saberes, desejos, hábitos, olhares, gestos, experiências que atravessam e se encarnam no corpo, uma agregação com o coletivo, um agenciamento coletivo a ser ativado e cartografado. “Nesse sentido, a colaboração está estritamente relacionada ao afeto, à empatia, à solidariedade e à conectividade que há entre os indivíduos” (Mallmann et al. 2019, 146). Falamos não em hierarquia e separação, mas em empoderamento pelo respeito à diferença e pela potência do coletivo (Oliveira 2017).

Na mesma direção, Michael Hardt e Antonio Negri (2004) desconstroem a ideia de sociedade/ comunidade unitária a partir do conceito de multidão, bem como Bruno Latour (2012) com a ideia de coletivo. Multidão composta por singularidades heterogêneas que visam criar ações de produção e partilha política (Oliveira 2017). Latour, Hardt e Negri desconstroem paradigmas que afirmam a totalidade a fim de moverem-se na direção de afirmar a existência pelo ato de compartilhar o comum (Laval e Dardot 2015).

O jogo digital Kamê Kanhru

Um dos desdobramentos das propostas trabalhadas com as comunidades Kaingáng e das demandas das próprias comunidades, resultou na criação coletiva do jogo digital Kamê Kanhru, para ser aplicado em dispositivos móveis e computadores. O jogo digital Kamê Kanhru é um projeto artístico-tecnológico que atualmente está em fase de conclusão, implementação e, posteriormente, distribuição e exibição. No jogo digital Kamê Kanhru, pensamos como as ações passadas e presentes se amplificam em ações futuras através de um senso de responsabilidade com o outro e da valorização da cultura indígena Kaingáng. Além disso, entendemos que os aspectos culturais dos povos originários podem contribuir com valores baseados em fazeres e saberes ancestrais a serem absorvidos significativamente em suas formas coletivas e colaborativas.

A proposta artística “DNA: Afetivo Kamê e Kanhru”, em suas diversas ações, visa a valorização da língua Kaingáng. O jogo digital Kamê Kanhru foi elaborado de forma bilíngue (Kaingáng e português), para que possa ser jogado nas escolas e comunidades Kaingáng e comunidades em geral de língua portuguesa. Desde modo, o jogo Kamê Kanhru reforça o senso de identidade e de pertencimento, bem como reduz a pressão social para que os Kaingáng assimilem apenas a cultura dominante do “homem branco”. Visto que a cultura Kaingáng resiste na atualidade por uma busca consciente por parte de seu povo, o qual acredita que a memória ancestral possa estar significando seus processos de construção de conhecimento diante de todas as mudanças ocorridas. Esta consciência passa pela manutenção da língua que continua ativa nas comunidades Kaingáng.

Tal pressão social torna-se clara, por exemplo, com a implementação do Serviço de Proteção ao Índio (SPI), por volta de 1960, em que a aldeia Terra Indígena do Guarita (RS/Brasil) sofre um processo de “civilização” imposto pelo Estado, como face enganadora de uma estratégia que dizia ser benéfica aos indígenas. O SPI foi um órgão governamental criado em 1910, que atuou junto às populações indígenas do Brasil, durante quase todo o século XX, com atribuições de contato com os povos nos locais mais difíceis de acesso até aquele momento (Sales 2019). Dos inúmeros abusos relatados nesse processo, podemos citar a implementação das escolas nas aldeias que foi realizada de modo invasivo, “como um espaço que buscava apagar o modo de ser Kaingáng, ensinando coisas que não faziam parte até então da vida dessas crianças” (Sales 2019, 22). Segundo os anciões Kaingáng (kofá), foi a partir desse período que muitas pessoas deixaram de falar a língua, como relata Joceli Sales:

Nos relatos dos nossos Kofá, os próprios pais, em muitos casos, não deixavam seus filhos irem à escola, pois a repressão na escola era muito forte, principalmente em forma de castigos. Isso, segundo contam os nossos Kofá, porque as crianças falavam em kaingáng na escola, cujo uso da língua materna era expressamente proibido. (Sales 2019, 19)

Mesmo com o fim do SPI, em 1967, as populações indígenas buscaram se reconstruir em todos os aspectos da vida social, porém muitas mudanças jamais puderam ser revertidas (Sales, 2019). Diante desse contexto, torna-se relevante questionar nossas práticas contemporâneas, como o uso das tecnologias de modo não consciente e generalista: poderiam essas, estar sendo mais uma estratégia de opressão e apagamento das culturas minoritárias ou uma forma de resistência? Subverter essa tendência hierárquica, ao fazer o uso das tecnologias emergentes, é um dos objetivos do projeto “DNA: Afetivo Kamê e Kanhru”.

Nesse viés, a criação do jogo digital Kamê Kanhru propõe ativar princípios e valores Kaingáng como a ativação da cosmologia kamê e kanhru e a valorização das relações entre os anciãos e as crianças. Para o povo Kaingáng, a interação entre os velhos (kofá) e os jovens é de suma importância. Nessas comunidades, as crianças e os adultos ocupam os mesmos espaços para aprender, o que resulta em crianças mais autônomas, pois o seu aprender está baseado no ouvir, observar e experimentar diário (Ferreira 2019). Na relação entre criança e ancião, a criança Kaingáng é parte legítima do cotidiano de sua comunidade, na qual compartilha tarefas com as demais pessoas de diversas idades, desenvolvendo o coletivismo e reconhecendo-se como papel importante na perpetuação de seus saberes e costumes; o ancião tem um papel fundamental na comunidade ao ser referência de conhecimento e sabedoria.

