Residência no processo de construção do conhecimento do enfermeiro: motivações e percepções dos residentes*

Student Nurse Internship in the Process of Building the Nursing Knowledge: Motivations and Perceptions by the Student Nurse Intern

Residencia en el proceso de construcción del conocimiento del enfermero: motivaciones y percepciones de los residentes

Investigación en Enfermería: Imagen y Desarrollo, vol. 21, núm. 1, 2019

Pontificia Universidad Javeriana

Deise Conrada a

Unidade Integrada de Prevenção do Silvestre Saúde, Brasil


Larissa Rakel Sousa Freires

Unidade Integrada de Prevenção do Silvestre Saúde, Brasil


Evelyn Nascimento de Morais

Hospital Adventista Silvestre, Brasil


Cássio Baptista Pinto

Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Brasil


Vania Moraes da Silva

Hospital Adventista Silvestre, Brasil


Beatriz Gerbassi Costa Aguiar

Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Brasil


Recepção: 10 Agosto 2017

Aprovação: 28 Maio 2018

Resumo: O programa de residência consiste em uma modalidade de ensino de Pós-Graduação Lato sensu, voltada para ás áreas de saúde, sendo uma especialização caracterizada pelo ensino em serviço, oferecendo instruções práticas específicas e direcionadas. A proposta do estudo visa mostrar os sentimentos e vivências de Enfermeiros Residentes e como eles influenciam no processo de formação. Objetivo: Identificar as expectativas, motivações e percepções vivenciadas pelo enfermeiro residente da residência hospitalar com foco em geriatria de um hospital particular do Rio de Janeiro entre os anos de 2015 e 2016. Método: Trata-se de uma pesquisa descritiva, com abordagem qualitativa, cuja coleta de dados foi realizada através de entrevista semiestruturadas, com 18 enfermeiros residentes. Resultados: Na análise dos dados emergiram três categorias temáticas: Motivação ao escolher o programa de residência; expectativas ao ingressar no curso e, percepções após o ingresso na residência. Conclusão: Observou-se que muitos são os benefícios ao optar por uma especialização com Modalidade de treinamento em serviço. O estudo mostra que a especialização em forma de residência proporciona ao enfermeiro vivências da realidade, que os capacita e os torna melhor preparados para o mercado de trabalho.

Palavras-chave enfermagem, educação, saúde, especialização.

Abstract: The student nurse intern program consists in a lato sensu postgraduate modality focusing on the health field. It is a specialization program characterized by the teaching of services, providing practical, specific and directed guidelines. The proposal in this study aims to disclose the feelings and life experiences of the Student Nurse Interns and how all this influence their formation process. Objective: To identify the expectations, motivations, and perceptions experienced by the student nurse intern in her/his hospital internship in the area of geriatrics at a specific hospital in Rio do Janeiro between 2015 and 2016. Method: This is a research based on a qualitative descriptive approach and the data collection was carried out through semi-structured interviews applied to 18 student nurse interns. Results: Three theme categories stemmed from the data analysis: motivation when choosing a nurse internship program; expectations before entering to the course; and perceptions after starting the nurse internship. Conclusion: A lot of benefits were observed when students choose a specialization program with a service training modality. The study shows that the specialization carried out as a nurse internship provides the student nurse with life experiences in the reality, which nurtures and prepares her/him better to cope with the labor market.

Keywords: nursing, teaching, health, specialization.

Resumen: El programa de residencia es una modalidad de educación de posgrado, orientada hacia las áreas de la salud, caracterizada por la enseñanza en servicio y por ofrecer instrucciones prácticas, específicas y dirigidas. La propuesta del estudio tiene el propósito de mostrar los sentimientos y las vivencias de enfermeros residentes y la forma como influyen en el proceso de formación. Objetivo: Identificar las expectativas, motivaciones y percepciones vivenciadas por el enfermero residente de la residencia hospitalaria con enfoque en geriatría de un hospital particular de Río de Janeiro entre 2015 y 2016. Método: Investigación descriptiva con abordaje cualitativo, cuya recolección de datos fue realizada a través de entrevistas semiestructuradas, con 18 enfermeros residentes. Resultados: En el análisis de los datos emergieron tres categorías temáticas: motivación al escoger el programa de residencia, expectativas al ingresar en el curso y percepciones después del ingreso a la residencia. Conclusión: Se observó que hay muchos beneficios al optar por una especialización con modalidad de entrenamiento en servicio. El estudio muestra que la especialización en forma de residencia proporciona al enfermero vivencias de la realidad, que lo capacita y lo deja mejor preparado para el mercado de trabajo.

