Desafios na aplicabilidade dos modelos ontológicos de competências gerenciais em saúde: uma scoping review*

Desafíos en la aplicabilidad de modelos ontológicos de competencias gerenciales en salud: una scoping review

Challenges in the applicability of ontological models of managerial competences in health: A scoping review

Danielle Borges Fogliatto , Aida Maris Peres , Marli Aparecida Rocha de Souza , Leticia Mara Peres , Judith Lapierre

Desafios na aplicabilidade dos modelos ontológicos de competências gerenciais em saúde: uma scoping review*

Revista Gerencia y Políticas de Salud, vol. 22, 2023

Pontificia Universidad Javeriana

Danielle Borges Fogliatto a

Universidade Federal do Paraná, Brasil


Aida Maris Peres

Universidade Federal do Paraná, Brasil


Marli Aparecida Rocha de Souza

Universidade Federal do Paraná, Brasil


Leticia Mara Peres

Universidade Federal do Paraná, Brasil


Judith Lapierre

Faculte des Sciences Infirmieres, Canadá


Recepção: 21 Setembro 2022

Aprovação: 19 Maio 2023

Resumo: Objetivo: identificar os desafios na aplicabilidade dos modelos ontológicos que representem relações e elementos de competências de gestão em saúde. Métodos: trata-se de uma scoping review, conforme Joanna Briggs Institute (JBI), cuja questão norteadora foi “Quais são os desafios na aplicabilidade dos modelos ontológicos que representam as competências gerenciais em saúde descritas na literatura?”. Foram incluídos estudos nacionais e internacionais, em inglês, português e espanhol, no período de 2015 a 2020. Resultados: a estratégia de busca foi aplicada em oito bases de dados, sendo encontrados 2.024 artigos e selecionados 8 como amostra final. Os estudos destacaram as seguintes dificuldades nesse referencial teórico: interpretação de dados complexos, heterogêneos e dispersos por parte dos gestores de saúde, deficiência de automação de monitoramento dos pacientes, falta de treinamento de gestores de saúde, distribuição de tarefas e carga horária de trabalho inadequadas da equipe de enfermagem e, ainda, deficiência na tomada de decisão compartilhada entre os profissionais de saúde e o paciente. Conclusões: a aplicação de modelos ontológicos em sistemas de gestão em saúde resultou em otimização do tempo, integração dos dados e melhor tomada de decisão gerencial de modo a auxiliar positivamente o trabalho dos profissionais e gestores de saúde.

Palavras-chave:gestão em saúde, modelos ontológicos, capacidade de gestão, planejamento em saúde, avaliação em saúde.

Resumen: Objetivo: identificar los retos en la aplicabilidad de modelos ontológicos que representen relaciones y elementos de competencias gerenciales en salud. Métodos: scoping review, según el Joanna Briggs Institute (JBI), cuya pregunta orientadora fue: “¿Cuáles son los retos en la aplicabilidad de los modelos ontológicos que representan las competencias gerenciales en salud descritas en la literatura?”. Se incluyeron estudios nacionales e internacionales, en inglés, portugués y español, de 2015 a 2020. Resultados: la estrategia de búsqueda se aplicó en ocho bases de datos, con 2.024 artículos encontrados y 8 seleccionados como muestra final. Los estudios destacaron las siguientes dificultades en ese marco teórico: interpretación de datos complejos, heterogéneos y dispersos por parte de los gestores de salud, falta de automatización del seguimiento del paciente, falta de formación de los gestores de salud, inadecuadas distribución de tareas y carga de trabajo del equipo de enfermería, y deficiencia en la toma de decisiones compartida entre los profesionales de la salud y el paciente. Conclusiones: la aplicación de modelos ontológicos en los sistemas de gestión en salud resultó en la optimización del tiempo, la integración de datos y una mejor toma de decisiones gerenciales para auxiliar positivamente el trabajo de los profesionales y gestores de la salud.

Palabras clave: gestión en salud, modelos ontológicos, capacidad de gestión, planificación en salud, evaluación en salud.