O jogo digital Kamê Kanhru acontece por meio de missões, nas quais os jogadores devem atuar e completar o requisitado para que os vários níveis disponíveis sejam desbloqueados. Logo no início do jogo, os usuários podem escolher entre avatares masculinos ou femininos, da marca kamê ou kanhru (Figura 4). Desse modo, os personagens kamê foram desenhados mais largos, com os pés maiores, e os personagens kanhru mais esguios, com os pés menores, baseado na visão cosmológica da cultura Kaingáng. As vestimentas dos personagens possuem animais sintetizados, correspondente como animal de poder de cada marca: macaco para os de marca kanhru e lagarto para os de marca kamê.

Os animais também fazem parte da narrativa do jogo, como companheiros dos avatares principais. Segundo Marilde Luiz Ganhgre, “os espíritos dos animais se tornam companheiros dos humanos; o jãgrê2 é o ‘santo’ da gente e sem ele o kujã3 pouco faz” (Ganhgre 1997, 118). Marilda complementa descrevendo que “o kujã conversa com seu jãgrê e juntos saem para buscar as coisas, almas e ervas; as pessoas que possuem um jãgrê devem evitar matar animais daquela espécie” (Ganhgre 1997, 118).

Personagens ilustrados para o jogo Kamê Kanhru. Créditos: Vicent Solar.
Figura 4.
Personagens ilustrados para o jogo Kamê Kanhru. Créditos: Vicent Solar.


Fonte: LabInter

Os personagens possuem marcas corporais, sendo as geometrias abertas e os dois traços no rosto, para os kamê, e as geometrias fechadas e os círculos na face, para os kanhru. As vestimentas foram pensadas de forma com que as crianças Kaingáng se identificassem com os avatares do jogo, desmistificando a ideia imposta pela cultura eurocêntrica que se refere ao indígena como um signo escrachado do homem selvagem, sem roupa e com cocares (Mallmann 2018).

Ainda, o jogo contempla uma referência aos territórios das aldeias Kaingáng participantes do projeto de Santa Maria e da Terra do Guarita (Km 10), e os elementos que os integram, como as casas, os espaços de convivência coletiva, como a escola e o centro cultural (Figura 5). Sendo que “nas aldeias Kaingáng, as casas estão dispostas, segundo os interesses dos seus donos, ao longo de trilhas, a uma curta distância das roças familiares e de boas nascentes de água” (Veiga 2000, 90).

Fotografia e modelagem 3D, referente à escola Kaingáng Agusto Opê da Silva.
Figura 5.
Fotografia e modelagem 3D, referente à escola Kaingáng Agusto Opê da Silva.


Fonte: LabInter.

Ilustração do mapa das aldeias. Créditos: Vicent Solar.
Figura 6.
Ilustração do mapa das aldeias. Créditos: Vicent Solar.


Fonte: LabInter.

A equipe do jogo desenhou um mapa que integra essas duas comunidades num mesmo mundo 3D para que o avatar possa se movimentar e realizar as atividades propostas no jogo (Figura 6). Esse mapa se baseou em fotos reais das aldeias e nos relatos dos indígenas nativos dessas comunidades. No mundo 3D há inúmeros aspectos da tradição Kaingáng que estão presentes nas narrativas das missões que acontecem de forma linear: a cada etapa concluída, o avatar pode continuar o percurso. As etapas se caracterizam por: escolher o avatar que diz respeito a sua marca (kamê ou kanhru) e sexo, encontrar o animal de poder (jãgrês) para acompanhá-lo no percurso, participar da colheita dos alimentos, frequentar a escola e o centro cultural da comunidade, pescar, praticar artesanato (cestarias) e, por fim, ajudar a combater as queimadas da floresta ao redor do território. Na atividade artesanal de cestaria, conduzidos por uma anciã artesã, os jogadores podem experimentar as geometrias utilizadas nos cestos feito de palha (Figuras 7 e 8), as quais são características de cada grupo. As geometrias abertas são utilizadas para os de marca kamê, e as geometrias fechadas para os de marca kanhru. Essa atividade é, ainda, realizada pelas famílias Kaingáng como meio econômico de subsistência; contudo, infelizmente, perdeu-se a essência de costumizar as cestas de acordo com a marca pertencente a cada família.

A figura do cacique, bem como a do kuian, aparecem com frequência no mundo 3D, para orientar o personagem principal a seguir suas metas com a sabedoria advinda da cultura Kaingáng. Os anciões ensinam sobre o plantio, sobre o momento ideal para a colheita e sobre o preparo dos alimentos. Em um dos momentos do jogo, uma anciã propõe que o personagem colha no campo erva-moura, ensinando-o a escolher as folhas mais saudáveis e bonitas, após cozinhá-las com banha e sal para fazer uma farofa de milho ou um bolo assado nas cinzas, como acompanhamento (Figura 9). Em outro momento, o ancião ensina, para o jogador, as técnicas de pescaria ancestral, utilizando-se de uma armadilha feita de taquaras, denominada pari (Figura 10).