Palabras clave: enfermería, enseñanza, salud, especialización.

Introdução

O programa de residência consiste em uma modalidade de ensino de pós-graduação lato sensu, voltada para ás áreas de saúde, sendo uma especialização caracterizada pelo ensino em serviço (1). A busca pela residência como modalidade de especialização se dá principalmente pelos Enfermeiros recém-formados, destacando a prática insuficiente durante a graduação e por considerarem a residência um diferencial para o aprimoramento da profissão, como também a competitividade do mercado de trabalho que exige um profissional melhor preparado (2).

Ao enfermeiro residente é ensinado a ser capaz de tomar decisões, solucionar problemas, atuar na assistência direta ao paciente e estar inserido na equipe de maneira integral e humanizado. A formação que se têm através do trabalho qualifica o profissional agregando a este uma assistência resolutiva e eficaz para transformar a realidade (3).

As áreas de atuação dos egressos são variadas, assistência, gerência, ensino e pesquisa, dando ao enfermeiro residente suporte teórico e prático permitindo a este capacitação e crescimento profissional (2). Entende-se que cursar uma residência traz muitos benefícios ao enfermeiro, pois se aprimora e se desenvolve habilidades, fazendo-o se tornar mais seguro na prática, criando a visão crítica de suas necessidades e prioridades, além de melhorar as condições de trabalho no qual está inserido (4).

As dificuldades também fazem parte do aperfeiçoamento do profissional que ingressa no curso. Situações de conflitos, estresse, cansaço e insatisfação são apontadas como fatores negativos desse formato de pós-graduação (5). Vale ressaltar que a residência é um programa de especialização que vem se destacando, pois oferece um ensino prático único. A proposta do estudo visa mostrar os sentimentos e vivências de Enfermeiros Residentes e como eles influenciam no processo de formação.

Foram formuladas as perguntas norteadoras no sentido de guiar o estudo: Quais as motivações ao escolher a residência? O que mudou desde a inserção no programa? Quais as maiores dificuldades que você encontrou na residência? A residência contribuiu para seu crescimento profissional? Suas expectativas ao escolher o programa foram supridas? Você observou mudanças em si mesmo após a inserção do programa?

Nesse contexto o estudo tem como objetivo, identificar as expectativas, motivações e percepções vivenciadas pelo enfermeiro que ingressam na Residência Hospitalar com foco em geriatria de um hospital particular do Rio de Janeiro entre os anos de 2015 e 2016.

Método

Trata-se de um estudo descritivo, com abordagem qualitativa que segundo Minayo (6), tem como finalidade compreender melhor a experiência transmitida pelo sujeito do estudo e suas vivências. O estudo descritivo tem por objetivo a narração de experiências de determinadas populações, proporcionando novas visões de realidades já outrora conhecidas (7).

O estudo foi realizado em um hospital particular com sede na cidade do Rio de Janeiro, que dispõe de um Programa de Residência em Enfermagem Hospitalar com foco em saúde do idoso, em cooperação técnica com a Faculdade Adventista da Bahia.

Este programa de residência caracteriza-se como um ensino de pós-graduação latu-sensu, tendo duração de 12 meses, com carga horária de 60 horas semanais teórico-prático, totalizando 3030 horas. As atividades são realizadas no período matutino e vespertino em regime de dedicação exclusiva.

Os critérios de inclusão foram: residentes de enfermagem do Programa de Residência Hospitalar com foco em geriatria entre os anos de 2015-2016, que aceitassem assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Foram excluídos do estudo aqueles que se desligaram do Programa e que não trabalham no hospital de ensino.

Participaram da pesquisa 18 enfermeiros, sendo estes 09 ex-residentes que ingressaram no curso no ano de 2015 com conclusão em janeiro de 2016 e que atualmente trabalham na instituição de ensino e 09 residentes que ingressaram no ano de 2016 com previsão de término em Janeiro de 2017.

