O Uso Retórico do Antigo Testamento na Carta aos Colossenses*

The Rhetorical Use of the Old Testament in the Letter to the Colossians

Waldecir Gonzaga, Doaldo Ferreira Belem

O Uso Retórico do Antigo Testamento na Carta aos Colossenses*

Theologica Xaveriana, vol. 71, 2021

Pontificia Universidad Javeriana

Waldecir Gonzaga a

Pontificia Universidad Católica de Río de Janeiro, Brasil


Doaldo Ferreira Belem

Instituto Bíblico Ebenezer, Brasil


Recepção: 20/11/19

Aprovação: 14/03/20

Resumo: A Carta aos Colossenses, além da questão se de fato é ou não deuteropaulina, entrou no centro do debate sobre a Metodologia do uso da Antigo Testamento pelo Novo Testamento. Se durante muitos anos foi considerada uma das poucas cartas do corpus paulinum a não possuir nenhuma citação do Antigo Testamento, Beale conseguiu encontrar várias alusões. Foster criticou a metodologia utilizada em Colossenses, o que mereceu uma resposta por parte de Beale. Entretanto, Beetham confirmou o uso detectado por Beale, especificando a diferenciação entre alusão e eco – embora analisando menos passagens do Antigo Testamento. Este artigo propõe dar um passo além, ao analisar como essas alusões e ecos estão inseridas na disposição da carta segundo a Análise Retórica Bíblica Semítica. Os comentadores paulinos têm indicado, cada vez mais, que em Paulo a retórica e a teologia caminham juntas. Aliás, nas cartas paulinas, a retórica, de fato, não é apenas uma moldura, mas um grande instrumento para se transmitir a mensagem do ressuscitado. Segundo Meynet, a contribuição da Análise Retórica Bíblica Semítica permite ver como o paralelismo dos membros, o quiasmo e os diversos níveis de um texto bíblico têm sua função na estruturação e mensagem do texto. Isso se torna mais eficiente quando se procura analisar a presença de citações, alusões e ecos do Antigo Testamento no Novo Testamento, a partir do método do Uso do Antigo Testamento no Novo Testamento integrado com a Análise Retórica Bíblica Semítica, como aqui em Colossenses. São duas metodologias distintas, mas que podem colaborar muito nas investigações bíblicas para demonstrar que a ausência de citações do Antigo Testamento nesta carta foi um recurso retórico utilizado por Paulo para oferecer ao leitor um magnífico texto capaz de unir cristologia, eclesiologia e a presença do Antigo Testamento, ainda que por meio de alusões e ecos, e não de citações explícitas.

Palavras-chave:Colossenses, Antigo Testamento, Novo Testamento, Análise Retórica Bíblica Semítica, Beale, Foster, Beetham, citações, alusões, ecos.

Abstract: The Letter to the Colossians, beyond the question if in fact is deutero­pauline or not, did enter in the middle of the discuss about the Methodology of the New Testament Use of the Old Testament. If during many years it was considered one of the few letters of the corpus paulinum that do not have any quotation from the Old Testament, Beale achieved to find many allusions. Foster critiqued the methodology used in Colossians, which deserved an answer by Beale. However, Beetham confirmed the use detected by Beale, specifying the differentiation between allusion and echo – though analyzing fewer passages from the Old Testament. This article proposes to take one­step beyond, by analyzing how these allusions and echoes are inserted in the letter’s arrangement in according to the Semitic Biblical Rhetoric Analysis. Pauline commentators have increasingly indicated that in Paul rhetoric and theology go together. In fact, in the Pauline letters, rhetoric, indeed, is not just a frame, but a great instrument for transmitting the message of the Risen. According to Meynet, the contribution of Biblical Semitic Rhetorical Analysis allows us to see how the parallelism of the members, the chiasmus and the different levels of a biblical text have their role in the structuring and message of the text. This becomes more efficient when looking to analyze the presence of Old Testament quotes, allusions and echoes in the Novo Testamento, using the method of the Old Testament Use in the New Testament integrated with the Semitic Biblical Rhetorical Analysis, as here in Colossians. They are two distinct methodologies, but they can collaborate a lot in biblical investigations to demonstrate that the absence of Old Testament quotes in this letter was a rhetorical resource used by Paul to offer the reader a magnificent text capable of bringing together Christology, Ecclesiology and the presence of the Old Testament, albeit by means of allusions and echoes, and not by explicit quotations.

Keywords: Colossians, Old Testament, New Testament, Semitic Biblical Rhetoric Analysis, Beale, Foster, Beetham, Quotes, Allusions, Echoes.

Introdução

Paulo é o “primeiro teólogo” do cristianismo, que “soube moldar seu ensino em for­ ma de carta”, um “missionário que se torna também escritor”1. E, embora desde a Antiguidade trabalhou­se com as citações do Antigo Testamento feitas pelo Novo Testamento, apenas recentemente iniciou­se uma pesquisa sobre as alusões e paralelos, tendo justamente no campo do corpus paulinum o trabalho pioneiro de Richard Hays2. Desde então, deflagrou­se um processo que Beetham denomina “paralelomania”3. A falta de um critério mais preciso – quando há alusão, e quando eco? – gerou críticas por parte de alguns estudiosos, na qual a Carta aos Colossenses ocupou um papel importante recentemente, justamente por não conter nenhuma citação do Antigo Testamento.