Ilustração da anciã artesã para o jogo KamêKanhru. Créditos: Vicent Solar.
Figura 7.
Ilustração da anciã artesã para o jogo KamêKanhru. Créditos: Vicent Solar.


Fonte: LabInter


Print screen do jogo 2D da cestaria.
Figura 8.
Print screen do jogo 2D da cestaria.


Fonte: LabInter.


Print screen do jogo Kamê Kanhru.
Figura 9.
Print screen do jogo Kamê Kanhru.


Fonte: LabInter.


Print screen do jogo Kamê Kanhru.
Figura 10.
Print screen do jogo Kamê Kanhru.


Fonte: LabInter.

O jogo Kamê Kanhru também conta com minijogos 2D, inseridos durante o percurso do avatar, intercalados entre as missões. Além da atividade da cestaria, descrita anteriormente, os minijogos contemplam também a atividade de pesca, em que o personagem deverá pescar apenas os peixes nativos da região, denominados Jundiá (Figura 11). No jogo da memória, cria-se uma relação com o nome e a imagem dos frutos, encontrados também na região das aldeias participantes do projeto. No jogo do quebra-cabeça, são otimizados os desenhos, criados pelas crianças indígenas, e fragmentados em peças, contando com níveis distintos de dificuldades (Figura 12). No jogo das palavras, também se utilizando dos desenhos das crianças, é necessário construir a palavra que remete ao desenho, elegendo a ordem das letras, visto que esses jogos servirão também de apoio pedagógico para professores das escolas indígenas, para que tratem das questões culturais, bem como o idioma nativo, de forma lúdica e atualizada.

Para que o jogo possa proporcionar uma imersão cultural realmente efetiva para o jogador, os elementos que o constituem, tanto visuais quanto conceituais, foram elaborados através de uma metodologia colaborativa juntamente à comunidade kaingáng. Podemos apontar algumas etapas da metodologia colaborativa aplicada ao projeto: o desejo do artista pelo direcionamento consciente ao outro; proposições compartilhadas, nas quais as intenções dos integrantes da comunidade de fomentar a valorização da cultura kaingáng, em meio aos processos tecnológicos atuais, vêm ao encontro das proposições da equipe; a abordagem criativa “que objetivam ativar o uso das marcas exogâmicas kamê e kanhru, proporcionando encontros entre os indivíduos e gerando uma rede colaborativa, afetiva e conectada” (Mallmann et al. 2019, 139); fluxo contínuo em que “os fazeres vão sendo compartilhados e a autoria, consequentemente, distribuída” (Mallmann et al. 2019, 140); a visualização permite um retorno ao sistema artístico ou à comunidade, sendo importante a documentação do processo e registros da produção, aceitas entre todos os envolvidos no projeto.

Tal metodologia envolveu a equipe do projeto e as comunidades Kaingáng em um fazer horizontal e atento à realidade e às necessidades desse outro cultural. Foram diversos encontros entre a equipe do LabInter e as crianças da aldeia, por meio de laboratórios de criação, em que foram utilizados os espaços e as estruturas pedagógicas das escolas, contando com o apoio e o direcionamento de professores e diretores e com o olhar sábio do Joceli Sales, professor de história, integrante do projeto, ativista e porta-voz dessas comunidades. Essas atividades que acontecem nas aldeias semestralmente4, desde 2016, proporcionaram um engajamento coletivo ao trabalhar com a cultura indígena Kaingáng de forma ética e integradora. É relevante atentar que os modos de criação colaborativos, sugeridos nessa prática, possibilitaram que a cultura indígena deixasse de ser apenas tema artístico, tornando-se contexto, conteúdo e agente por meio das diversas experiências proporcionadas em comunidade.


Print screen do jogo 2D da cestaria.
Figura 11.
Print screen do jogo 2D da cestaria.


Fonte: LabInter.


Print screen do jogo Kamê Kanhru.
Figura 12.
Print screen do jogo Kamê Kanhru.


Fonte: LabInter.

Cultura, tecnologia e diversidade

A temática Kamê e Kanhru, explorada na proposta artística colaborativa, como no jogo digital, representa a dualidade da sociedade indígena Kaingáng. Sabe-se que a organização sociocultural Kaingáng é conhecida pelos seus princípios cosmológicos de acordo com o mito de origem, representado pelos antepassados Kamê e Kanhru. Cada metade clânica possui uma marca/sinal, que usa em seus rituais: a dos Kamê (é téj), dois traços paralelos e compridos, a dos Kanhru (ror), um círculo curto e preenchido. Essas marcas distintas são apresentadas na pintura corporal, mas também são expressas por meio da geometria do artesanato, entre outras aplicações mencionadas anteriormente. Em relação aos parentescos, os códigos de casamento também se inscrevem nessa compreensão do cosmos. Assim, as pessoas da mesma marca são consideradas irmãs e irmãos, as quais não poderão se unir em matrimônio, e os que possuem marcas diferentes, cunhados e cunhadas. Quando o casamento é realizado de acordo com essa concepção, os Kamê devem se casar apenas com os Kanhru e vice-versa, e as crianças recebem apenas a marca paterna (Jacodsen 2013). A adoção de nomes e sobrenomes foi imposta para que os indígenas obtivessem documentação oficial ou para registrar as propriedades, uma vez que os Kaingáng não eram aceitos na “sociedade branca”. Via-se isso como um processo de colonização, sujeição e destruição das heranças, história e linhagem de parentesco.