Foram realizadas entrevistas semiestruturadas, gravadas individualmente com gravador digital, no local de trabalho, em área reservada, conforme a disponibilidade do entrevistado, entre o período de 20 de abril a 05 de maio de 2017, após a assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido. Cada enfermeiro residente recebeu um pseudônimo para preservar sua identidade, sendo estes nomes de flores: jasmim, girassol, violeta, angélica, copo de leite, cravo, rosa, gardênia, íris, jacinto, lírio, margarida, narciso, tulipa, dália, hortênsia, dente de leão, flor-de-lis.

O estudo respeitou as determinações da Resolução 466 de 12 de dezembro de 2012, considerando o respeito, a ética, o progresso da ciência e da tecnologia, protegendo os participantes da pesquisa envolvida (8). A coleta de dados se deu após a autorização do Comitê de Ética e Pesquisa, da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, sob o número 2.022.931, cumprindo as determinações dos aspectos éticos internacionais.

Os resultados obtidos foram discutidos com base na literatura científica e analisados através da análise de conteúdo proposta por Bardin, onde a pesquisa é validada, sobretudo na elaboração das deduções específicas sobre um acontecimento ou uma variável de interferência precisa e não em interações gerais, construindo categorias de análises e possibilitando a criação de novos conhecimentos (9).

Resultados e discussão

Dos 18 participantes da pesquisa, quatorze (77,8%) era do sexo feminino, com faixa etária entre 22 a 31 anos, todos solteiros, sem filhos, sendo que quatorze cursaram a graduação no estado da Bahia e quatro no estado do Paraná e todos nascidos em regiões diferentes do Brasil. Nenhum exerceu a atividade profissional como enfermeiro antes de ingressar no curso de especialização.

Durante e análise de dados emergiram três categorias temáticas: 1) motivações ao escolher o programa de residência; 2) expectativas ao ingressar no curso; e 3) percepções após o ingresso na residência.

Os avanços tecnológicos e a necessidade de capacitação obrigam principalmente os recém-formados a encontrarem alternativas para exercer sua profissão no mercado de trabalho competitivo. É a partir desse quadro que a especialização em forma de residência se destaca, pois qualifica, capacita e habilita aquele que se dispõe ao trabalho intensivo da mesma (2).

Motivações ao escolher o programa de residência de enfermagem

Quanto à escolha do programa de residência como especialização, observa-se nas falas a busca pela experiência profissional, pois todos eram recém-formados, o desenvolvimento das habilidades que ainda não haviam adquirido e a capacitação oferecida pela carga horária prática sendo essa maior e mais intensa que a da graduação.

Primeiro foi uma oportunidade de crescer e de adquirir experiência. (Jasmim)

Eu via a residência como uma oportunidade de desenvolver minhas habilidades técnicas. (Rosa)

A motivação da residência era que ela tinha um valor a mais do que uma especialização normal, a questão das horas práticas e que eu acreditava que isso pesaria mais pra frente. (Íris)

Através das falas foi possível perceber uma mudança na visão dos Enfermeiros Residentes quanto ao cenário de atuação do enfermeiro, que se forma mais crítico, buscando maior realização profissional e satisfação crescente no trabalho. Entende-se que ou ele busca maior qualificação ou não se ajusta ao que é exigido (10). Os residentes ressaltavam em suas falas a necessidade de aprender e vivenciar a prática do trabalho para atingir a competência requerida na atualidade.

O que me motivou foi que a partir de quando você sai da graduação é muito difícil conseguir um emprego, sai sem experiência e muitas vezes sua faculdade não te capacita, você não tem uma vivência como uma residência ela te proporciona, por isso eu escolhi fazer uma residência ao invés de fazer uma pós. (Jacinto)

A residência é uma especialização diferenciada, a gente vê que a residência ela tem um cunho prático mais intenso e mais presente durante o processo de especialização. (Lírio)

Pesquisas ressaltam que a capacitação através da residência eleva a qualidade da assistência e forma profissionais bem mais preparados e que atendem a demanda do mercado de trabalho devido maior conhecimento e especialização. O trabalho ao longo da formação qualifica o profissional e produz assistência mais resolutiva e que transforma a realidade (4,3).

A escolha específica desse hospital também ocorreu por motivações religiosas e espirituais, devido à missão e valores que o mesmo agrega as práticas.