Abstract: Objective: Identify challenges in the applicability of ontological models that represent relationships and elements of health management competencies. Methods: Scoping Review, according to Joanna Briggs Institute (JBI) and the guiding question: “What are the challenges in the applicability of ontological models that represent the health management competencies described in health in the literature?”. Included national and international studies, English, Portuguese and Spanish, in the time span of 2015 to 2020. Results: The search strategy was applied in eight databases; 2024 articles were found and eight were selected as the final sample. The studies highlighted the following difficulties in this theoretical framework: interpretation of complex, heterogeneous and dispersed data by health managers, lack of automation in patient monitoring, lack of training of health managers, inadequate task distribution and workload of the nursing team and also, deficiency in decision-making shared between health professionals and the patient. Conclusions: The application of ontological models in health management systems resulted in time optimization, data integration and better management decision-making in order to positively help the work of health professionals and managers.

Keywords: Health Management, Ontological Models, Management Capacity, Health Planning, Health Evaluation.

Introdução

A gestão em saúde consiste em atividades intensivas de cooperação, administração, planejamento, organização, direção e controle dos sistemas públicos e privados, sendo essas funções espacial e funcionalmente distribuídas entre os profissionais de saúde, a fim de obter melhores resultados nos serviços prestados. A distribuição de tarefas requer a colaboração de médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, psicólogos, gerentes e pacientes, em que cada um possui diferentes conhecimentos e responsabilidades (1).

Nesse contexto, o papel do gestor em saúde vai muito além da função de executar a política pública de saúde. Para atuar nessa área, é preciso o desenvolvimento de competências de gestão, que se estendem desde a gestão de custos até a gestão de conflitos, incluindo habilidades em conciliar interesses das partes envolvidas, estar preparado para as constantes mudanças existentes na área da saúde e, ainda, ter a capacidade de determinar quais membros da equipe têm as competências adequadas para executar determinada tarefa (2).

Por um lado, as unidades de atendimento de saúde enfrentam diversos problemas, como a dificuldade de acesso ao serviço, o tempo de espera por atendimento, a falta de leitos, os recursos ineficientes e, principalmente, a deficiência na gestão em saúde. Por outro, os gestores respondem a desafios associados ao crescimento dos gastos com saúde, à ineficiência em sistemas de saúde, a medicamentos não otimizados (3), entretanto muitas dessas adversidades podem estar relacionadas à falta de automação nos processos, impedindo que as instituições alcancem produtividade e eficiência.

Dessa forma, pesquisadores estudam formas de redesenhar o padrão tradicional do sistema médico, a partir de uma estrutura ontológica de gestão em saúde (4). Os modelos ontológicos definem-se com uma estratégia explícita para definir conceitos utilizados na construção de sistemas avançados e inteligentes, simplificando a troca de informações e conhecimento, em um determinado domínio (5). Em outras palavras, a ontologia é uma abordagem que relaciona um conjunto de conceitos em um campo de interesse. No contexto deste estudo, os modelos ontológicos na área da saúde podem contribuir para a padronização e simplificação de informações dos pacientes, otimizando o trabalho da equipe de enfermagem e, consequentemente, elevando a excelência do serviço prestado, tudo isso através da associação da saúde com a tecnologias de informação e comunicação (TIC).

A partir do momento que os serviços de saúde estiverem em concordância com as TIC, será possível propor novos planos de gestão para padronizar os sistemas, reduzir custos, otimizar o uso de recursos e melhorar a qualidade do serviço de saúde (6). Isso porque a ontologia fornece padrões de informação que trazem subsídios não somente para a tomada de decisão entre os profissionais de saúde, mas também para a criação de políticas públicas (7). Além disso, a informática em saúde pode implementar um suporte à decisão centrada no paciente, ou seja, o uso da ontologia em um sistema pode auxiliar o doente na compreensão do contexto clínico e, assim, juntamente com a equipe de saúde, na tomada de decisão compartilhada formalizada (8).