Outra coisa é a existência de livros do Antigo Testamento que não são citados no Novo Testamento e há vários, seja da Hebraica seja da LXX4, mas este não é o objeto de nossos estudos. Porém, dos livros do Antigo Testamento citados no Novo Testamento, podemos computar ao redor de 300 citações diretas e mais de 4.000 alusões5, e em 90 % dos casos das citações a fonte usada foi a partir da versão grega da LXX e não do texto hebraico. Ademais, é importante também frisar que não há unanimidade entre os pesquisadores quando procuram distinguir entre citações . alusões ou entre alusões e ecos6.

Este artigo visa, portanto, debater o uso do Antigo Testamento nesta carta “apaixonante”, seja ela do próprio Paulo ou da escola que deu continuidade à sua tradição, como defende a maioria dos autores. Para tanto, oferece­se um resumo da metodologia do uso do Antigo pelo Novo Testamento, proposta a partir de Richard Hays, passando pela “maturação” de Gregory Beale e sua “precisão” em Cristopher Beetham. Segue­se uma visão panorâmica da Carta aos Colossenses, com sua ênfase na questão – resumida – acerca da autoria, teologia e estrutura. Passa­se então à análise de como esta carta utiliza o Antigo Testamento, com foco nos trabalhos recentes específicos de Gordon Fee, Gregory Beale, Cristopher Beetham e Jerry Sumney.

O trabalho encerra­se com a contribuição da Análise Retórica Bíblica Semítica, o método sincrônico ao mesmo tempo “antigo” e “tornado recente” pelo estudioso francês Roland Meynet7 que permite ver como o paralelismo, bem como os diversos níveis de perícopes, sequências e seções (níveis superiores retóricos) têm a sua função na estruturação e mensagem do inteiro texto da carta8, e principalmente como o uso do Antigo Testamento integra­se dentro da Análise Retórica Bíblica Semítica. Além disso, como afirma Aletti, é preciso que tenhamos em mente que em Paulo “retórica e teologia são inseparáveis”, ao ponto de que “a sua maneira de usar a retórica manifesta não somente a qualidade de sua teologia, mas ainda sua concepção da teologia”9.

O uso do Antigo Testamento no Novo Testamento: metodologia

Em razão das divergências verbais encontradas nas citações paulinas do Antigo Testa­ mento, Richard Hays propõe as seguintes perguntas: que tipo de texto era conhecido e usado por Paulo? Que livros e passagens do Antigo Testamento são citados por Paulo? Que tipo de tradição interpretativa Paulo representa? Paulo modifica ou não o sentido original da citação?10

No que diz respeito ao texto do Antigo Testamento utilizado dentro do Novo Testamento, raramente as citações – especialmente as paulinas – são retiradas do texto hebraico ao invés da Septuaginta11; e, quando isso ocorre, pode ser explicado como uma variante textual da Septuaginta submetida à uma “revisão hebraizante”, uma tendência atestada nas versões gregas de Áquila, Símaco e Teodocião12. Além das citações, Hays propõe uma discussão com base no fenômeno da intertextualidade13 partindo do trabalho de pesquisa literária efetuada por John Hollander, onde a continuidade dentro da tradição equipara­se a “poetas que honram as vozes dos mortos mesmo quando formam ecos que transformam suas palavras em um novo ambiente acústico”14.

Vários são os autores que tratam da temática do uso do Antigo Testamento no Novo Testamento, como um todo, como é o caso de Beale, ou no uso do Antigo Testamento em Paulo, como é o caso de Hays. Usaremos estas duas obras visto que no dão os critérios e passos a serem trilhados a fim de se encontrar e distinguir as citações, alusões . ecos do Antigo Testamento no Novo Testamento, ainda que com todos os seus limites, pois vale a pena sempre recordar que não é tarefa tão fácil estabelecer os limites entre alusões ou ecos, pois são muito próximas e implícitas, e não explícitas como as citações.

Hays então define um “eco alusivo”: quando o texto B pode ser compreendido à luz de uma ampla interação com o texto A, abrangendo aspectos do texto A que ultrapassam aqueles explicitamente ecoados. E, após análise de uma passagem da Carta aos Filipenses, especifica a diferenciação entre citação, alusão e eco como “ecos intertextuais” que variam de acordo em volume, movendo­se do explícito para o subliminar: quanto mais nos distanciamos da citação aberta, mais as relações inter­ textuais tornam­se menos determinadas. Concentrando­se nos ecos “de alto volume”, cujo caráter alusivo torna­se prontamente audível15, fornece sete testes para detecção dos ecos:

  1. Disponibilidade: a suposta fonte para o eco está à disposição do autor e dos leitores? Se sim, foi a partir do texto hebraico ou grego?