Existem vários contextos para eu ter escolhido a residência, o que mais pesou foi pela parte espiritual. (Girassol)

Na verdade, eu não queria vir e acabou que foi resposta de Deus e eu acabei concluindo que eu teria que vir para cá. (Gardênia)

Expectativas ao ingressar no curso de residência de enfermagem

Quanto às expectativas os participantes relataram o conflito ao escolher a especialização hospitalar com foco em saúde do idoso, já que não tinham essa área como primeira opção.

Eu imaginava que não ia gostar de jeito nenhum, porque eu nunca gostei assim, não que eu não gostasse de idoso, mas saúde do idoso nunca foi o que eu queria, para mim seria a última opção. Mas eu percebi quando cheguei aqui que o foco é saúde do idoso, mas não era bem do jeito que eu pensava e eu acabei gostando bastante e me identificando muito com saúde do idoso. (Jasmim)

Em uma pesquisa realizada com Enfermeiros Residentes na cidade do Rio de Janeiro, notou-se que a escolha do curso também foi baseada pela preferência e identificação que os mesmos tinham com a área de especialização (11). No entanto essa não foi uma razão para a escolha dos alunos da residência hospitalar com foco em saúde do idoso que optaram pelo curso com maior intuito de capacitação para o mercado de trabalho.

O receio quanto à rotina de trabalho e o desejo de alcançar o aperfeiçoamento na prática hospitalar para adquirir competências foram pontos destacados nas falas. Vê-se que os Enfermeiros Residentes ainda não se sentiam totalmente preparados para assumir as responsabilidades da enfermagem pelas inseguranças técnicas e insuficiência da prática.

Eu realmente imaginava que seria bem puxado, que a rotina seria muito pesada, mas eu imaginei que isso iria agregar muito para o meu curriculum no futuro, que traria um retorno muito bom para mim profissionalmente, na parte prática e tudo. (Gardênia)

Em um estudo realizado em grupo de residentes multiprofissionais em um hospital no Sul do Brasil, viu-se que apesar das dificuldades apontadas durante o processo de trabalho, a residência promoveu melhorias na área do saber, na prática, e os mesmos demonstraram em suas falas a gratidão pela oportunidade de trabalhar em um contexto de saúde tão ampliado (12).

Percepções após o ingresso na residência de enfermagem

Os Enfermeiros Residentes relataram que houve muitas mudanças após a inserção no Programa tanto no âmbito profissional quanto pessoal. Destacaram o aperfeiçoamento profissional nas habilidades práticas e das competências necessárias para o exercício da enfermagem, como liderança além do próprio amadurecimento pessoal proporcionado por novas experiências.

Eu amadureci bastante. Aprendi a ver a realidade de outra forma, a realidade profissional. Eu percebi que a gente passa pelo estágio da faculdade, mas não é nada do que a gente passa aqui. A gente aprende a realmente a ser enfermeiro. Eu aprendi bastante a exercer a liderança, pulso firme, eu cresci profissionalmente e como pessoa também. Aprendi a lidar com a vida. (Jasmim)

Habilidade pra tomar decisões, habilidade prática também, eu tinha muito medo de intercorrências e hoje não. Amadurecimento. (Dente-De-Leão)

Estudos mostram que muitas são as vantagens de cursar uma residência, pois além do amadurecimento teórico-prático, o residente obtém segurança profissional para realizar procedimentos inerentes à área e eleger prioridades, elevando a qualidade da assistência (4). Observa-se que esse amadurecimento ocorre pelas diferentes situações que o profissional tem de lidar durante o curso.

Autores também apontam que essa especialização tem a intenção de formar um profissional com uma visão crítica quanto a assistência a ser prestada para tornar o atendimento ao cliente mais eficiente, oferecendo ao enfermeiro residente experiências variadas e que o levem a ser mais resolutivo (10).

Mesmo com tantos benefícios de uma Pós-Graduação com intensa carga horária de práticas, as 60h semanais foi um dos problemas encontrados pelos participantes.

A carga horária intensa já te deixa um pouco mais voltado para realidade, porque quando você sai da faculdade você está acostumado com a sua carga horária de estágio que não é muito intensa como a carga horária profissional que trabalha na área. (Lírio)

A carga horária é pesada e a gente não é acostumada com isso. (Flor-De-Lis)

A qualificação profissional pela residência exige a carga horária extensa de práticas, pois visa à qualidade da assistência (13). Mesmo cientes da carga horária durante a escolha da especialização, a vivência é mais intensa e observa-se em suas falas o cansaço que a mesma ocasiona.