Dessa forma, apropriar-se das competências gerenciais é basilar para o líder desenvolver a capacidade de planejar, implementar e avaliar os modelos ontológicos mais adequados para os serviços de saúde, com vistas aos avanços mandatórios. Assim, em virtude de os modelos ontológicos ainda serem escassos nos ambientes de saúde, faz-se necessário compreender melhor como as TIC podem beneficiar o trabalho dos líderes de saúde, considerando os reveses possíveis na união desses dois campos específicos. Nesse sentido, este estudo tem como objetivo identificar os desafios na aplicabilidade dos modelos ontológicos que representem relações e elementos de competências de gestão em saúde.

Métodos

Estudo realizado por meio de uma das propostas do Joanna Briggs Institute (JBI) chamada “scoping review”. Trata-se de um método de revisão de escopo que busca responder a uma ou mais questões. O estudo seguiu as seguintes etapas: formulação da pergunta de pesquisa, critérios de inclusão, especificação do método de seleção dos estudos, procedimento de extração dos dados, análise e avaliação dos estudos incluídos na scoping review, extração dos dados e apresentação da síntese do conhecimento produzido e publicado (9).

Com esse enfoque, a construção da questão norteadora desta revisão foi realizada por meio da estratégia population, concept e context (PCC) para uma scoping review. Essa estratégia é muito utilizada para esse tipo de revisão e especifica a base sobre a qual as fontes foram consideradas para a inclusão no trabalho. Dessa forma, a “população” deve estar relacionada aos objetivos da scoping review; o “conceito” diz respeito aos fenômenos de interesse na revisão e o “contexto” pode abranger detalhes sobre um cenário específico ou uma fonte em que os resultados foram encontrados (9). Assim, nesta revisão, foram definidos: P — relações e elementos das competências gerenciais, C — modelos ontológicos e C — literatura científica. Nesse sentido, foi estabelecida a seguinte questão norteadora: “Quais são os desafios na aplicabilidade dos modelos ontológicos que representam as competências gerenciais em saúde descritas na literatura?”.

Incluíram-se estudos nacionais e internacionais em inglês, português ou espanhol, de 2015 a 2020. O período de cinco anos foi escolhido na busca de evidências atuais relacionadas ao contexto do estudo. Os critérios de exclusão foram estudos com temática do título e do resumo que não tivesse referência à questão de revisão, artigos com o texto incompleto, estudos que não estavam nos idiomas selecionados e textos advindos de literatura cinzenta.

Quanto à estratégia de busca, as bases de dados e as fontes de informações utilizadas foram Cumulative Index to Nursing and Allied Health Literature (Cinahl), Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (Lilacs), National Library of Medicine (PubMed), Scopus, Embase Search Results (Embase), Web of Science (WoS), Biblioteca Virtual em Saúde (BVS) e Scientific Electronic Library Online (SciELO). Os descritores selecionados e sinônimos estão de acordo com os Descritores em Ciências da Saúde (DeCS) e dos Medical Subject Headings (MeSH). Para a combinação dos descritores e para a busca nas referidas bases de dados e plataformas de pesquisa, foram considerados os operadores booleanos “AND” e “OR”.

A estratégia de busca aplicada no trabalho foi a mesma para todas as bases de dados e dois revisores realizaram a busca em janeiro de 2020, no intuito de ampliar a eficácia e a viabilidade na identificação e na seleção dos estudos. Estão reunidos termos relacionados à gestão em saúde (administração de serviços de saúde; gestão em saúde; gestor de saúde) e termos relacionados à ontologia/ontologia biológica, conforme pode ser observado na Tabela 1. Por se tratar da relação entre modelos ontológicos e gestão em saúde, ressalta-se que a revisão explorou termos relacionados à ontologia/ontologia biológica a fim de ampliar a busca de artigos, visto que existem poucos descritores referentes a esses termos na plataforma de busca dos DeCS e dos MeSH.