  2. Volume: qual o grau de repetição de palavras ou padrões sintáticos no texto precursor e no eco neotestamentário?

  3. Recorrência: quantas vezes o autor faz referências ao texto aludido ou ao contexto veterotestamentário usado?

  4. Coerência temática: até que ponto o suposto eco se adapta à linha argumentativa desenvolvida pelo autor do Novo Testamento?

  5. Plausibilidade histórica: até que ponto é plausível a afirmação de que o autor do Novo Testamento usou o eco para conseguir um determinado efeito de sentido ressonante nos leitores da época?

  6. História da interpretação: outros autores e leitores foram capazes de perceber os mesmos ecos que teriam percebido os contemporâneos do escrito?

  7. Satisfação: faz sentido a sua utilização em seu contexto imediato, esclarece e aumenta o vigor retórico da argumentação?16

Beale elabora então posteriormente um “Manual do Uso do Antigo Testamento no Novo Testamento”, analisando a possibilidade de um “livro­testemunho”, uma compilação de “textos­prova” para fins apologéticos, possíveis fontes para as referências ao Antigo Testamento feitas pelos escritores do Novo Testamento17. Volta­se então para o uso mais amplamente detectado no Novo Testamento, o tipológico, fornecendo cinco critérios para identificação do mesmo:

  1. Estreita correspondência analógica de verdades sobre pessoas, fatos ou instituições

  2. Historicidade

  3. Apontar para o futuro

  4. Intensificação de sentido entre as correspondências

  5. Retrospecção18

Após essas considerações introdutórias, Beale define uma citação como “reprodução direta de uma passagem do Antigo Testamento facilmente identificável por seu paralelismo vocabular claro e bem característico”19, e a alusão como “uma expressão breve deliberadamente pretendida pelo autor para ser dependente de uma passagem do Antigo Testamento”20– uma citação, pois, é uma referência direta, enquanto a alusão é indireta. E, entendendo que a diferenciação entre eco e alusão é de “pouca utilidade”21, não estabelece nenhum critério para tal diferenciação. Somente então Beale aponta nove passos para interpretar o uso do Antigo Testamento no Novo:

  1. Identificar e validar se há uma citação, alusão ou eco (neste primeiro passo são retomados os sete critérios propostos por Hays).

  2. Analisar o contexto geral do Novo Testamento em que ocorre a referência ao Antigo Testamento.

  3. Analisar o contexto imediato e o contexto geral do Antigo Testamento, interpretando atenta e minuciosamente sobretudo o parágrafo em que a citação, alusão ou eco ocorre.

  4. Pesquisar quanto ao uso do texto do Antigo Testamento no judaísmo anterior e posterior, o que possa ser importante para a apropriação do texto veterotestamentário pelo Novo Testamento.

  5. Comparar os textos, inclusive suas variantes textuais: Novo Testamento, Septuaginta, Texto Massorético e os Targumim, citações judaicas antigas (Manuscritos do Mar Morto, Pseudepígrafos, Flávio Josefo, Filon de Alexandria).

  6. Analisar o uso textual que o autor faz do Antigo Testamento, para se ver em qual tradição textual veterotestamentária o autor se apoia, ou se ele está dando sua versão pessoal, e como isso afeta a interpretação do texto do Antigo Testamento.

  7. Analisar o uso interpretativo, hermenêutico, que o autor faz do Antigo Testamento.

  8. Analisar o uso teológico que o autor faz do Antigo Testamento.

  9. Analisar o uso retórico que o autor faz do Antigo Testamento22.

Beetham, então, não somente incorporou os passos já apontados por Hays e por Beale (este, seu orientador na tese doutoral), como aprimorou a identificação entre citação, alusão e eco.

  1. – A citação deve ser intencional, explícita, verbatim ou quase de um texto anterior, contendo seis ou mais palavras deste, sendo formal quando acompanhada de fórmula introdutória ou informal na falta dessa23.

  2. – Uma alusão constitui um recurso literário intencionalmente empregado pelo autor, direcionando os leitores a uma única fonte identificável, ou no qual um ou mais componentes são trazidos a um novo contexto a fim de que o texto aludido possa ser plenamente compreendido. Uma alusão é menos explícita do que uma citação, e mantém o “limite linear” de cinco palavra ou menos – a não ser que seja precedida de uma “fórmula introdutória”, constituindo então uma citação e não uma alusão24.

  3. – Um eco define­se como um modo de referência literário sutil sem pretensões de reconhecimento pelo público, ainda que derive de um predecessor (fonte) específico. Um autor pode ecoar um predecessor consciente ou inconscientemente, contextualmente ou não – um eco, portanto, é menos explicito do que uma alusão25.

Beetham ainda acrescenta o conceito de paralelismo: um modo não literário de referência, quando não existem evidências fortes o suficiente para afirmar que texto x deriva de y, mas que apontam para tradições compartilhadas na comunidade identificadas por dados fornecidos pelas Escrituras como um todo26.