Para os Kaingáng, essas marcas são relevantes para entender a concepção cultural, social e cosmológica de seus povos e como eles se relacionam com o mundo. Segundo Jacodsen (2013), essa dualidade diz respeito a uma percepção do universo que reflete a presença e influência do sol e da lua. Para o etnólogo Curt Nimuendajú (1993) as marcas kamê e kanhru talvez sejam “nada mais que a personificação do Sol e da Lua” (61). Esses princípios cósmicos refletem o sistema de liderança em termos de um todo social composto por duas metades, que são opostos e complementares, simultaneamente, e são aplicados aos humanos, animais, plantas, cosmos. Nesse sentido, a antropóloga Juracilda Veiga (2000), discorre sobre a cosmologia Kaingáng em seu aspecto dual e complementar:

As metades kame e kairu são idealmente exogâmicas e, em tudo, complementares. A relação de troca entre as metades é permanente. Casa-se na metade oposta, enterram-se os mortos da outra metade, e quando alguém passa por um período de liminaridade é acompanhado e servido por pessoas da metade contrária (…) Quando um menino vai à caça pela primeira vez, o passarinho que mata é oferecido ao avô materno, membro da metade contrária, para que tenha sorte como caçador. Também é alguém (um ente) da outra metade que deve lhe contar os segredos sobre xamanismo e quem será seu companheiro, iangrô (ou iangre), duplo espiritual de um kuiâ (xamã). (Veiga 2000, 78)

Segundo contam os kaingángs mais velhos5, Deus (Topẽ) criou o primeiro homem no entardecer do dia, e os animais os chamaram de kamê, “pois estava sumindo o sol no horizonte e seus raios representavam linhas retas (retéj)”. Porém, esse kamê não poderia ver nada na escuridão, pois “seus olhos tinham sido abertos durante o dia”. Sendo assim, Topẽ criou outro indivíduo kaingáng para caminhar durante a noite, que logo foi adorado pelos animais noturnos que o chamaram de kanhru, “pois tinha sido criado na luz do luar, e sendo sua marca a lua de forma arredondada (reror)”. Cada um desses kaingáng foi criado “em par”, sendo um homem e uma mulher; porém, esses pares tinham afinidade de irmãos, por serem criados juntos. Ao percebem a procriação dos animais e que o mesmo não acontecia com eles, trocaram suas irmãs, o kamê com o kanhru e desse modo aumentaram seus povos “do dia e da noite”, “ficando assim desde esse dia decidido que kamê só pode casar com kanhru, e kanhru só pode casar com kamê”, pois se um dia houver um casamento de partes iguais, a lua (kysã) e o sol (), transformarão todos os filhos desses casais em bichos (miso). Para alegrar o dia a dia desses kaingáng, os animais os ensinaram a cantar e dançar os ritmos da floresta. Cada animal apresentou seu canto e sua dança, ao “kamê de dia” e ao “kanhru de noite”, e até hoje “os kaingáng dançam e cantam imitando os animais, seus irmãos e protetores”.

Ao trabalharmos com questões culturais via tecnologias emergentes, torna-se inviável dissociarmos tecnologia e cultura, sendo abordadas não como elementos divergentes (Simondon 2015), e sim como modos de agir perante o mundo. Nesse sentido, como ampliar o conhecimento preconcebido e singular da tecnologia e compreendê-la como elemento específico de cada cultura? Pensemos em tecnologias de construção de hábitos individuais e coletivos, de aprendizagem dos limites e escolhas e de formação psicossocial. De acordo com o Gilbert Simondon (2015), a cultura nada mais é do que a ação do homem sob o próprio homem, já que o indivíduo se alimenta mentalmente dos mesmos artifícios em que o mesmo produz. Diante desses processos cognitivos, para Simondon, o sujeito individual e o coletivo se constituem no mesmo processo e as diversidades culturais se solidificam, ora por aprendizado, ora pelos próprios genes. Tanto a cultura quanto a tecnologia, nesse caso, são ambas atividades de manipulação humana, pois exercem uma ação sob o humano por intermédio do meio.

Procuramos abordar a cultura atrelada às questões tecnológicas, a fim de romper com a dicotomia entre natureza e cultura, humano e tecnologia, uma vez que o que se define por natureza humana já parte de um sistema tecnológico e cultural. Como aponta Simondon (1989), “é necessário que o objeto técnico seja conhecido em si mesmo para que a relação do homem com a máquina seja estável e válida: daí a necessidade de uma cultura técnica” (82). Colocamos, aqui, a pertinência de uma abordagem filosófica sobre a tecnológica como uma maneira de se compreender os processos de individuação implicados nos artefatos tecnoestéticos em seus meios associados específicos (Oliveira 2020).

