O Jogo Social dos atores na Gestão Federativa em Saúde*

El Juego Social de los actores en la Gestión Federativa de la Salud

The Social Game of the Actors in the Health Federative Management

Revista Gerencia y Políticas de Salud, vol. 18, núm. 37, 2019

Pontificia Universidad Javeriana

Brígida Gimenez de Carvalho a

Universidade Estadual de Londrina, Brasil


Sônia Cristina Stefano Nicoletto

Secretaria de Estado da Saúde do Paraná, Brasil


Elisabete de Fátima Polo de Almeida Nunes

Universidade Estadual de Londrina, Brasil


Recepção: 20 Julho 2018

Aprovação: 15 Maio 2019

Publicado: 29 Novembro 2019

Resumo: O espaço da gestão federativa é a Comissão Intergestores Regional, onde atores discutem, negociam e pactuam ações de saúde. Com objetivo de compreender a gestão federativa produzida em regiões de saúde do Paraná - Brasil, realizou-se estudo qualitativo. Participaram 40 gestores municipais em cinco grupos focais e cinco representantes da gestão estadual, entrevistados. Os resultados foram analisados por meio da hermenêutica-dialética, à luz da Teoria do Jogo Social. Nas discussões dos gestores predominaram demandas das esferas nacional e estadual e a rotatividade de alguns e o despreparo de outros dificultam a construção de um coletivo coeso. O poder teve destaque, fazendo com que a vontade de uns prevalecesse e o consenso fosse alcançado à custa de apatia. Constatou-se interferência de outros jogos sociais, com destaque para o político, econômico e da comunicação. Considera-se que a gestão federativa necessita posicionamento dos atores diferente do encontrado.

Palavras-chave: política de saúde, gestão em saúde, regionalização.

Resumen: El espacio de la gestión federativa es la Comisión Intergestores Regional, donde los actores discuten, negocian y pactan acciones de salud. Con el objetivo de comprender la gestión federativa producida en regiones de salud del Paraná - Brasil, se realizó un estudio cualitativo. Participaron 40 gestores municipales en cinco grupos focales y cinco representantes de la gestión estadual, entrevistados. Los resultados fueron analizados por medio de la hermenéutica-dialéctica, a la luz de la Teoría del Juego Social. En las discusiones de los gestores predominaron las demandas de las esferas nacional e estadual; la rotación de algunos y la falta de preparación de otros dificultaron la construcción de una cohesión colectiva. El poder se destacó al lograr que la voluntad de unos prevaleciera y el consenso fuera alcanzado a costa de la apatía. Se constató la interferencia de otros juegos sociales, resaltando el político, el económico y las comunicaciones. Se considera que la gestión federativa necesita posicionamiento de los actores diferente al encontrado.

Palabras clave: política de salud, gestión en salud, regionalización.

Abstract: The site for the federative management is the Regional Commission of Intergestores (cross-linked managers). There, the different actors discuss, negotiate and agree on health-related actions. This qualitative study was conducted in order to understand the federative management carried out for health issues in regions of the Paraná (Brazil). Forty (40) municipal managers participated, working in five focus groups, and five agents from the State’s management were interviewed. The results were analyzed under a hermeneutic-dialectical approach, under the Game Theory. In the discussions among managers prevailed some claims about issues from both the state and national spheres. The turnover of some managers and the lack of formation in other ones made harder to build the collective cohesion. The power stood out when the will of a few ones prevailed over the others by reaching a consensus based on the apathy. Interference from other social games was confirmed, mostly from the political, economic and the media fields. It is concluded that a health federative management requires the positioning of the actors in a way other than the one existing now.

Keywords: health policy, health management, regionalization.

Introdução

No Brasil, a Constituição Federal de 1988, instituiu o triplo federalismo, em que a União, Estados e Municípios se constituem entes, ao mesmo tempo, autônomos e interdependentes. A Constituição criou também o Sistema Único de Saúde (SUS), cuja diretriz organizativa é a descentralização político-administrativa, com direção única em cada esfera de governo (1). Esta diretriz, detalhada na Lei 8080/1990, e mais recentemente no Decreto no 7508/2011, prevê a ênfase na descentralização dos serviços para municípios e a regionalização e hierarquização das ações e serviços de saúde (2,3). Na implementação desse princípio, houve na primeira década de criação do SUS (década de 1990) um intenso processo de descentralização com ênfase para a municipalização, impulsionado por meio das normas operacionais básicas (1).

Esse processo de descentralização tem sido considerado uma experiência relevante no campo da gestão pública, apesar das disputas e dos conflitos que existiram e existem na sua concretude (4). E também produziu efeitos colaterais. Um deles refere-se à dinâmica política do federalismo sanitário, pois a prática da relação direta do ente federal com os municípios enfraqueceu as relações entre as esferas estaduais com as municipais, trazendo dificuldades tanto para o comando dos serviços de saúde como para o estabelecimento de responsabilidades (1). Também é impossível que todos os municípios brasileiros consigam atender suas populações integralmente, principalmente os municípios pequenos, sendo este um dos embasamentos para a regionalização das ações e dos serviços de saúde (5).

Foi a partir dos anos 2000, que a regionalização passou a ser discutida no processo de reorganização das ações e serviços de saúde do SUS. Para potencializar os recursos sanitários e garantir a integralidade da atenção à saúde à população, respeitando a autonomia dos três entes federados, é necessário investir na regionalização da saúde, promovendo a cooperação federativa (6).