A transição de maior carga horária prática e menos teoria durante a especialização, surpreendeu os participantes que relataram a vontade de haver maior abordagem acadêmica.

Havia uma perspectiva mais voltada para um melhor desenvolvimento também acadêmico aqui, no entanto a gente percebe que houve mais um desenvolvimento no lado técnico não tanto teórico quanto eu imaginava. (Lírio)

Eu acho que deveria ter mais foco, continuar com a prática, mas ter um foco mais na parte acadêmica. (Íris)

Em outros estudos realizados com enfermeiros residentes, a ausência ou insuficiência de conteúdo teórico foi apontada como uma deficiência da pós-graduação. Autores apontam que há pouco incentivo a pesquisa, participação em eventos científicos, elaboração de projetos aplicáveis à unidade de atuação do residente, discussão de temas relevantes para a assistência, encontros multiprofissionais dentre outros fatores (2,11).

Vê-se a necessidade do vínculo entre a teoria e a prática para guiar a assistência, garantindo o conhecimento das possíveis mudanças tecnológicas que influenciará na postura do profissional em suas atividades. Entende-se que quando o enfermeiro realiza suas atividades com embasamento científico este aperfeiçoa sua prática profissional (4,10).

Os programas de residência devem obedecer alguns critérios quanto as atividades teórico-práticas, assegurando o mínimo de 20% da carga horária total e semanal para exercícios como aulas, seminários, estudos de casos e devem ser ministradas durante todo o período da residência. Ao final da especialização também é exigido um trabalho de conclusão de curso (14).

Constata-se que deve haver mais estratégias acadêmicas englobadas na prática. Residentes de Enfermagem de outra instituição consideraram como fragilidade a dificuldade da preceptoria em integrar essa teoria ao serviço o que provoca falha no processo de formação. A educação permanente em saúde foi apontada em outro estudo como sendo desenvolvida durante o encontro com a preceptoria, pois era naquele momento que ocorriam à troca de experiências e diálogos que traziam melhoria a atuação do Enfermeiro (11,12).

O grupo de enfermeiros residentes estudado tiveram em sua grade curricular aulas com professores de outras instituições, aulas com profissionais especialistas com quem trabalhavam no dia-a-dia, apresentações de estudo de caso, incentivo a construção de artigos científicos, sessões clínicas quinzenais, participação em rounds realizados em unidades fechadas, entrega de relatórios semanais e o desenvolvimento de atividades dentro dos campos de estágio, mostrando assim que a especialização está de acordo com as exigências do Conselho Federal de Enfermagem (COFEN) e que a necessidade teórica relatada por residentes se dá pela transição da graduação, cuja carga teórica é maior, para a especialização com foco prático.

Uma das dificuldades apontadas pelos enfermeiros residentes foi o relacionamento com as preceptoras e com outros profissionais do hospital que apresentaram resistência ao início das atividades.

A professora também não me sentia tão à vontade com elas. (Angélica)

Você está sendo assistido por um preceptor, mas você também é um profissional formado, então você acaba tendo responsabilidade e isso acabou sendo uma dificuldade porque você acaba levando um pouco mais de responsabilidade no que você está fazendo, mas mesmo assim você tinha alguém para estar tirando as suas dúvidas e ajudando no que fosse preciso. (Jacinto)

O medo das preceptoras e de elas falarem que está ruim, me ajudou muito- (Narciso)

Os preceptores são os responsáveis por acompanhar e dar o suporte para que os residentes se desenvolvam na prática. A preceptoria tende a ser apontada em alguns estudos como uma das fragilidades de outros programas de residência sendo destaque a deficiência na supervisão nas atividades práticas e os conflitos pessoais (10).

Quanto aos outros profissionais com os quais os enfermeiros residentes têm de trabalhar no dia-a-dia percebe-se que muitos não compreendem o real papel do residente.