Entendemos como já superadas visões distorcidas da cultura que afrontam a tecnologia ou vice-versa, estando voltadas ora para uma idolatração tecnofílica ora para uma rejeição tecnofóbica. Isto é, ora a tecnologia seria subjugada ao humano como mera ferramenta, ora estaria idolatrada como modelo perfeito de existência como os robôs, ora apareceria como uma ameaça ao atribuir-lhe alma e existência separada, autônoma, com vontade própria, contra um homem preguiçoso, ocioso e obsoleto. Tais colocações não se sustentam mais e perderam seu valor de discussão no momento em que humanos e não humanos estão intimamente implicados em um mesmo processo de individuação. Sabemos que as tecnologias nunca foram boas, nem más e nem neutras, por exemplo, o implemento do potencial da tecnologia marítima na época das Grandes Navegações nos séculos XV e XVI, ocasionou a expansão das comunicações continentais e trocas culturais e econômicas, contudo, ao mesmo tempo, o extermínio de povos originários, extermínio esse que, infelizmente, ainda continua. (80)

Com o intuito de pensar implicações entre o orgânico e as máquinas digitais, Yuk Hui (2016b, 2019) propõe uma abordagem sobre a tecnodiversidade. Com embasamento no pluralismo ontológico, o autor problematiza as tecnologias emergentes a fim de superar oposições entre natureza e técnica, humano e máquina, objetividade e subjetividade, através de proposições sobre a tecnodiversidade. Com base nos conceitos de reticulação e tecnicidade, nos propõe um pensamento cosmotécnico que visa integrar tecnologia e cultura. A fim de evitar um desenvolvimento tecnológico homogêneo, baseado em uma visão eurocêntrica, e apropriar a tecnologia em uma nova episteme, une visões cosmológicas contemporâneas e tradicionais, ocidentais e orientais, através da análise de múltiplos sistemas tecnológicos e suas particularidades (Oliveira, 2020).

Em seu livro The Question Concerning Technoloy in China (2016), realiza uma pesquisa histórica sobre o pensamento chinês, bem como investiga questões histórico-metafísicas da tecnologia moderna. Ao tecer relações entre o tradicional e o moderno, entre o local e o global, entre o Oriente e o Ocidente, aponta que uma consciência histórica, requer uma consciência tecnológica. O pensamento chinês surge como um contraponto para questionar as técnicas globalizadas, abrindo espaço para outros pensamentos diferenciados, como as cosmologias indígenas, apontando que existem múltiplas naturezas, cosmologias, mitologias (sistemas de pensamentos), e tecnologias (Oliveira 2020).

Nesse sentido, o conceito de cosmotécnica está implicado em uma visão da tecnodiversidade, extremamente importante ao conjugarmos tecnologia e cultura, haja vista que devemos entender em qual sistema tecnológico estamos inseridos. Embora Hui (2020) conceba seu discurso de cosmotécnica partindo da cultura chinesa, o autor ressalta que cada cultura deverá adaptar as tecnologias com seus modos culturais locais.

No livro, On the Existence of Digital Objects (2016), Hui questiona, dentro de um contexto da história da computação, como os objetos digitais podem ser entendidos de acordo com os seus modos de individuação, com fundamentação em Martin Heidegger e Gilbert Simondon. Traz o conceito simondoniano de meio associado, que reúne o meio natural e o tecnológico, e o plano pré-individual para pensar o objeto técnico digital como um artefato sociotecnológico, constituído basicamente de dados e metadados compartilhados e controláveis que definem cada vez mais o nosso mundo (Oliveira 2020).

Yuk Hui (2020) sugere pensarmos uma tecnologia plural e inclusiva, desprendida da hegemonia europeia. Também atenta para o caráter excludente da globalização, a qual prioriza certos conhecimentos, em detrimento de levar outros saberes ao esquecimento. Nesse sentido, as tradições e as especificidades de cada cultura requerem particularidades e necessitam de uma tecnologia manipulável aos seus modos de existência. As técnicas se diferem entre si e os produtos que elas resultam não devem ser unificados enquanto uma mesma tecnologia, pois cada cultura a percebe de formas específicas (Hui 2016, 9).

Nesse sentido, Hui questiona e provoca uma reflexão: “o que significa uma cosmotécnica amazônica, inca, maia? E, para além de formas de arte e de artesanato indígenas a serem preservadas, como essas cosmotécnicas poderiam nos inspirar a recontextualizar a tecnologia moderna?” (Hui 2020, 10). O referido projeto poderia ser uma reflexão de como as tecnologias possam estar sendo utilizadas e percebidas de forma singular. Os indivíduos Kaingáng são receptivos e acreditam que meios artísticos, pedagógicos e tecnológicos possam contribuir para a preservação/permanência da sua cultura.