Os dados dos estudos selecionados foram extraídos por meio de um instrumento estruturado, o qual contemplou bases de dados, título do artigo, país, idioma, autores, tipo de estudo, ano de publicação, objetivos, local do estudo e conclusões. Para as análises, os dados foram agrupados através do editor de planilhas Microsoft Excel Office 2019.

Tabela 1
Representação da estratégia de busca aplicada em todas as bases de dados utilizadas no estudo
Representação da estratégia de busca aplicada em todas as bases de dados utilizadas no estudo


Fonte: elaboração própria.

Resultados

A busca resultou em 2.024 artigos selecionados dentro do período determinado. Destes, 94 foram descartados por estarem duplicados em outras fontes, 27 por estarem duplicados na mesma base de dados, 29 por estarem em outro idioma diferente do inglês, do espanhol ou do português, restando 1.874 para a leitura de título e resumo. Nessa nova etapa, 4 foram excluídos por não apresentarem o texto completo e 1.859 por não constar no título e no resumo relação com a temática da questão de revisão, o que resultou um total de 11 artigos para a leitura na íntegra, dos quais 3 foram descartados por não abordarem o tema no texto, resultando 8 artigos.

Ressalta-se que os estudos selecionados foram os que tinham enfoque na relação entre modelos ontológicos e competências gerenciais em saúde, independentemente de ser o serviço de atenção primária, secundária ou terciária. Entretanto, após a seleção e a análise dos artigos, destaca-se que a amostra final contemplou majoritariamente o serviço hospitalar.

Para a busca e seleção das evidências científicas e para nortear o estudo, foi utilizada a ferramenta Preferred Reporting Items for Systematic reviews and Meta-Analyses extension for Scoping Reviews (Prisma-ScR), a qual está apresentada na Figura 1. Trata-se de uma ferramenta de revisão que tem como objetivo principal orientar os pesquisadores no registro do processo de revisões (10).

Processo de seleção dos artigos nas bases de dados, adaptados do Prisma-ScR
Figura 1
Processo de seleção dos artigos nas bases de dados, adaptados do Prisma-ScR


Fonte: adaptado do Prisma-ScR (10).

Nesta revisão, os oito estudos selecionados (100%) estão distribuídos entre 2015 e 2020. Destes, ressaltam-se três publicações do Canadá (37,5%), uma do Brasil (12,5%), uma da China (12,5%), uma da Romênia (12,5%), uma da Grécia (12,5%) e uma da Bélgica (12,5%). Com relação aos anos de publicação dos artigos, 12,5% deles são de 2016; 25%, de 2017; 37,5%, de 2018; 25%, de 2019 e 12,5%, de 2020. A caracterização quanto a título do artigo, autoria, método, base de dados, ano e país de publicação está descrita na Tabela 2, sendo os estudos enumerados de 1 a 8.

Tabela 2
Caracterização dos estudos selecionados quanto a título do artigo, autoria, método, base de dados, ano e país de publicação
Caracterização dos estudos selecionados quanto a título do artigo, autoria, método, base de dados, ano e país de publicação







Fonte: elaboração própria

Com relação aos profissionais envolvidos, aos objetivos, aos resultados e às conclusões dos estudos, cada qual possui uma especificidade, devidamente apresentada na Tabela 3. Entretanto, de modo geral, todos buscam propor um modelo de gestão em saúde automatizado a partir da implementação de uma estrutura ontológica, a fim de otimizar o uso de recursos e, consequentemente, melhorar a qualidade do serviço de saúde.

Tabela 3
Profissionais envolvidos, objetivos principais, resultados encontrados e conclusões nos oito estudos
Profissionais envolvidos, objetivos principais, resultados encontrados e conclusões nos oito estudos












Fonte: elaboração própria.

Após a análise das dificuldades abordadas nos estudos e suas respectivas propostas, a Tabela 4 apresenta as semelhanças e as diferenças temáticas entre os artigos.

Tabela 4
Desafios e propostas de modelos ontológicos
Desafios e propostas de modelos ontológicos


Fonte: elaboração própria.