Carta aos Colossenses: Visão Panorâmica

Autoria

A Carta aos Colossenses vem sendo intensamente debatida pela sua autoria: antigamente reputada como paulina, hoje um grupo de acadêmicos – conforme cita­ do por Beetham, cerca de 60 % – a qualifica como uma das três deuteropaulinas, ao lado de Efésios e 2Tessalonicenses27.

A primeira negação da autoria paulina de Colossenses em tempos modernos data de 1838 quando E. T. Mayerhoff afirmou ter encontrado na carta pensamentos não­paulinos, evidências de disputas com Cerinto e uma dependência de Efésios, e que a heresia combatida na carta seria um gnosticismo do segundo século28. Schweizer aponta que “existe uma clara afinidade entre a carta aos Colossenses e a carta aos Efésios”29; opinião esta que é compartilhada pela maioria, como nos indica Aletti30.

Mas, na Antiguidade, nunca teve sua autoria posta em dúvida, aparecendo em todos os catálogos canônicos, incluindo os cânones de Marcião e o Muratoriano– embora em diferentes posições na ordem, o que indicaria diferentes avaliações acerca de seu grau de importância31.

Beale32 e Beetham33 partem do princípio de que se trata de uma carta “auten­ ticamente” paulina. O’Brien defende vigorosamente a autoria paulina, declarando que “a carta deixa claro que o autor é o apóstolo Paulo”34. Pérez Millos declara que se pode descobrir “com toda clareza” que o autor da carta é Paulo35. James Dunn usa uma solução “conciliatória”: os inúmeros pontos de contato com a teologia paulina pressupõe uma carta encomendada por Paulo a Timóteo quando aquele ainda se encontrava na prisão. Isto faria desta carta um escrito de “fronteira”, sendo o primeiro escrito da escola paulina quando Paulo ainda estaria vivo36. Pao analisa que, dentre as diversas possibilidades, considerar Paulo como o autor da carta ainda é a “melhor hipótese”37.

Mas Boring faz uma longa análise dos argumentos favoráveis a uma identificação não­paulina: Colossenses possui 86 palavras não encontradas nas cartas indisputadas: 34 são hápax legomena, 28 são encontradas em outras passagens do Novo Testamento, mas não nas cartas indisputadas; outras 25 são encontradas apenas em Colossenses e Efésios. Importantes vocábulos que são especificamente paulinos estão ausentes em Colossenses: ἁμαρτία (no singular), σῴζω/σωτηρία, νόμος, δικαιοσύνη, πιστεύω (pecado, salvação, lei, justificação, crer). Em contraste com o vívido estilo de Paulo, sentenças vão e voltam, frouxamente unidas por conjunções e pronomes relativos. Outro elemento característico é usar expressões com mais de uma palavra proveniente do mesmo campo semântico (cf. em 1,11, o uso de “δυνάμει δυναμούμενοι/fortalecidos em força”)38.

Com tudo isso, Boring conclui que a Carta aos Colossenses parece ter sido composta por alguém que cuidadosamente estudou a coleção das cartas paulinas, e foi influenciado pelo vocabulário destas – por um autor da escola paulina que adotou, adaptou, e elaborou material de Filemon. Seu autor seria um paulinista para as igrejas paulinas na Ásia Menor, possivelmente redigida em Éfeso por volta de 70 ou 80 d. C.39.

Além de Boring, temos muitos outros autores que igualmente consideram que a carta aos Colossenses não é de escrita autenticamente e genuinamente paulina. Em especial, a crítica alemã, do século XIX levantou problemas em relação à questão “lexicográfica, estilo e teologia”, bem como sobre a própria “construção das frases da carta”40, demonstrando outra mão na redação deste texto que muitos consideram como uma das três cartas deuteropaulinas41.

Teologia

Uma análise acurada da teologia presente na Carta aos Colossenses fornece mais argumentos em prol de uma autoria não­paulina: enquanto as cartas indisputadas se referem mais de 90 vezes ao Espírito Santo, em Colossenses temos apenas duas alusões, e mesmo assim possivelmente ao espírito humano (1,8; 2,5). Aqui, ser cristão é viver na esfera de Cristo (1,11), mas isso não é expresso (como em Paulo) em termos do Espírito Santo. Cristologia e eclesiologia estão intimamente entrelaçados, mas de maneira diferente da abordagem paulina: enquanto para Paulo o crente já está crucificado com Cristo, mas ainda não ressuscitado com ele, Colossenses apresenta a vida do crente já unida à de Cristo de tal forma que aquele já está ressuscitado com este (3,1­4)42; e a expectativa da proximidade da parusia desaparece completamente. Se Paulo sempre usa “igreja” para se referir primariamente à comunidade local, em Colossenses a Igreja é identificada com o corpo cósmico de Cristo, do qual o próprio Cristo é o cabeça (ao contrário da concepção paulina de Cristo como a totalidade do corpo)43.