Assim, o jogo digital Kamê Kanhru, em especial, vem permitir que os povos indígenas sejam os contadores de suas próprias histórias e suas sabedorias. Os povos indígenas resistem aos processos hegemônicos ao potencializar seus modos culturais por meio do uso de tecnologias emergentes em arte digital. O projeto, ainda, objetiva democratizar o conhecimento tecnológico para as comunidades indígenas, problematizando como o conhecimento artístico, tecnológico e científico pode contribuir para a valorização das culturas minoritárias. Em suma, propomos um senso de responsabilidade coletiva ao fazer o uso das tecnologias emergentes, como um processo que nos torne mais empáticos, num momento em que uma consciência ética e integradora se faz urgente.

Portanto, este artigo propõe ativar discussões presentes sobre cultura e tecnologia e suas implicações no futuro, problematizando usos, aplicações e práticas das tecnologias emergentes, no âmbito do coletivo. Nesse contexto, entendemos que aspectos culturais dos povos originários podem contribuir com outras sabedorias a serem absorvidas em suas formas coletivas do saber, na perspectiva de uma comunidade global efetiva.

Arte, tecnologia e cosmología

Trazemos uma abordagem da tecnologia e da cultura a fim de pensarmos as culturas minoritárias na contemporaneidade e a urgência de um discurso que propõe um desenvolvimento tecnológico não universal e generalista. Entendemos que “o que toda experiência de uma outra cultura nos oferece é a ocasião para se fazer uma experiência sobre nossa própria cultura; muito mais que uma variação imaginativa” (Viveiros de Castro 2018, 21) ou especulativa.

Tanto a tecnologia, quanto a arte, são conceitos sobrecarregados de uma concepção eurocêntrica. Essa abordagem comum, de modo simplista, atua de forma verticalizada e tende a ofuscar o conhecimento advindos das culturas dominantes ocidentais. De fato, não é novidade que o conhecimento científico separa o que julga de interesse e legitima apenas parcelas de estudos e informações para simplificar um campo de complexidades (Morin 2005).

Neste sentido, Steven Brown e Ellen Dissanayake (2009) veem a arte como uma forma de tornar as coisas especiais, sendo que essas coisas podem ser objetos ou comportamentos. Debatem a arte como um comportamento necessário para o processo evolutivo e para a sociabilização dos seres. Deste modo, a arte estaria ligada à evolução da sociedade, nos aspectos de convívio, de prazer e de memórias. Os autores analisam a arte a partir dos rituais do comportamento humano e animal, os quais são capazes de tornar especial alguma coisa ou situação. Essa capacidade de tornar coisas comuns em algo extraordinário, segundo Brown e Dissanayake, seria uma herança biológica intrínseca dos seres vivos. Os dois autores consideram a arte enquanto experiências, práticas e interação social, incluindo a arte folclórica, arte aborígene e culturas populares.

Ao incluírem os processos de ritualização e artificação para pensar a arte, colocam que o comportamento de artificação diz respeito à capacidade do humano de tornar coisas comuns em coisas extraordinárias. Esse comportamento estaria presente em toda ação do homem que tende à repetição, à elaboração e ao exagero, com intuito de ser percebido, de chamar a atenção para si ou para algo. Os resultados dessas atividades de artificação e ritualização, de acordo com os autores, desencadeiam uma importante consequência cognitiva, pois carregam em si outras significações e outros olhares para as mesmas situações e objetos.

Neste sentido, entendemos que a arte socialmente engajada se volta às atividades de artificação e ritualização, ao se trabalhar com coisas comuns pertinentes a cada comunidade, via uma aproximação lenta e contínua. Práticas artísticas em que o status individual do artista, bem como um retorno imediato para o sistema artístico, se configuram como barreiras, para de fato compreendermos e absorvermos o “cosmos” do outro. Tais proposições artísticas, quando construídas com as comunidades, se tornam abertas e possíveis em vários direcionamentos. “A arte, nesse aspecto, é uma possibilidade de ativação, de fomento e de resistência atrelada aos indivíduos e seus territórios” (Mallmann et al. 2019, 135). Na prática artística, “DNA: Afetivo Kamê e Kanhru”, através das tecnologias emergentes, está sendo possível ativar outras técnicas ancestrais, sendo que esses saberes tradicionais não se diferem em relevância de outros saberes, embora não tenham o mesmo espaço de visualização e legitimidade.

De fato, a humanidade, na contemporaneidade, se encontra carente de tais saberes, ensinamentos, fazeres e valores significativos para guiar e demarcar suas ações futuras. Ao mesmo tempo, há uma tecnodiversidade, meios e possibilidades de retomar verdadeiros sentidos existenciais e coletivos para o que chamamos “espécie humana”. Portanto, com o intuito de pensarmos quais mundos temos construído com as tecnologias emergentes, diversos teóricos têm nos questionado que tipo de sociedade queremos para viver e quais direções estamos dando para essas tecnologias nos nossos cotidianos.

Torna-se também relevante pensar a decolonização a partir da perspectiva das tecnologias, caminhando no sentido contrário do processo de universalização (Hui 2020). Compreendendo que todo processo de universalização é hierárquico e vertical, conforme as diferenças de poder: “o poder tecnologicamente mais forte exporta conhecimento e valores para o mais fraco e, como consequência, destrói interioridades” (Hui 2020, 43). Nessa acepção, as práticas em arte socialmente engajadas poderiam se portar enquanto estratégias para pensarmos sua utilização específica para cada “cosmos”, ao ativar a cultura dos povos originários de modo ético e efetivo, composta por “uma multiplicidade de cosmotécnicas que difiram uma das outras em seus valores, epistemologias e formas de existência” (Hui 2020, 149). Essa cultura, ao invés de ser esmagada por suposto progresso tecnológico e unificado, poderá estar se apropriando de outras alternativas para se instaurar na contemporaneidade por meio da tecnodiversidade.