Para o alcance da gestão federativa, que pressupõe a articulação dos três entes, foram criados espaços para negociações e pactuações das ações e serviços de saúde entre os gestores. No âmbito da região de saúde, o espaço oficial de interação desses gestores (município e estado) é a Comissão Intergestores Regional (CIR) (3). Nesse colegiado os secretários municipais de saúde (SMS) e os representantes da gestão estadual de uma região tomam as decisões sobre a organização de ações e serviços de saúde na construção da Rede de Atenção à Saúde (RAS) para garantir a atenção à saúde dos cidadãos.

O cenário da gestão federativa é permeado por vários jogos sociais. Essa afirmação está alicerçada no referencial teórico de Carlos Matus (7), de que cada arranjo coletivo humano tem a possibilidade de produzir o seu jogo. Assim, considerando que na CIR, o colegiado de atores produz um jogo social, desenvolveu-se este estudo para compreender como a gestão federativa é produzida no jogo social da CIR, em uma região de saúde.

Referencial teórico

A Teoria do Jogo Social, de Carlos Matus contribui significativamente para a área da política e da gestão em saúde e subsidia o ato de governar no campo do jogo social (8); busca auxiliar o governante a ampliar sua capacidade de intervenção diante de uma realidade cuja produção social ocorre a partir de jogos complexos e indeterminados (9). Portanto, optou-se por empregar um recorte desta teoria no presente trabalho.

Para Matus, o jogo social é um sistema criativo, de final aberto, raramente com aspectos determinísticos e há nele variáveis imprecisas, incertas e mutáveis, inerentes à complexidade da prática social. Não é equitativo, possui regras imprecisas e desiguais, e apresenta barreiras cognitivas, políticas, econômicas, organizacionais e comunicativas (7).

É composto de vários outros jogos, com destaque para três: o político, o econômico e o da comunicação. No jogo político ocorre a disputa dos atores pelo controle dos diversos sistemas de governo em vigência no jogo social, e combina a luta por motivações pessoais com as motivações ideológicas, expressas em projetos sociais. O jogo econômico liberta ou subjuga o homem através da satisfação das necessidades econômicas, disputado por empresários e consumidores, pelo controle dos recursos econômicos e domínio dos mercados. No jogo da comunicação se estabelece a disputa pela transparência, opacidade e controle da interação humana, e se utiliza da linguagem como poder de comunicação. Sua função é produzir a interação entre os atores, o que é funcional para o jogo dos atores dominantes (7).

Carlos Matus também tipifica os diferentes estilos de fazer política em “Chimpanzé”, “Maquiavel” e “Gandhi”. O estilo Chimpanzé é aquele que desenvolve a gestão com base em seu projeto individual; um estilo autoritário, no qual um manda e os outros obedecem. No estilo Maquiavel o fim justifica os meios, e assim adaptam-se os meios à superioridade do projeto, da ideologia escolhida. Os que governam decidem pelo cidadão, que deve obedecer ou sair de cena. E o estilo Gandhi é baseado na força moral e no consenso; há diálogo, negociação cooperativa, procurando eliminar as desigualdades. O líder, que não é superior, representa o consenso do coletivo e é respeitado sem exercer a força física (10,11).

Os três estilos políticos são expostos separadamente, mas na realidade social, não se encontra puramente um estilo. Dependendo do caráter do líder, de seus interesses, do contexto e das condições em que a política se desenvolve, aparecerá uma combinação dos estilos.

Para analisar um jogo social Matus (7) propõe um olhar para os seguintes conceitos: genoestruturas - são as regras do jogo que delimitam o espaço possível de ação; fenoestruturas - as acumulações conseguidas no jogo social; ações - produções realizadas pelos atores e estão relacionadas com a dinâmica do jogo; ator - pode ser uma pessoa ou um grupo de pessoas que, agindo em determinada realidade, é capaz de transformá-la.

Na genoestrutura, os atores sociais, acumuladores de maior poder, se estão satisfeitos, defendem e mantêm o estabelecido, e quando insatisfeitos conseguem mudar as regras do jogo (7). Estas regras devem ser iguais para todos, contudo, sempre há regras vantajosas para uns e prejudiciais para outros, desigualando o grau de liberdade de cada ator (7).

As fenoestruturas, ou capital social, são acumulações sociais, produções construídas na história que interferem no jogo social (7). As ações realizadas pelos atores podem ser estratégicas e/ou geradoras de acordos. A estratégica visa beneficiar um jogador ou grupo de jogadores e pode ser aberta ou velada. Quando for velada é preciso compreender se foi uma manipulação, uma ocultação intencional, ou se trata de um engano inconsciente, neste caso são vítimas tanto o enganador como o enganado (7). Aqui o estilo político que sobressai é o Maquiavel (11). Na ação geradora de acordos, também chamada de comunicativa, há uma intenção com benefício comum, com acordos. O maior emprego do estilo Gandhi de fazer política favorece esse tipo de ação (7,11).

Quando um ator político deflagra uma ação e toma uma decisão pública diante dos objetivos e metas de governo, surgem efeitos positivos e negativos, produzindo um intercâmbio de problemas, pois ao mesmo tempo em que produz o benefício de sua meta atingida, pode criar novos problemas ou intensificar alguns existentes. Vivencia-se uma dinâmica complexa onde uma ação pode beneficiar uns e prejudicar outros. O que é problema para um, pode ser um bom negócio para o outro (7).

A realidade social é diferente para os atores, pois as circunstâncias vividas moldam diferentemente cada pessoa, conforme o seu entendimento e da posição que ocupa na realidade, da situação e do poder que possui para realizar seus objetivos. Sem as diferenças de percepção dos atores não seria um jogo social, não haveria conflitos nem necessidade de cooperação (7).