Mas é a chamada “heresia colossense” que tem recebido grandes debates dos estudiosos. Esta seria propagada por um grupo de vigorosos mestres procurando subverter o evangelho para ativamente levar os cristãos a um sistema diferente de fé44. Sugere­se que a “heresia colossense” seria um desenvolvimento frígio no qual uma variante local de judaísmo teria sido fundida com uma filosofia de origem não­judaica– uma forma simples de gnosticismo sincretista45.

Isto seria reforçado pela expressão “ἃ ἑόρακεν ἐμβατεύων”, a qual pode ser traduzida como “entrado no que tem visto”, e refletiria práticas típicas das religiões de mistério46. Mas as descobertas de Qumran evidenciaram pontos de contato com a fraseologia usada em Colossenses (“τῷ σώματι τῆς σαρκὸς αὐτοῦ/seu corpo de carne”, cf. Cl 1,22; 2,11 e 1QpHab 9,1.2), levando alguns a considerarem a “filosofia colossense” como uma variante do ensinamento da comunidade de Qumran. Entretanto, não encontramos nenhuma referência a uma insistência em cerimoniais de ablução, os quais exerceram papel significante entre os essênios em geral e na comunidade de Qumran em particular – o batismo não é contraposto a estes cerimoniais, e sim à circuncisão (cf. Cl 2,11­12)47.

Não obstante, com as descobertas dos manuscritos do Mar Morto, o “pêndulo” virou de uma proposta de gnosticismo sincretista em direção a um ensinamento distintamente judaico. Faz mais sentido em razão das implicações de passagens como 1,12.21­22; 2,13 e 3,11­12 com seu foco nos privilégios pactuais judaicos, tornando desnecessária a hipótese do sincretismo gnosticista, e como imaginação histórica o “judaísmo gnóstico”48. A sugestão de que 2,18 refere­se à visão de anjos durante ritos de mistério no culto colossense49 pode então ser abandonada desde que o versículo seja mais plausivelmente interpretado como adentrando­se no templo celestial para adorar junto com os anjos, ao invés de um culto aos anjos50.

Estrutura

A Carta aos Colossenses é dividida em duas seções, que seguem o padrão generalizado das cartas paulinas: uma doutrinária (1,3–3,4) e outra parenética (3,5–4,6), emolduradas por uma saudação inicial (1,1­2) e outra final (4,7­18)51. Após a oração inicial (1,3­11), inicia­se com a expressão “Μετὰ χαρᾶς εὐχαριστοῦντες/com alegria dando graças”, em 1,12 (segundo a divisão dos versículos proposta pela Novum Testamentum Graece, ed. 2852, que desloca μετὰ do versículo anterior) uma nova sequência, retomando com o mesmo verbo εὐχαριστέω que aparecera anteriormente no v. 3, agora enfatizando a obra divina mediante Cristo. Esta sequência é composta pelo hino cristológico (1,15­20), emoldurado pela obra da redenção (1,12­14) e da reconciliação (1,21­23).

Em 1,24 a terceira pessoa do singular muda para a primeira pessoa do singular, onde o apóstolo narra o que tem feito pelos colossenses: anunciar o mistério para o corpo que é a Igreja (1,24­29), e reiterar sua luta pelos laodicenses e pelos colossenses (2,1­5). Em 2,6 volta a ênfase na terceira pessoa do plural, para advertir sobre um perigo: o engano de outros, não identificados, que procuram enredar os colossenses com “vãs e enganosas filosofias” (cf. 2,8). Mas, antes de esmiuçar essa “filosofia” em 2,16­19, enfatiza­se a “circuncisão não feita por mãos”, a “nova circuncisão” (2,6­15) que se contrapõe então à “velha circuncisão”.

Segue­se uma conclusão da parte doutrinária: se morrestes com Cristo, por que ainda sujeição a velhas ordenanças? (2,20­23) A expressão “Εἰ οὖν/portanto, se...”, em 3,1, conclui, não somente a falácia da “heresia colossense”, mas toda a seção doutrinária. Em 3,5 começa a seção parenética, abordando tudo que os cristãos precisam praticar: uma série de admoestações do que deve ser evitado, iniciando com “mortificai” (3,5­11); uma série de virtudes que devem ser cultivadas, iniciando com “revesti­ vos” (3,12­17); uma série de deveres domésticos (3,18 – 4,1); e, finalizando, uma exortação final da parte do apóstolo (4,2­6), complementando e concluindo toda essa seção parenética. Desta forma, numa análise preliminar, chega­se à seguinte estrutura:

Uso do Antigo Testamento na Carta aos Colossenses

Estado da pesquisa

Se os diversos estudiosos concordam que de fato não existe nenhuma citação do Antigo Testamento na Carta aos Colossenses53, há influência e presença forte o suficiente daquele nesta, algo já observado por Henry Gough em 1855 segundo Beetham– e este então sumariza o status quaestionis desde meados do século XIX até o final do século XX54. Embora o primeiro trabalho moderno dedicado exclusivamente a Colossenses tenha sido publicado em 2006 por Gordon Fee55, o pioneirismo coube a Beetham na sua tese doutoral em 2005. A orientação coube a Beale, que publicou também uma extensa análise em seu “Comentário do Uso do Antigo Testamento no Novo Testamento”, em 2007. Finalmente Beetham publicou sua tese como livro em 200856. Sumney publica então um artigo em 2012, no qual acrescenta paralelos, além da análise dos ecos e alusões encontrados nos demais autores e outros por ele detectados; embora reconheça como Beetham a diferença entre alusão e eco, prefere não especificar para as passagens listadas57.