Discussão

Após a análise dos estudos, ficou evidente a importância da ontologia para o gerenciamento em saúde. A partir de um modelo ontológico, propõe-se a otimização do tempo e dos recursos por meio da automação do monitoramento de dados (2), sendo possível preencher algumas lacunas existentes no sistema de saúde atual. Nesse aspecto, destacam-se algumas características importantes nos artigos e, dessa forma, são discutidas as seguintes categorias: a presença majoritária do médico nos estudos, a complexidade da interpretação de dados médicos, a importância da automação do monitoramento de pacientes, a falta de treinamento de gestores em saúde, a distribuição inadequada das tarefas e da carga horária dos profissionais de saúde; e, ainda, a dificuldade em tomar uma decisão compartilhada em um caso clínico.

É fato que a medicina é uma das profissões mais antigas da área da saúde e, ao longo do tempo, a atividade médica vem se revolucionando juntamente com o desenvolvimento das tecnologias. Na segunda metade do século 19, surgiu a necessidade de realizar classificações de doenças, que inicialmente buscavam organizar as causas de morte. Com o avançar do século 20, a quantidade de informações médicas ou administrativas que necessariamente precisavam ser gerenciadas no contexto clínico impulsionou o desenvolvimento de terminologias e sistemas classificatórios mais elaborados. Dessa forma, surgiu uma diversidade de instrumentos da informação como terminologias, vocabulários, vocabulários controlados, classificações e ontologias. Tais instrumentos objetivam identificar doenças, procedimentos médicos, indexar literatura, entre outros. Com a recente evolução tecnológica, todos os instrumentos foram sendo adequados à nova realidade constituída por ferramentas digitais e eletrônicas, dando início às ontologias na medicina e, posteriormente, em outras profissões da saúde. Assim, além de essas ferramentas conectarem terminologias a ontologias fundamentadas, privilegiam termos próprios para reduzir sua ambiguidade e mitigar a falta de interoperabilidade semântica entre sistemas de informação (11).

Nesta pesquisa, três estudos (1, 2, 6) destacaram o número crescente de termos e abreviações usados na área da saúde, e que geram uma grande dificuldade para os profissionais em interpretar dados nos sistemas de informação em saúde. Isso ocorre devido à falta de integração e padronização entre as plataformas de gerenciamento de dados (2), o que torna o sistema de comunicação ainda mais precário (6). Para solucionar o problema, os artigos apresentam plataformas inteligentes, capazes de integrar, padronizar e unificar um número significativo de dados médicos, com a utilização de uma estrutura ontológica. A partir de uma ontologia, é possível definir conceitos e terminologias mais utilizados no sistema de saúde de referência médica (6), bem como integrar múltiplas fontes e dados heterogêneos; assim, permitir que os gestores tenham compreensão e capacidade de análise geral dos dados de todos os sistemas de saúde (1).

Superar as fraquezas e as ineficiências de interoperabilidade que normalmente são encontradas em sistemas de informação médica (4) não é o suficiente para se ter um sistema de comunicação totalmente eficaz. Além da padronização de dados médicos para reduzir a complexidade de sua interpretação, é preciso automatizar esses mesmos dados, a fim de ter um eficiente monitoramento do paciente. Sobre isso, um dos artigos (5) fornece uma infraestrutura ontológica de monitoramento inteligente para observar e controlar o comportamento dos parâmetros fisiológicos e do ambiente circundante no qual o paciente se encontra, utilizando biomarcadores personalizados, que detectam quaisquer mudanças e as transmitem para os sistemas de informação, por meio de agentes móveis. Ao contrário dos sistemas convencionais, esse estudo (5) apresenta uma nova visão da telemedicina que permite ao profissional de saúde manter o controle das condições físicas dos pacientes, sugerir recomendações e realizar intervenções em tempo hábil.