A cooperação pode ser aberta ou limitada. A aberta está no plano da transparência, com informações claras e colaboração e na limitada há opacidade na comunicação e falta de informações (7). Já os conflitos decorrem de diferentes objetivos, interesses e intencionalidades dos atores em um jogo social e/ou por uns lutarem pela manutenção do jogo, pela dominação, e outros desejarem a transformação das regras (7).

O jogo social em análise neste estudo é a CIR, que é o lócus da relação intergovernamental regional, em que se pactuam e se decidem sobre a organização e funcionamento das RAS. Assim, diante da relevância da CIR, no contexto da gestão federativa regional, foi elaborada a figura 1, com o intuito de explicar realidades dinâmicas, complexas e subjetivas vivenciadas neste espaço.

A
gestão federativa produzida no jogo social da Comissão Intergestores
Regional
Figura 1.
A gestão federativa produzida no jogo social da Comissão Intergestores Regional


Fonte: elaboração própria

Materiais e métodos

Trata-se de um estudo qualitativo, de natureza compreensiva e interpretativa, desenvolvido na macrorregião norte do Paraná que é constituída por cinco Regionais de Saúde (RS), cada uma com uma CIR instituída.

Foram definidos como sujeitos de pesquisa os SMS e representantes da gestão estadual, que são os atores da CIR com poder de decisão neste colegiado. Os participantes foram identificados a partir das listas de presenças nas reuniões destas comissões, realizadas no ano de 2011. Com isso verificou-se que eram poucos os representantes da gestão estadual, ou seja, a representação das CIR não era paritária. Diante disso e, tendo o pressuposto de que poderia haver divergências de concepções e interesses entre os representantes dos distintos entes federados (municípios e estado), optou-se fazer a coleta do material empírico em dois momentos: grupos focais com SMS e entrevistas com representantes da gestão estadual.

Para a coleta de dados foi utilizado um roteiro, construído e validado, com questões semi-estruturadas, tanto para os grupos focais como para as entrevistas, que versavam sobre a organização das reuniões das CIR; sobre como se dá o processo decisório nestes colegiados e sobre a governabilidade dos atores para materializar as decisões pactuadas na CIR.

Dos 97 SMS identificados, foram excluídos aqueles que deixaram de ser gestores no ano de 2012 e os que tinham frequentado menos da metade das reuniões das CIR em 2011. Dessa forma foram selecionados 49 (51%) do total de gestores municipais da macrorregião estudada. Os SMS selecionados foram convidados a participar de um dos cinco grupos focais realizados em cada região, entre agosto a outubro de 2012.

Também por meio das listas de presenças das CIR pode-se verificar que a participação assídua dos representantes da gestão estadual era de entre três a cinco, em média, em cada CIR. Por esta razão, a decisão foi de entrevistar o ator, considerado entre os representantes do estado, com maior conhecimento e “autoridade” para falar em nome da gestão estadual. Assim foram entrevistados cinco representantes da gestão estadual, um de cada CIR, no período compreendido entre junho a agosto de 2013.

As gravações foram transcritas na íntegra e retirados os vícios de linguagem. Os grupos focais foram codificados como GF1, GF2, [...] GF5 e como foram vários os participantes de cada grupo focal, eles foram codificados com as letras do alfabeto (A, B, C...). Para as entrevistas seguiu-se o mesmo critério para a codificação: E1, E2, E3, E4 e E5.

A análise do material empírico foi realizada por meio da hermenêutica-dialética (12). Numa primeira imersão houve leitura da totalidade do material para impregnação dos discursos pela pesquisadora, tanto dos grupos focais como das entrevistas individuais. Na sua codificação e decodificação procurou-se compreender tanto o acontecimento como o sentido e a subjetividade do sujeito (13). Depois foram realizadas leituras flutuantes do material, agora mediadas por indagações e reflexões da pesquisadora, até a saturação (12). E em sequência, foram realizadas leituras transversais do conjunto do material, destacando o conteúdo relevante e organizando-os em categorias, em que se procurou não estar mais aprisionada às falas dos depoentes, buscando ultrapassar o nível descritivo do material empírico (12). Por fim o material foi mediado à luz de um recorte da Teoria do Jogo Social de Carlos Matus (7), considerando o contexto no qual foi produzido.

A pesquisa seguiu todos os princípios éticos que norteiam a pesquisa científica envolvendo seres humanos, foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade a que estão vinculados os pesquisadores, sob parecer no 278/2011, CAAE-0258.0.268.268-11.

Resultados

O perfil dos atores que deram voz a esta pesquisa

Dos 49 gestores municipais que atendiam os critérios de inclusão e que foram convidados a participar dos grupos focais, participaram 40 (81,6%). Dos participantes, 50% já haviam ocupado o cargo de SMS; a maioria era do sexo feminino (52%) e as idades variaram entre 23 a 65 anos. Em relação ao nível de escolaridade, um pouco mais da metade possuía ensino superior (57%), e destes, 35% cursaram especializações. Desta forma, os participantes eram legítimos representantes dos gestores municipais, com experiência na gestão e os que apresentavam maior interesse na gestão federativa, tendo em vista sua efetiva presença nas reuniões da CIR.

Dentre os gestores municipais participantes da CIR, os de município pequenos, apesar de serem maioria nas regiões estudadas, apresentavam menor poder de decisão, tanto porque “quase não se manifestavam na CIR” (E4), como porque não possuíam serviços de saúde de maior complexidade da RAS localizados em seu território. No grupo de SMS, houve também a participação de gestores municipais que presidiam o Conselho Regional de Secretários Municipais de Saúde (CRESEMS). Estes, juntamente com os gestores de municípios maiores foram os que mais tiveram “voz ativa” nas reuniões, detendo o maior poder de argumentação na CIR.