Outros autores modernos não se detiveram numa análise minuciosa: Robertson apenas comenta brevemente as alusões de Is 29,13 em Cl 2,18­23 e do Sl 110,1 em Cl 3,158; segundo Kalvesmaki Is 29,13 é aludido em Cl 2,2 e o Sl 110,1 em Cl 3,159, e Belli não reconhece que haja alusões que remetam de algum modo a um texto da Escritura, embora debata a possibilidade de uma menção ao mistério de Dn 2 como possível explicação a este tipo de ausência60. Foster então avaliou como “exagero” a identificação nesta carta de inúmeras alusões e/ou ecos ao Antigo Testamento por parte de três estudiosos: Gordon Fee, Beale e Beetham.

Neste sentido, Foster criticou a falta de uniformidade na quantidade de alusões e/ou ecos identificados – 10 ecos por Gordon Fee e 17 alusões por Beale, enquanto Beetham identifica 2 alusões e 9 ecos61. Houve então a necessidade de uma resposta de Beale, defendendo o método: analisar o uso do Antigo Testamento em Colossenses não somente é possível como importante para compreender seu argumento e teologia; os três estudiosos utilizam diferentes metodologias, as quais são ignoradas por Foster; há apenas diferenças quantitativas de alusões e/ou ecos identificados, e não qualitativas, com mais sobreposições do que diferenças; as diferentes alternativas interpretativas propostas para uma mesma passagem não invalidam o método; e, se os comentaristas discordam sobre quais alusões e/ou ecos podem ser identificados em Colossenses, isto não nega a presença de linguagem alusiva na epístola. E Beale ainda pontua que, uma vez que o artigo de Foster foi publicado em 2015, “lamentavelmente” omitiu o “substancial artigo” de Sumney62.

Isto pode ser evidenciado pela tabela elaborada pelo próprio Foster, reproduzida aqui com adaptações, como o acréscimo da abordagem de Sumney e a retirada das referências da Novum Testamentum Graece (ed. 28), pois sua lista de alusões é apenas indicativa, não trazendo nenhuma nota explicativa63:
















A tabela proposta por Foster apresenta ainda uma inconsistência: lista como referência da Novum Testamentum Graece (ed. 28) em Cl 4,1 a Lv 25,43­53 e Ecl 5,7, as quais constam de fato na Novum Testamentum Graece (ed. 27)64 e foram retiradas da edição posterior. A Novum Testamentum Graece (ed. 28) ainda reconhece (não incluindo os pseudepígrafos) uma alusão a Is 53,5 em Cl 1,20; a Eclo 1,24­25; Is 45,3; Pr 2,3­4 em Cl 2,3; a Eclo 23,16 em Cl 2,11; e a Tb 10,13 em Cl 3,20. A Novum Testamentum Graece (ed. 28) confirma a alusão a Is 29,13 em Cl 2,22, enquanto a Novum Testamentum Graece (ed. 27) confirma ainda como alusões (não inclusas na Novum Testamentum Graece, ed. 28): a Pr 8,23­27 em Cl 1,17; a Sl 110,1 em Cl 3,1; e a Gn 1,26­28 em Cl 3,10.

Análise das passagens

Pode­se observar que as seguintes passagens são predominantes na análise dos quatro estudiosos destacados na tabela (considerando­se pelo menos três menções): “dar frutos e crescer”, Gn 1,26­28, em Cl 1,6.10.15; 3,9­10; Ex 31,3; 35,31­32; Is 11,2.9, em Cl 1,9­10; o “motivo do êxodo”, em Cl 1,12­14; 2Sm 7,12­16, em Cl 1,13; Sl 89,27 [LXX 88,28], em Cl 1,15; o tema da sabedoria ou Pr 8,22­31, em Cl 1,15­2065; Sl 68,16 [LXX 67,17], em Cl 1,19; Dt 30,6, em Cl 2,11; Gn 17,10­27, em Cl 2,13; Is 29,13, em Cl 2,22; e Sl 110,1, em Cl 3,1.

Esses textos serão, portanto, analisados resumidamente a seguir, indicando a fonte que, em sua maioria, vem da LXX, pois Paulo escreve em grego e é mais que natural que ele use a Septuaginta como fonte66. Mas, algumas vezes, ele também usa o texto hebraico ou mesmo outras fontes que nem sempre conseguimos descobrir67.