No momento em que podemos compreender a arte a partir da perspectiva de comportamento artístico, naturalmente as tecnologias também são reposicionadas e repensadas, visto que existe uma tríade entre a arte, a cultura e a tecnologia, pois estão conectadas entre si. Toda forma de arte se utiliza de técnicas/tecnologias, não apenas como instrumentação, mas técnicas enquanto modos de fazer e agir.

Como colocamos anteriormente, a partir dessa acepção, é urgente um discurso que evoque uma compreensão que considere a técnica/tecnologia como parte integral da cultura e, tal reflexão, poderia ajudar a contribuir na humanização dos processos tecnológicos contemporâneos. E através dessa prerrogativa, de que as tecnologias estão aliadas à nossa formação cultural, não podemos continuar pensando nelas enquanto ameaçadoras das culturas e da própria humanidade. Ao contrário, “recolocar a questão da tecnologia é recusar esse futuro tecnológico homogêneo que nos é apresentado como a única opção” (Hui 2020, 46). Ao compreendermos as técnicas/ tecnologias como parcela de cada cultura, é possível vislumbrá-las como aliadas de todo e qualquer processo de formação cultural. É diante dessa interposição entre tecnologia, humanidade e o cosmos, que o filósofo Yuk Hui cria seu terreno discursivo e ajuda a refletir sobre o caráter múltiplo das tecnologias, as quais contemplam os diversos modos culturais distintos existentes no mundo.

Ao pensar em cosmotécnicas, Hui está afirmando o caráter plural, humano e cosmológico da tecnologia. As tecnologias carecem de ser integradas e desmistificadas dos rótulos high-tech e precisam ser compreendidas em suas diversas formas vinculadas à sobrevivência/existência humana. O caminho humanista para as tecnologias é relacionar-se com elas de modo incorporado com o cosmos de cada comunidade em particular. É percebê-la como componente de cada cultura e, desse modo, parte de nossa própria existência. A medida em que o homem, ao criar e recriar o seu meio externo, o internaliza e manifesta, assim, a si mesmo.

Sabemos que, para os kaingáng, há uma divisão da sociedade em duas marcas, as quais são complementares e codependentes. Veiga (2020, 82) constata que o sentido de “alteridade como modo de vida” é a característica marcante que envolve todos os mitos Kaingáng. Ainda, reforça que “no cotidiano, a ideologia Kaingáng entre os opostos ou contrários, é vista como ideal e harmoniosa, enquanto a relação com os mesmos membros do grupo é considerada conflituosa” (Veiga 2020, 83). A autora se refere, a partir da cosmologia Kaingáng e seu reflexo nos modos de vida e de convivência coletiva, que há uma certa insistência na troca entre os que são diferentes e complementares.

É importante ressaltar que essa aproximação entre a ideia de cosmotécnica e a cosmologia Kaingáng é apresentada apenas de forma sucinta, pois compreendemos que há um universo complexo que carece de aprofundamento teórico para que, de fato, a cosmologia Kaingáng seja melhor assimilada em sua dimensão cosmotécnica. Aqui, nos interessa dialogar com as características cosmológicas mais marcantes dessa cultura, que norteiam nossa prática artística atrelada a essas comunidades, bem como propiciam certa diversidade no modo de exploração das tecnologias utilizadas. A temática kamê e kanhru, que é trabalhada em todas as ações e dinâmicas artísticas do projeto “DNA: Afetivo Kamê e Kanhru”, descritas anteriormente nesse artigo, representa os principais aspectos cosmológicos e culturais Kaingáng.

Ao pretendermos pensar o que seria uma cosmotécnica Kaingáng na prática artística “DNA afetivo Kamê e Kanhru”, faz-se necessário abrangermos as técnicas ancestrais, vinculadas à formação cultural do povo Kaingáng, e as tecnologias emergentes, vinculadas à formação ocidental, a fim de que possa ser articulada nesse contexto cosmológico específico. Como Eduardo Viveiros de Castro aponta: “Pensar outra mente, pensar com outras mentes – é comprometer-se com o projeto de elaboração de uma teoria antropológica da imaginação conceitual, sensível à criatividade e reflexividade inerentes à vida de todo coletivo, humano e não-humano” (Viveiros de Castro 2018, 25). Compreendemos que todos os modos culturais são inteirados enquanto técnicas/tecnologias. Pensamos nas formas de plantio e cultivo, criação de animais, produção de alimentos, no artesanato, na pintura corporal, no uso das plantas medicinais, no idioma, na preservação cultural por meio da oralidade, nos rituais, etc. É importante destacar que atualmente os rituais kaingáng são mais silenciosos, de caráter doméstico (Veiga, 2020). Esses rituais estão presentes principalmente nos eventos de nascimento, na escolha dos nomes, no resguardo de parto, no luto, e nas formas de sepultamento.