Sobre o perfil dos representantes da gestão estadual, quatro eram mulheres e um homem, com idades entre 32 e 57 anos. Quatro eram de carreira profissional do estado e um de cargo comissionado. Com relação à escolaridade, um possuía formação de nível médio e os demais eram pós-graduados. Todos referiram possuir algum curso relacionado à gestão em saúde e isto os aproxima no aspecto da formação intelectual.

Ainda sobre os representantes da gestão estadual, estes se sentem com pouca autonomia, e sobre isso houve referência de que “a regional de saúde tem certa autonomia técnica, mas não tem autonomia política, financeira e de execução” (E4). Além disso, outros fatores como: a posição que este ator ocupa e sua singularidade, impregnada de intencionalidades e motivações, determinam seu modo de ver a realidade (7), e de atuar no jogo social da CIR.

O Jogo Social produzido na CIR: os atores e suas jogadas

As regras

Na perspectiva da teoria do jogo social, entende-se que o resultado do jogo na CIR, no âmbito da gestão federativa, é incerto, mesmo que esses coletivos estejam formalmente implantados e com regras formais pré-definidas. Neste jogo as regras se referem ao Decreto no 7508, de 28 de junho de 2011 (3), que instituiu a CIR no âmbito do SUS, e ao regimento interno da própria CIR, que delimita o que é permitido, reconhecido ou proibido no jogo.

Sobre as regras formais, o Decreto n. 7508/2011 (3), é de pouco conhecimento dos atores, como foi referido: “foi somente comentado em uma reunião” (E4). Em relação ao Regimento Interno, considerado uma regra que permitiria promover alguma equidade no jogo, pois os próprios atores da CIR poderiam definir seu conteúdo, infere-se não ter muita importância para os atores, conforme expressam os depoimentos: “em uma das primeiras reuniões foi lido o regimento interno, mas (...) não tínhamos entendimento” (GF2A); “tem um regimento (...) leu-se uma vez e nunca mais ninguém nem abriu” (E3).

Esses resultados permitem apontar que prevalecem as regras informais, baseadas na intencionalidade de cada ator ou grupo de atores na CIR, deixando o jogo na CIR com um resultado ainda mais impreciso.

Os atores

Em relação aos atores com poder de decisão na CIR há os que “falam mais, se expõem mais, outros ficam calados” (GF1G). “Sempre são os mesmos que falam, os outros concordam” (E3). “Há secretários de saúde que precisam se manifestar mais nas reuniões da CIR” (E4). Uma explicação para a diferença entre os que se expressam mais e os que não falam nas reuniões, pode estar relacionada à capacidade de comunicação e de argumentação de cada ator. Nesse caso, onde não há uma interação comunicativa fica difícil construir acordos e, portanto, a limitação do diálogo entre os atores pode tornar a comunicação pouco clara e confusa (7). Uma das formas de superar essa barreira é ter preparo, acúmulo de conhecimentos para ações embasadas na legislação do SUS, no âmbito da gestão federativa.

Além das diferenças da capacidade de comunicação dos atores, existe o problema de rotatividade e despreparo de gestores. Têm ocorrido mudanças frequentes de secretários e muitos vêm sem conhecimento, como no exemplo: “agora mesmo houve a substituição de um secretário municipal, o que entrou não tem a mínima noção de saúde” (E5). Ao assumir a secretaria sem conhecimento, “acaba passando o tempo da gestão aprendendo, sem autonomia para as decisões e quando estão mais informados está na hora de sair” (E3). Este despreparo para o exercício das funções inerentes ao cargo de gestão tem sido apontado por outros autores como problema no âmbito do SUS (14,15). Também há despreparo do representante da gestão estadual: “não tinha o preparo necessário quando assumi a função na CIR” (E3); “a regional de saúde tem a função de auxiliar, de coordenar, de fazer assessoria técnica para os municípios, mas não se tem todo o conhecimento técnico para isso” (E4). No âmbito do jogo social a defasagem de conhecimento é uma barreira para a ação (7).

Como visto no jogo social da CIR os atores com poder de decisão são os SMS e os representantes da gestão estadual. Para Cecílio (16) esses gestores possuem uma responsabilidade pela gestão sistêmica do cuidado em saúde e isso é intransferível. Portanto, era de se esperar que no processo decisório da CIR somente estes atores participassem. Mas como foi explicitado pelos próprios atores da CIR, isso não tem sido respeitado, pois também vem participando das reuniões da CIR trabalhadores de saúde dos municípios e das RS e apoiadores do Conselho de Secretários Municipais de Saúde (COSEMS) que, segundo as regras formais do jogo, não possuem poder de decisão. Esses outros atores podem acabar interferindo nas decisões e pactuações das CIR, porque o poder que permeia as inter-relações está alicerçado em várias determinações e não somente na formalidade da posição do ator no jogo.

Foi referido que, se por um lado os trabalhadores de saúde dos municípios “colaboram com os gestores municipais na execução das pactuações” (E2), por outro, podem manipular o SMS que acaba “ficando na mão deles, pessoas que às vezes, podem ser mal intencionadas” (GF2C). Neste caso, o poder do trabalhador de saúde, tomado no sentido da capacidade de manipular conhecimentos e informações, pode se manifestar (7).

Sobre os trabalhadores de saúde das RS, como eles detêm poder técnico e dominam o jogo da comunicação, ao exporem muitos dos assuntos na reunião da CIR, acabam salientando as razões técnicas para uma decisão e esta pode prevalecer, mesmo que não seja a melhor opção para a região de saúde, como aparecem nos discursos: “a regional centraliza o pleito regional e passa muitas informações” (E5); “a regional empurra uma pauta para aprovar/deliberar, força” (GF3E).