A integração de dados médicos e um monitoramento automatizado dos pacientes são medidas importantes que contribuem para o trabalho dos profissionais de saúde. Entretanto, fazem-se necessários gestores capacitados para o gerenciamento dessa equipe. Um dos estudos (3) aborda a necessidade de treinar os responsáveis pela gestão de recursos humanos em um hospital universitário, no intuito de verificar e atualizar conhecimentos exigidos de acordo com a posição profissional, o perfil, o estilo de aprendizagem e as expectativas. Para esse treinamento, foi proposto o uso do sistema de e-learning que utiliza tecnologias semânticas e ontologias para analisar o perfil dos gestores e seus domínios. Desse modo, o processo de ensino é estabelecido com foco no conhecimento necessário para o exercício da função estabelecida. Esse mesmo estudo apresentou uma forma eficaz de treinamento personalizado para os gestores de saúde, contribuindo para aumentar o desempenho e as competências com relação à avaliação do paciente.

Com a qualificação desses profissionais, o que se espera é que sejam capazes de distribuir adequadamente as tarefas e as respectivas cargas horárias de quem compõe suas equipes. Muitos desses profissionais, como os enfermeiros, possuem uma sobrecarga de serviço e tentam trabalhar da forma mais eficiente possível. No estabelecimento de uma rotina, priorizam atividade e delegam tarefas entre os colegas de trabalho. Com esse enfoque, um dos estudos (7) apresenta uma plataforma inteligente de gerenciamento de tarefas, a partir de informações capturadas na ontologia de cuidado contínuo, que visa oferecer e avaliar vários recursos, como delegação de tarefas, atribuição de prioridade dinâmica de acordo com o contexto atual, desempenho de cada profissional, escalabilidade, facilidade de acesso, confiabilidade, adaptabilidade com mudanças internas e externas, e, ainda, confiança sobre os dados médicos.

A plataforma sugerida trabalha de forma a priorizar e atribuir tarefas aos profissionais de saúde, a partir de quatro etapas: avaliar a prioridade da tarefa, determinar as competências necessárias para a execução, filtrar os possíveis profissionais qualificados para tanto e escolher um deles para atribuir a tarefa, na busca de que os cuidadores alcancem uma carga de trabalho equilibrada. Contexto que também permite aos profissionais monitorar facilmente sua carga de trabalho, reatribuir tarefas automaticamente, acompanhar tarefas que lhes foram atribuídas e ordenar tarefas de acordo com sua preferência.

Outro fato evidenciado nos estudos foi que, além da integração e padronização de dados médicos, automação do monitoramento de pacientes, treinamento de gestores e distribuição adequada de tarefas, é preciso construir um eficiente sistema de apoio à decisão clínica perante uma enfermidade. É evidente que, em um eventual caso clínico, é essencial uma equipe de assistência multiprofissional no atendimento ao paciente. Entretanto, só isso não basta (8): a comunicação é uma habilidade esperada no gestor, pois entende-se que, por meio dela, obtém informações para a tomada de decisão. Essa característica, definida como a troca de informações entre as pessoas, visa promover e articular a participação individual e coletiva, de acordo com as necessidades, mediante a disseminação e produção de dados e conhecimento. A troca de experiências e boas práticas são repassadas por meio da comunicação, bem como a possibilidade de assegurar a participação de todos os indivíduos na resolução de problemas e planejamento, além de promover a motivação, a cooperação e um espírito de trabalho em equipe. Dessa forma, para a comunicação ser afetiva, é preciso garantir informações em tempo hábil, realizar plano de ação e tomar decisões assertivas. Entretanto, observa-se que os gestores vivenciam problemas no processo de comunicação da prática clínica como dificuldade de interlocução entre os saberes, conflitos éticos e problemas nas relações interpessoais (12).

As chamadas “decisões clínicas compartilhadas” são baseadas em dados e evidências científicos que envolvem toda uma equipe de atendimento, incluindo o médico (responsável pela decisão final sobre o caso), um ou mais profissionais de consultoria com diferentes especialidades (enfermeiros, fisioterapeutas, psicólogos, entre outros), o paciente e, ainda, um membro da família. Para efetivar esse processo, utilizou-se de uma estrutura ontológica que define e descreve formalmente os principais conceitos e domínios de tomada de decisão compartilhada, estabelecendo as bases para a formalização e o suporte para o processo de cuidado. Assim, a tomada de decisão compartilhada promove o envolvimento ativo de um paciente em um processo, no qual o médico apresenta evidências, informações e opções de tratamento, considerando os valores e preferências do paciente (8).