Todos esses elementos, dentre inúmeros outros, fazem parte de um universo tecnológico da cultura Kaingáng. Desse modo, a cultura Kaingáng, assim como a cultura de outros povos nativos e originários, resistem por meio de suas próprias tecnologias. Do mesmo modo, problematizamos, aqui, como as tecnologias emergentes, quando disponíveis e parte da realidade social desses povos, também podem ser assimiladas e relacionadas à preservação e à perpetuação de seu patrimônio cultural.

O processo de criação do jogo Kamê Kanhru está atrelado às narrativas dos indivíduos das comunidades Kaingáng. O que os seus avós e os anciões ensinaram, através da oralidade, foram passados à equipe do projeto, que, em colaboração com as mesmas comunidades, criaram outros aspectos e elementos a partir dessas narrativas. O jogo digital Kamê Kanhru agregou a imagem visual e sonora, as estratégias de gamificação e as dinâmicas de interação lúdica, como outra possibilidade de se contar sobre os mesmos mitos, tradições e costumes. A cultura de passar a sabedoria Kaingáng dos mais velhos aos mais novos se faz presente no processo de criação e nos objetivos do jogo digital Kamê Kanhru, sendo um jogo destinado, principalmente, às crianças e ao público jovem em idade escolar.

Acreditamos que ações como essas, dentre outras inúmeras possibilidades de vincular a arte, a tecnologia, a cultura e as cosmologias, possam ser cada vez mais habituais diante das culturas não dominantes. Nessa perspectiva, as culturas dos povos originários e a tecnologia atual necessitam entrelaçar-se, até que o uso dessas tecnologias seja requerido por esses grupos, e não, de certo modo, imposto por uma necessidade de adaptação desses indivíduos ao meio, o qual condiz a uma suposta inclusão digital. O movimento seria, ao contrário, as tecnologias que deveriam estar sendo apropriadas na dinâmica cultural desses povos, ou seja, “todas as culturas não europeias deveriam sistematizar as próprias cosmotécnicas e as histórias dessas cosmotécnicas” (Hui 2020, 42). Desse modo, ao pensar em cosmotécnica, relacionada à cultura kaingáng, estamos idealizando o uso consciente das tecnologias, como meio de efetivação e ativação dos seus valores cosmológicos.

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Notas

* Artigo de pesquisa

1. Uma mecânica multiplayer foi explorada nesse jogo, possibilitando a interação à distância dos indígenas Kaingáng de comunidades geograficamente distantes.

2. Animal de poder.

3. Espécie de curandeiro.

4. Em exceção do ano de 2020-2021, em que não foi possível estar presencialmente nas comunidades, em decorrência da pandemia causada pelo coronavírus.

5. Esse texto foi baseado no relato do Prof. Getúlio Tojfã, indígena kaigáng da terra indígena de Chapecó, Santa Catarina (Mallmann 2018).

Autor notes

** Artista multimídia, doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais da Universidade Federal de Santa Maria (PPGART/UFSM). Mestre em Artes Visuais (PPGART/ UFSM/2018). Bacharel em Artes Visuais (UFSM/2010). Atualmente é membro do Laboratório Interdisciplinar Interativo do Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais da Universidade Federal de Santa Maria (LABINTER/PPGART/ UFSM) Autora do projeto de extensão intitulado“Ativação da cultura indígena por meio de práticas colaborativas em arte, ciência e tecnologia”. Apoio bolsade doutorado CAPES e bolsa de pesquisador CNPq. ORCID: 0000-0002-6597-3925 Correio eletrônico: kalinkamallmann@gmail.com

*** Artista multimídia. Atualmente é pesquisadora do CNPq/PQ2 e professora associada do Departamento de Artes Visuais e do Programa de Pós-graduação em Artes Visuais da Universidade Federal de Santa Maria. Idealizadora e coordenadora do LabInter/UFSM e líder do gpc.InterArtec/CNPq. Doutora pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) - Brasil, com estágio doutoral na Université de Montreal (UdM) - Canadá (2010). Mestre em Psicologia Social e Institucional (UFRGS/2006) e graduada em Bacharelado (UFGRS/1994) e Licenciatura em Artes Visuais (UFRGS/1999). ORCID: 0000-0002-8582-4441+ Correio eletrônico: andreiaoliveira.br@gmail.com

**** Possui licenciatura e Bacharelado em História pela Universidade Federal de Santa Maria. Integrante do Programa de Educação Tutorial Indígena da UFSM de 2016-2019 e integrante do LabInter (UFSM). Atualmente, é professor de história na Escola Estadual Indígena de Ensino Fundamental Augusto Opé da Silva. ORCID: 0000-0003-0089-9872 Correio eletrônico: djocesales93@gmail.com

Informação adicional

CÓMO CITAR: Lorenci Malmann, Kalinka, Andreia Machado Oliveira y Joceli Sirai Sales. 2021. “Arte e tecnodiversidade na ativação da cultura indígena kaingáng”. Cuadernos de Música, Artes Visuales y Artes Escénicas 16(2): 174-195. http://doi.org/10.11144/javeriana.mavae16-2.atac

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