Quanto aos apoiadores do COSEMS, o que foi exposto diz respeito à sua ação fora do espaço da CIR: “o apoiador nos deixa a par de muitas coisas” (GF2si), mas, por outro lado, “o apoiador nos acelera, cobra, você mandou isso? É um pouco estressante” (GF1A). Neste caso se há interferências são indiretas. Na medida em que ele consiga conduzir algum projeto, é possível que altere o jogo. Mesmo assim, como nenhum ator tem total controle sobre o jogo social, pode ocorrer o inesperado em uma realidade em permanente construção (7).

A pauta

O jogo social da CIR se inicia no processo de organização da pauta, ou seja, antecede à reunião. Normalmente a pauta é acordada entre gestores municipais e representantes da gestão estadual, com “assuntos para deliberações, apresentações de temas técnicos e informes” (E4). Procura-se fazer reuniões mensais, mas quando “há imprevistos, as reuniões são desmarcadas ou marcadas em cima da hora, porque tem assuntos que precisam ser deliberados para ontem” (GF5A).

Apesar do consenso sobre a facilidade em pautar assuntos nas CIR, o paradoxo surge quando afloram os sentimentos sobre o interesse, o poder, a dominação dos entes federal e estadual sobre os municipais. Essa percepção é tanto dos representantes da gestão estadual como dos gestores municipais, como sinalizam os excertos a seguir:

“Muita execução por solicitação de Curitiba e por prazo do Ministério da Saúde, sem um filtro da regional de saúde” (E4). “A pauta é de acordo com os prazos que o nível central [SESA/PR] estabelece” (E1). “E até aconteceu, algumas vezes, divergências, porque o estado [SESA/PR] quer pautar o que quer e os municípios não querem aquilo”. “Os programas já vêm prontos, na realidade os municípios fazem a adesão” (GF5D).

Portanto, mesmo que as pautas sejam definidas pelos atores com poder de decisão da CIR elas são permeadas por demandas do Ministério da Saúde (MS) - ente federal, e principalmente, da SESA/PR - ente estadual.

Há consciência por parte dos gestores municipais de que nesse jogo eles são o ente com menor poder político, conforme expressa a fala: “Um pouco nós mesmos somos culpados, aceitamos as coisas de cima para baixo, não estamos fortalecidos” (GF5si). A persuasão dos entes federal e estadual sobre o ente municipal está alicerçada no jogo econômico, e se dá por meio de repasse de financiamento para os municípios. O poder exercido por meio do financiamento da saúde neste contexto pode ser percebido no seguinte discurso: “Tem muita coisa que desce de goela abaixo na CIR, ou faz, ou não recebe, então como é necessário o dinheiro a gente aceita” (E3).

Para Santos (17), o processo de legislação infraconstitucional tem sido intenso, já tendo atingido um índice de publicação de oito portarias ministeriais normativas por dia útil, depois diminuiu um pouco, mas voltou a crescer de maneira desmedida. É por meio dessa legislação que o MS tem instituído as regras de financiamento para áreas específicas. “Tal situação leva a uma reflexão sobre o financiamento como instrumento de controle federal sobre os municípios, pois estes têm de cumprir critérios previstos nas normas para receber os recursos necessários ao desenvolvimento das ações de saúde” (18, p. 11). Esse processo, de certa maneira, acaba por desrespeitar a autonomia de estados e municípios prejudicando os consensos entre os entes federados (19). Para Abrucio (20), a dinâmica da articulação federativa não pode ser alcançada com imposição ou utilização de repasse financeiro, por barganhas, do ente federal sobre os estados e municípios, muito menos do ente estadual sobre os municipais.

No cenário descrito, pode-se perceber que o estilo político praticado pelos entes federal e estadual na relação com os municípios tem fortes traços do estilo Maquiavel, em que “o que importa é o objetivo e esse é superior ao indivíduo; os meios e a ética devem adequar-se a ele. (...) Tudo gira em torno de um projeto e de uma ideologia que exigem mando e subordinação” (11, p. 21).

A dinâmica decisória na CIR

A experiência de negociar, fazer acordos, tomar decisão sobre a organização das ações e dos serviços de saúde de uma região nos espaços das CIR foi considerada um processo em construção, pois, “o pacto entre gestores e pensar na região é uma coisa nova” (E2). Assim, o processo tem sido, em alguns casos, de discutir e rediscutir uma problemática, de forma que não se resolva ou não se efetive a solução proposta, como expresso nos discursos:

“têm coisas que foram discutidas lá na primeira reunião, em abril de 2011 e, até agora, não foi resolvido” (GF2 F).

“nós ficamos com um caso indo e voltando durante um ano, sempre levantava o problema na reunião (...) então vinha tudo de novo à discussão (E3)”.

Na dinâmica decisória das CIR os atores fazem suas jogadas que podem levar ao conflito ou cooperação. Portanto, “há crises, conflitos” (E2) e não somente acordos no jogo da CIR. Quando um ator deflagra uma ação surgem efeitos positivos e negativos, um intercâmbio de problemas, em que, ao mesmo tempo em que alcança o beneficio de uma meta atingida, pode criar novos problemas ou intensificar alguns existentes, para si mesmo e/ou para outros atores. Consequentemente vivencia-se uma dinâmica complexa onde uma ação pode beneficiar uns e prejudicar outros. Por exemplo, em uma reunião de uma CIR:

“um SMS queria que a pactuação fosse com um serviço particular, mas o parecer da regional foi priorizar um serviço filantrópico ou estadual. Então houve discussão e prevaleceu o parecer da regional. O prestador de serviço pode acertar com o secretário, para ele tudo bem, mas para a região não” (E5).