Gn 1,26­28 é o texto mais usado na Carta aos Colossenses e o mais reconhecido como referência pelos comentaristas. Gn 1,28, pela LXX, compartilha com Cl 1,6.10 uma concordância tanto verbal quanto conceitual, mantendo uma similaridade linguística muito grande68. Ambos utilizam “αὐξάνω/aumentar” e καί (e), e o uso de dois sinônimos: (1) a raiz פרה, presente no texto hebraico69, é traduzida na LXX por πληθύνω, o qual é semanticamente equivalente a “καρποφορέω/produzir fruto” em Colossenses; (2) e “κόσμος/mundo”, que em Cl 1,6 cobre o mesmo campo semântico de “γῆ/terra”, em Gn 1,28. Ambos os textos enfatizam o aumento e a expansão mundial mediante o imaginário do crescimento botânico, salientando que “uma nova criação foi inaugurada com os fiéis, por causa da identificação deles com Cristo”70.

Uma vez que καρποφορέω e αὐξάνω aparecem na mesma ordem em Mc 4,8, é possível que a referência ao texto de Gênesis tenha sido mediada pela tradição da Igreja ao escritor de Colossenses71. O mandato de Gn 1,28 – o primeiro dos 613 mandamentos segundo a tradição judaica – repete­se por todo o Antigo Testamento, concluindo­se então que “os fiéis são a descendência criada do último Adão, que estão começando a cumprir nele o mandato conferido ao primeiro Adão”72.

Beetham aponta ainda em Cl 1,9­10 um eco de Is 11,2.9: a expressão “πνεῦμα σοφίας καὶ συνέσεως/espírito de sabedoria e inteligência”, de Is 11,2, corresponde a “σοφίᾳ καὶ συνέσει πνευματικῇ/sabedoria do entendimento espiritual”, de Cl 1,9, além de “γνῶσις/conhecimento” de Is 11,2 ser da mesma raiz de “ἐπίγνωσις/conhecimento” em Cl 1,9; há ainda a rara similaridade conceitual de Deus estar preenchendo o mundo com o conhecimento de si mesmo através do seu Espírito e da figura messiânica73. Beale analisa que poderia se entender uma alusão não somente à passagem de Is 11,2.9, mas também a Ex 31,3; 35,31­32, uma vez que mantém em comum com Cl 1,10 o resultado desse preencher também como cumprimento da vontade de Deus “ἐν παντὶ ἔργῳ/em toda a obra74.

Entretanto, Isaías era mais utilizado como texto messiânico no início da era cristã do que a passagem de Êxodo – o qual seria obscuro, por comparação; e há em Is 11,2 o mesmo imaginário da nova criação já abordado através do eco de Gn 1,28. Que o tema criacional também está presente em Is 11,1­9 fica evidente pela citação deste em Is 65,2575. Gn 1,28 e Is 11,2 ainda mantêm em comum a metáfora botâ­ nica aplicada ao crescimento humano76. Há uma nova aplicação em Colossenses que diferencia daquela em Isaías: não apenas Cristo estará pleno de conhecimento, mas os membros da Igreja devem também estar repletos desse conhecimento, um “choque de reconhecimento” da transformação almejada77.

Embora seja pouco provável que se tenha em mente alguma passagem específica do Antigo Testamento, o “motivo do êxodo” parece ter influenciado o vocabulário de Cl 1,12­1478. Beetham começa sua análise em Dt 10,9, mediante os vocábulos “μερίς/ porção” e “κλῆρος/herança”, e Ex 14,30, mediante o verbo ῥύομαι, salientando que a ênfase para o texto de Colossenses não encontra­se na menção aos levitas, e sim ao fato de que as demais tribos realmente receberam sua parte na herança da terra de Israel79. Sumney salienta a “combinação de imagens” que parece aludir primariamente a Ex 6,6­8, embora também encontre ecos na aliança davídica em 2Sm 7,12­1480. Como Beale pontua, provavelmente o povo de Deus em Cristo é visto “sofrendo um êxodo semelhante ao do Egito, porém numa escala bem maior, que teve início espiritual­ mente nesta era e será consumado na ressurreição física”81.

É a evocação do tema do “segundo êxodo”, conforme atestado em Ed 9 e Ne 9. Entretanto, uma vez que estas restaurações do exílio babilônico foram incompletas, parciais, entende­se que o cumprimento cabal ocorreu com os colossenses, libertados do domínio das “trevas” e transferidos para o reino de seu Filho Jesus– o tema da “herança na luz”, em Cl 1,12, remete a várias passagens das Escrituras referindo­se à presença da glória divina como “luz”82.

Na mesma perícope de Cl,12­14, passa­se para o eco à aliança davídica conforme exposta em 2Sm 7,12­16. Mantém quatro palavras em comum (“πατήρ/pai”; “τὴν βασιλείαν/o reino”; “υἱός/filho), além do uso do verbo “ἀγαπάω/amar”, em 2Sm 7,18, e do substantivo “ἀγάπη/amor”, em Cl 1,1383. Com a menção do “reino do filho amado” procura­se salientar que a promessa se cumpriu parcialmente em Salomão e totalmente em Cristo84.