Dentro da prática a gente percebe que há um pouco de resistência, na verdade a resistência é maior por parte dos profissionais que já estão na área e isso acaba gerando um choque. (Lírio)

No começo como a gente foi a primeira turma, teve uma resistência muito grande pelos profissionais que estavam aqui porque nunca tinham tido contado com residentes de enfermagem. (Hortênsia)

Entrar nesse grupo de funcionários, com essa máscara de residentes, essa aceitação foi a parte mais difícil e também o lidar diário. (Flor-De-Lis)

Muitos são os conflitos apontados em outras pesquisas, quanto aos demais profissionais do hospital, a maioria reage negativamente, não valorizando o residente em serviço e não dão atenção ao novo profissional (11).

Em um estudo realizado no Sul do Brasil, os Residentes apontaram que a instituição onde ocorriam as práticas não entendia por completo a proposta da residência e a dificuldade de compreensão por parte dos trabalhadores trazia sofrimento aos alunos que se sentiam apenas executores de tarefas (15).

A adaptação ao trabalho e aos colegas como também a pressão sofrida pelo grupo para adquirir a capacitação e realização profissional foram citados como fatores estressores e desestimulantes pelos entrevistados. Alguns destes foram cansaços físicos, a distância da família, a pressão exercida no trabalho, o valor da bolsa de estudo, a moradia dentro da área hospitalar dentre outros.

Também acho que a gente sofre uma pressão muito grande, acho que é desnecessário, que a gente está como aprendiz, mas acho que a gente é pressionado demais é muito cobrado, é uma das coisas que dificulta também o processo. (Rosa)

Acho que a pressão psicológica, a gente é muito pressionado o tempo inteiro para ser bom. É uma coisa boa, mas com o tempo se torna um fator muito estressante. (Gardênia)

O cansaço foi uma barreira importante. (Copo-De-Leite)

As maiores dificuldades que eu encontrei foi me adaptar a um ambiente muito novo, com pessoas com atitudes e comportamentos diferentes aqueles que eu estava acostumada. (Girassol)

As sensações de desgaste e a pressão psicológica foram relacionadas em outra pesquisa com as tantas responsabilidades atribuídas aos residentes. Percebe-se que a vida do enfermeiro está em constante mudança, que exige do mesmo a se adaptar física, mental e socialmente a situações fora do cotidiano comum (15).

Pesquisa sobre a síndrome de Burnout, síndrome de quem lida direto e intensamente com pessoas, em residentes aponta que há propensão para o desenvolvimento da mesma nesse grupo, pois alguns dos fatores são ser jovem, do sexo feminino, solteiro, sem filhos, estar no início da carreira profissional e lidar com fatores estressantes diariamente, pois estes tem menor facilidade em superar o desgaste das situações pessoais e profissionais (5,15).

Inserida nesse contexto, estratégias foram utilizadas para aliviar o estresse relatado pelos residentes, como reuniões com a psicóloga, realizadas a cada 15 dias e as atividades lúdicas e, passeios promovidos pelas preceptoras fora do ambiente hospitalar no tempo livre.

Conclusão

O estudo apresentou em parte a realidade enfrentada por profissionais recém-formados que escolheram a residência como modelo de especialização para um aprimoramento profissional. Os resultados apontaram que as motivações dos enfermeiros foram porque o curso proporcionava maior capacitação técnica, facilitando a inserção no mercado de trabalho e sanando as lacunas e inseguranças não supridas na graduação.

Muitas foram as dificuldades apontadas pelos enfermeiros residentes como o desgaste físico devido a carga horária de 60 horas semanais, a pressão psicológica sofrida pela necessidade pessoal de crescimento e o acerto nas atividades práticas, os conflitos com outros profissionais e a convivência com os colegas. Mas, estes também pontuaram que apesar de todos os obstáculos enfrentados ocorreu a experiência prática adequada que proporcionou o amadurecimento profissional e pessoal, e o desenvolvimento nas áreas de liderança e gestão contribuindo para a capacitação dos mesmos.

Conflitos de interesses

Os autores declaram não haver conflitos de interesse.

Referências

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9. Bardin L. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70; 2011.

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Notas

* Artigo de reflexão

Notas de autor

a Autora de correspondência. Correio eletrônico: larissa.freires@silvestresaude.com.br

Informação adicional

Para citar este artículo: Conrad D, Freires LR, Morais E, Pinto C, Silva V, Aguiar B. Residência no processo de construção do conhecimento do enfermeiro: motivações e percepções dos Residentes. Investig Enferm Imagen Desarr. 2019;21(1). https://www.doi.org/10.11144/Javeriana.ie21-1.rpcc

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