Isso demonstrou que, no jogo da CIR, há disputas de interesses dos jogadores. Estas podem passar por força, imposição com confronto, mas precisa de alguma maneira alcançar uma negociação e chegar ao consenso para uma tomada de decisão coletiva.

Mesmo assim, sempre haverá “benefício” para uns e “prejuízo” para outros diante de suas posições no jogo social, pois o que é problema para um, para o outro pode ser um bom negócio (7). Assim, é utópico esperar que na CIR haja cooperação de todos, pois isto será “obrigatório” para uns, diante do resultado que os outros querem produzir, e aqueles que “cooperam” de forma obrigatória podem acabar tendo indiferença e apatia pela decisão tomada. Esse processo estressante pode gerar desinteresse de atores no jogo da CIR.

No processo decisório da CIR, o ideal seria chegar ao consenso, sem que isso signifique unanimidade de interesses, de ideias, mas um pacto entre os atores sociais em prol da política de saúde de uma região. Nesse contexto, cabe destacar que o conceito de consenso muitas vezes é empregado de maneira inadequada, como sinônimo de unanimidade. No entanto, o que ocorre é que o consenso, alcançado de forma impositiva, oculta conflitos, não amplia a capacidade de análise dos atores sobre os problemas e sua cadeia causal, o que impossibilita fundamentar suas ações, empobrecendo seu poder de decisão (1). Em estudo, realizado sobre a dinâmica da CIR no Estado do Ceará – Brasil, foi demonstrado que, em sua maioria, os consensos firmados também foram gerados com apatia, sem a preocupação explícita sobre a importância destes para a organização do sistema (21).

Para que se chegue ao consenso de forma natural, torna-se necessário o desacordo, não como temor de coerção, mas que prevaleça a decisão tomada pelo coletivo e se sobreponha aos interesses individuais, dentro de princípios democráticos (1). A dificuldade é que quando há uma distribuição desigual de poder entre os atores, persiste a tendência de se favorecer alguns em detrimento de outros (22).

Outros jogos e atores que afetam o jogo produzido na CIR

Como visto, o jogo social na CIR mesmo com todos os problemas apontados vêm sendo jogado. No entanto, este jogo pode ser afetado por outros jogos e por outros atores com poder para interferir e modificar as decisões tomadas na CIR sobre a região de saúde. Isso aponta para as lutas de poder que estarão sempre presentes no contexto da gestão federativa.

Um dos jogos que emergiu foi o jogo político. Neste jogo o prefeito é um ator importante no contexto da gestão federativa, que às vezes subjuga uma decisão da CIR tomada pelo próprio SMS de seu município. No jogo político, cabe ao prefeito a indicação do ocupante do cargo de secretário, “a regional de saúde sugere [o SMS], mas quem define é o prefeito, ele acomoda quem o ajudou na campanha [eleitoral], então, nós da regional temos que respeitar sua decisão” (E5). Neste contexto “os secretários ainda têm muita dificuldade porque, por mais que queiram fazer, tem toda uma outra ação [política] por trás que, às vezes impede (E2)”.

No entendimento de Miranda (23), a relação de confiança (informal) do gestor diante da autoridade política do prefeito (formal) faz com que a autonomia e o poder de decisão do gestor estejam limitados à margem política do prefeito. Para Santos e Giovanella (24), a baixa autonomia dos secretários de saúde diante do poder do executivo municipal (prefeito) é um dificultador para a concretização das decisões da CIR. Às vezes, o prefeito utilizando-se de seu poder político desconsidera o jogo da CIR, demonstrado quando “o prefeito leva um pleito direto para o secretário de estado da saúde e/ou governador” (E5), sem passar pela CIR. Essa prática existe porque persevera “a questão da cultura política, que está acima da lei, do bem e do mal” (E2). Com base nos estilos de fazer política propostos por Matus (11), a realidade parece estar impregnada do estilo Maquiavel de fazer política, com uma dose de estilo Chimpanzé e praticamente nada do estilo Gandhi. Ou seja, na realidade estudada, governantes tomam decisões que, muitas vezes, não atendem às necessidades do cidadão. Portanto, o ator com poder político, em muitos casos, subordina outros atores para conseguir defender o seu projeto, uma prática autoritária que, na atual conjuntura política brasileira, parece que nunca mudará.

O cidadão que luta pelo direito sanitário deve se incomodar com essa realidade perversa; é preciso que seja construída uma intencionalidade coletiva que lute para transformar o existente. Sobre isso, Matus (7) afirma que na sociedade criam-se leis, regras que, em geral, não podem ser modificadas por um homem, mas somente pela força da intencionalidade coletiva. Esse modo de atuar tem uma maior chance de enfrentar um poder que atua contra o bem-estar da sociedade.

O jogo econômico, cujo ator de destaque é representado pelo prestador privado hospitalar no âmbito do SUS, é outro jogo que afeta muito as decisões do jogo na CIR. Nesse espaço são pactuadas as RAS, com definição das responsabilidades de cada ponto de atenção, especialmente o que os hospitais precisam atender. No entanto, as pactuações e decisões das CIR não são respeitadas pelos prestadores hospitalares, tendo em vista que:

“às vezes o prestador fala que vai fazer e não faz e o município fica a mercê disso” (E3); “ficamos na mão do hospital” (GF1F); “eles [hospital] não queriam receber o paciente, tivemos que chamar a polícia para receber” (GF4A); “entra com um cheque [dinheiro] na mão que eu atendo, senão não atendo. Esses internamentos extrapolados, eles não são somados, entende? Eles ficam esquecidos, o município paga e vai para a gaveta” (GF1A).