Outra realidade que demonstra a importância da aplicabilidade dos modelos ontológicos é o atendimento de pessoas com deficiência, contexto que apresenta dificuldades no que diz respeito à prestação de cuidados a esses pacientes. Dessa forma, um estudo de 2020 apresentou modelos ontológicos que representam relações semânticas entre conceitos, podendo fornecer uma base sólida para desenvolver sistemas de informação e aplicações que atendam às necessidades específicas das pessoas com deficiência. Isso pode ter um impacto significativo na melhoria dos serviços, na promoção da inclusão e no avanço das tecnologias voltadas para essa população (13).

Apesar de os estudos apresentarem vários modelos ontológicos voltados para a competência de gestão em saúde, a aplicabilidade desse instrumento na prática clínica dos profissionais de saúde é questionável, pois, para efetivar essa ação, outras condições precisam estar em consonância. Como empecilhos para essa aplicabilidade, citam-se a escassez de tecnologias nos ambientes de cuidado, a falta de uma educação permanente em saúde, a sobrecarga de trabalho dos profissionais, a estrutura de serviço precária, a falta de insumos e materiais permanentes, entre outros. Dessa forma, é necessário melhorar e aperfeiçoar alguns aspectos do serviço de saúde, por meio do trabalho coletivo da gestão, da assistência, da docência e da pesquisa a fim de colocar em prática as ontologias apresentadas nos estudos, visto que a pesquisa comprovou teoricamente o resultado positivo quanto à aplicabilidade de ontologias em vários contextos no sistema de saúde. No entanto, há uma lacuna evidente vinculada a essa temática, principalmente referente à eficácia da aplicabilidade de um modelo ontológico em vários sistemas de informação simultâneos, porque ainda existem muitas falhas nesse processo.

Entre as limitações do estudo, destaca-se a seleção de poucas publicações com esse tema. Entretanto, apesar disso, as expectativas para o desenvolvimento e a aplicabilidade de ontologias na área da saúde são crescentes, devido a ser uma temática atual e inovadora.

Conclusões

Entre os resultados, destacaram-se a dificuldade para a interpretação de dados complexos, heterogêneos e dispersos, bem como a falta de integração e padronização de dados médicos nos sistemas de informação em saúde. Apesar de outros resultados relevantes encontrados na pesquisa, a implementação de uma estrutura ontológica a fim de unificar e integrar informações do sistema de gestão em saúde foi a predominante em todo o trabalho de revisão.

Nos estudos analisados, ficou evidente o processo de evolução e adaptação do uso de ontologias no sistema de saúde. Até a primeira metade do século 19, a ontologia era estudada apenas pela filosofia e pela metafísica, entretanto sua aplicação foi expandida para outras áreas a partir da segunda metade do mesmo século. Devido à grande quantidade de dados médicos, à sobrecarga de pacientes e à alta demanda de trabalho, os sistemas de informação em saúde buscam formas de otimizar tempo e recursos por meio de modelos ontológicos. Os estudos analisados permitiram comprovar esse feito.

As contribuições desta scoping review apontam para a ampliação do uso de ontologias que tendem, sobretudo, a favorecer os sistemas de informação em saúde no apoio ao trabalho dos profissionais de saúde. A utilização de ferramentas embasadas em ontologias possibilita o aperfeiçoamento das competências gerenciais em prol do atendimento às necessidades de saúde das pessoas. A partir do conhecimento das vantagens da aplicação de ontologias no serviço de saúde, sugere-se que estudos futuros foquem em estratégias para sua aplicabilidade.

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Notas

* Tipología de artículo: de revisión.

Autor notes

a Autor de correspondencia. Correo electrónico: danielle.fogliatto@ufpr.br

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