Isso demonstra a permanência de um cenário complexo na relação público-privado, que muitas vezes já foi denunciado e que tem provocado dificuldades no acesso da população aos serviços hospitalares na rede SUS. O processo permanece “desumano” e as práticas, ao invés de evitar o sofrimento das pessoas até o aumentam (25). Problemas com as cobranças indiretas do atendimento no âmbito do SUS praticamente não têm sido enfrentados (26).

Uma das propostas que surgiu neste estudo para enfrentar a problemática foi “fazer uma auditoria para ver onde estão indo os recursos, como é usado o dinheiro do convênio hospitalar” (GF4C). Isso se deve, segundo Pó (27), a não existir, no setor saúde, modelos amadurecidos de regulação dos serviços, tanto públicos como privados. Há muitas limitações para que seja realizada uma regulação adequada, pois regras não estão bem definidas no âmbito dos serviços públicos e na parte operacional existem muitos problemas, um deles relacionado à fiscalização dos contratos (28).

Outro jogo que tem afetado a construção do SUS e, consequentemente, altera o jogo da CIR, é o jogo da comunicação, representado pela mídia, que atua de forma a desqualificar os serviços oferecidos no âmbito do SUS, como exemplifica o discurso:

“A saúde está uma porcaria. Por quê? Porque ouviu falar na mídia. Os profissionais da imprensa são os mais difíceis hoje que estão dentro na área da saúde. (...). Então essa é uma angústia que vivemos e precisamos discutir dentro da CIR. Precisamos mudar essa visão da sociedade” (GF2C).

Mas mudar a compreensão da sociedade sobre o SUS é um processo muito complexo. Na perspectiva apresentada por Campos (29) os obstáculos enfrentados com grupos humanos para produzir mudanças não são racionais, estão alicerçados no simbólico, porque há uma inseparabilidade do agir racional com o processo subjetivo das pessoas. O simbólico hegemônico tem sido o SUS “não presta”, portanto é para pobres e a assistência privada “tem qualidade”, assim é para os ricos. Nesse contexto a pessoa precisa ser respeitada no âmbito do SUS dentro de sua subjetividade, particularidade, desejo, para passar a experimentar ações e serviços de saúde que resolvam os seus problemas. Isso poderá ajudar a mudar sua percepção sobre o SUS, valorizando-o.

Diante dos achados, percebe-se que no campo da gestão federativa regional, não basta criar um espaço, a CIR, na região de saúde para que os atores joguem o jogo, é preciso que haja uma hegemonia da intencionalidade dos atores a favor do SUS, do direito à saúde dos cidadãos, em todos os jogos sociais.

Considerações finais

Apesar deste estudo ter sido desenvolvido em uma macrorregião de saúde de um estado da federação do Brasil, apresentou resultados que permitem a compreensão dos elementos que dificultam o exercício da gestão federativa no âmbito de um Sistema de Saúde.

A participação dos gestores municipais não se mostrou efetiva, embora os entrevistados da gestão municipal fossem seus representantes legítimos. Isso ocorreu devido a baixa capacidade de comunicação e poder de argumentação, além da alta rotatividade e despreparo de muitos gestores. Outro fator que contribui para a baixa efetividade é que no jogo da CIR prevaleceu a informalidade, e as regras formais eram desconsideradas ou até desconhecidas por uma parcela significativa dos envolvidos. A intencionalidade de cada ator ou grupo de atores foram determinantes na dinâmica da CIR.

Atores como: trabalhadores de saúde dos municípios e das regionais de saúde, apoiadores do COSEMS, atores do Ministério da Saúde, apesar de não integrarem oficialmente a CIR, influenciaram o jogo social neste espaço. Assim, mesmo não atuando diretamente na CIR, possuíam poder para que seus interesses prevalecessem nas decisões e pactuações, pois, o poder que permeia as interrelações está alicerçado em várias determinações e não somente na formalidade da posição do ator no jogo. Isso aponta para as lutas de poder que estarão sempre presentes no contexto da gestão federativa.

Outros jogos estiveram presentes na CIR, com destaque para o político, econômico e da comunicação. No jogo político o SMS tem sua autonomia e poder de decisão limitado à margem política do prefeito municipal, muitas vezes sendo desconsideradas suas decisões no âmbito da CIR. No jogo econômico, prevaleceu a existência de um complexo cenário na relação entre os setores público-privado, permeado por favorecimentos e irregularidades, em que o frágil sistema regulatório não favorece o enfrentamento desse problema. E no jogo da comunicação, a mídia atua na desqualificação do projeto do SUS.

A forma como tem se produzido o jogo na CIR e a postura dos atores envolvidos, sinalizam a predominância do estilo Maquiavel de fazer política, com traços do estilo Chimpanzé. Em poucas situações transpareceram o estilo Gandhi, em que o diálogo e a negociação cooperativa se deram para a construção de uma gestão federativa que atendesse às necessidades da região.

Conclui-se que a CIR é um importante espaço de formação de gestores para que exerçam seu papel na condução de uma gestão federativa que atenda os interesses de todos os entes. Além disso, como o jogo da CIR é recente no âmbito da gestão federativa, pode ser que com o passar do tempo as acumulações dos atores modifiquem a realidade deste jogo social.

Desta forma, recomenda-se que seja objetos de futuros estudos, a dinâmica de outros colegiados, bem como o papel dos diferentes atores que atuam direta ou indiretamente na gestão federativa.

Referencias

1. Dourado DA, Elias PEM. Regionalização e dinâmica política do federalismo sanitário brasileiro. Rev. Saúde Pública. 2011;45(1):204-211.

2. Brasil, Ministério da Saúde. Lei n. 8080, de 19 de setembro de 1990. Gestão Municipal da Saúde: leis, normas e portarias atuais. Rio de Janeiro: Ministério da Saúde; 2001.

3. Brasil, Ministério da Saúde. Decreto n. 7508, de 28 de junho de 2011. Regulamenta a Lei n. 8080, de 19 de setembro de 1990, para dispor sobre a organização do Sistema Único de Saúde - SUS, o planejamento da saúde, a assistência à saúde e a articulação interfederativa, e dá outras providências [Internet]. Diário Oficial da União. 2011 jun. 28. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Decreto/D7508.htm

4. Vasconcelos CM, Pasche DF. O Sistema Único de Saúde. São Paulo: Hucitec; 2006. Cap. Tratado de saúde coletiva; pp. 531-562.

5. Carvalho G. A saúde pública no Brasil. Estud. Av. 2013;27(78):7-26.

6. Santos L. Sistema Único de Saúde: os desafios da gestão interfederativa. Campinas (Brasil): Saberes Editora; 2013

7. Matus C. Teoria do jogo social. São Paulo: Fundap; 2005.

8. Zambrano K. Teoria do Jogo Social. São Paulo: Fundap; 2005. Prefácio; pp. 9-15.

9. Lima JC. Teoria do jogo social. Ciênc. Saúde Coletiva. 2010 ag;15(5):2647-2648.

10. Huertas F. O método PES: entrevista com Matus. São Paulo: Fundap; 1996.

11. Matus C. Estratégias políticas: Chimpanzé, Maquiavel e Gandhi. São Paulo: Fundap; 2007.

12. Minayo, MCS. Análise qualitativa: teoria, passos e fidedignidade. Ciênc. Saúde Coletiva. 2012;17(3):621-626.

13. Ricouer P. Do texto à acção: ensaios de hermenêutica II. Oporto (Portugal): Rés-Editora; 1989.

14. Organização Pan-Americana da Saúde. A atenção à saúde coordenada pela APS: construindo as redes de atenção no SUS: contribuições para o debate. Brasília: Opas; 2011.

15. Delziovo CR. Colegiado de Gestão Regional desafios e perspectivas: relato de experiência. Saúde e Transformação Social. 2012 jan;3(1):102-105.

16. Cecílio LCO. Apontamentos teórico-conceituais sobre processos avaliativos considerando as múltiplas dimensões da gestão do cuidado em saúde. Interface Comum. Saúde Educ. 2011 abr;15(37):589-599.

17. Santos NR. Política pública de saúde no Brasil: encruzilhada, buscas e escolhas de rumos. Ciênc. Saúde Coletiva. 2008;13(sup 2):2009-2018.

18. Domingos CM, Nunes EFPA, Carvalho BG, Mendonça FF. A legislação da atenção básica do Sistema Único de Saúde: uma análise documental. Cad. Saúde Pública [Internet]. 2016 mar. 22;32(3):e00181314. Disponível em: https://www.doi.org/10.1590/0102-311X00181314

19. Santos L, Andrade LOM. SUS: o espaço da gestão inovada e dos consensos interfederativo: aspectos jurídicos, administrativos e financeiros. Campinas (Brasil): Saberes Editora; 2009.

20. Abrucio FLA. Coordenação federativa no Brasil: a experiência do período FHC e os desafios do Governo Lula. Rev. Sociol. Polít. 2005;24:41-67.

21. Mesquita RMS. Consensos da Comissão Intergestores Regional para a organização do sistema regional de saúde [Dissertação]. Fortaleza: Universidade de Fortaleza; 2011.

22. Fleury S. Reforma sanitária brasileira: dilemas entre o instituinte e o instituído. Ciênc. Saúde Coletiva. 2009;14(3):743-752.

23. Miranda AS. Análise estratégica dos arranjos decisórios na Comissão Intergestores Tripartite do Sistema Único de Saúde [Tese]. Salvador: Instituto de Saúde Coletiva, Universidade Federal da Bahia; 2003.

24. Santos AM, Giovanella L. Governança regional: estratégias e disputas para gestão em saúde. Rev. Saúde Pública. 2014;48(4):622-631.

25. Mattos RA. Princípios do Sistema Único de Saúde (SUS) e a humanização das práticas de saúde. Interface Comum. Saúde Educ. 2009;3(sup 1):771-780

26. Bahia L. Afinidades comunicativas e as políticas de saúde no Brasil Ciênc. Saúde Coletiva. 2010;15(5):2281-2282.

27. Pó M. Institucionalidade e desafios da regulação na área de saúde no Brasil. Rio de Janeiro: Cebes; 2010. Cap. Gestão Pública e Relação Público Privado na Saúde; pp. 243-266.

28. Menicucci TMG. O Sistema Único de Saúde, 20 anos: balanço e perspectivas. Cad. Saúde Pública. 2009;25(7):1620-1625.

29. Campos RO. Planejamento em saúde: a armadilha da dicotomia público-privado. Rio de Janeiro: Cebes; 2010. Cap. Gestão Pública e Relação Público Privado na Saúde; pp. 197-207.

Notas

* Artigo de pesquisa

Autor notes

a Autora correspondente. Correio electrónico: brigidagimenez@gmail.com

Informação adicional

Como citar este artigo: : Carvalho BG, Nicoletto SCS, Nunes EFPA. O Jogo Social dos atores na Gestão Federativa em Saúde. Revista Gerencia y Políticas de Salud. 2019;18(37). https://doi.org/10.11144/Javeriana.rgps18-37.ojsa

Contexto
Descargar
Todas