Na verdade, a linguagem ainda lembra o tema do êxodo visto anteriormente, pois Deus, o Pai, redimiu os colossenses da escravidão do “domínio das trevas” e transportou­os para o “reino do seu Filho amado”, usando a linguagem pactual e os títulos reais da linhagem davídica. A menção ao texto de 2Samuel poderia ter sido mediada pela tradição da Igreja, conforme atestado em Mc 1,11, Mt 3,17 e Lc 3,2285.

O “hino cristológico” de Cl 1,15­20, o mais discutido pelos comentaristas do que qualquer outra passagem da carta86, entrelaça a alusão ao “tema da sabedoria” (cf. Pr 8,22­31) com diversos ecos: retoma Gn 1,26­28 para falar de Jesus como a “imagem de Deus”, o primogênito (cf. Sl 89,27 [LXX 88,28] e Ex 4,22­23), em Cl 1,15; e a habitação de Deus em Cristo, com Sl 68,16 [LXX 67,17], ecoando em Cl 1,1987.

O “tema da sabedoria” perpassa toda a passagem88; não alude stricto sensu diretamente a Pr 8 e sim através do desenvolvimento interpretativo do primeiro século da Era Cristã: descrevendo Cristo numa linguagem tipicamente usada em relação à sabedoria, personificada como sentada à destra de Deus antes e durante o trabalho na criação89. Esta sabedoria personificada aparece, por exemplo, em Sb 1, 4­11 e 6,12 – 11,1, com atenção especial a 9,1: se Deus permanece a fonte primária da criação, “tudo criou pela sua palavra”, ou seja, pela sua Sabedoria. E é notável que em Cl 1,15­20 πᾶς seja utilizado oito vezes para descrever a natureza e atividade de Cristo90.

Embora o texto possa ser analisado sob diversos aspectos, concordamos com Aletti, ao afirmar que a grande maioria dos comentadores não tem dúvidas em falar de Cl 1,15­20 como “um hino”, inclusive com possibilidade de fontes pré­paulinas91.

Uma temática criacional, além da sapiencial, fica evidente ainda pela tradu­ ção para Pr 8,22: “YHWH me criou, princípio de seu caminho!”92 Por isso, a retomada de Gn 1,26­28 para se falar de Cristo como a imagem de Deus: ainda que reflita a cristologia do “novo Adão”, haveria a intenção de aplicar tudo o que foi dito acerca da sabedoria a Cristo, ao mesmo tempo que olhando de relance as interpretações das narrativas da criação em Gênesis93.

De fato, Filon de Alexandria descreve a sabedoria como a “imagem de Deus”, citando claramente Gn 1,26­28; e também aplica­lhe o título “primogênito”94– o que explicaria a menção de Sl 89,27 [LXX 88,28] e Ex 4,22­23. A ênfase encontra­se no status de Cristo, comparando­o ao descendente davídico na sua posição como o rei mais elevado na terra de Israel.

A temática sapiencial é concluída com o eco de Sl 68,16 [LXX 67,17], garantido pela presença comum de εὐδοκέω e κατοικέω, enfatizando que se outrora era do agrado de Deus habitar no monte Sião, agora mudou sua morada para Cristo, em toda sua plenitude95. No judaísmo antigo, a sede tradicional da sabedoria era o Templo de Jerusalém, conforme atestado em Eclo 24; portanto, em Cristo inaugura­se o templo escatológico, em que a plenitude e a sabedoria de Deus começaram a habitar96.

Em Cl 2,11 muda­se para a temática da circuncisão, com eco de Dt 30,6. Há também um desvio do padrão seguido até aqui de usar a Septuaginta bem de perto: a correspondência verbal está mais de acordo com o texto hebraico, ou através de Áquila, no uso do termo “περιτέμνω/circuncidar-se”), cuja tradução grega reproduz literalmente o termo hebraico ָמל ּו, enquanto a Septuagintaprefere usar “περικαθαρίζω/purificar-se”.

O ponto primordial é que ambos os textos compartilham a similaridade conceitual única de uma circuncisão realizada divinamente: enquanto outros textos falam da circuncisão ou incircuncisão do coração (cf. Lv 26,41; Dt 10,16; Jr 4,4; 9,25­26), somente Dt 30,6 menciona Deus diretamente efetuando uma circuncisão97. Poderia ser ainda mediado pela tradição da Igreja primitiva: o termo “ἀχειροποίητος”, que significa “não feito por mão”, aparece somente em Mc 14,58; 2Cor 5,1 e Cl 2,11, e não na Septuaginta; e o uso metafórico da circuncisão também é atestado em Fl 3,3; Rm 2,28­29 e 2Cor 3,3.

É uma difícil interpretação acerca do batismo cristão, uma vez que os gentios geralmente não reputavam a circuncisão como algo bom. O uso dessa metáfora e a mudança da segunda pessoa do plural para a primeira pessoa do plural no meio de Cl 2,13 sugere que o autor de Colossenses seja de fato judeu, enquanto seus ouvin­ tes­leitores não98.

Na interpretação judaica, gentios eram considerados impuros, enquanto os judeus eram incircuncisos no coração. Uma vez que este tipo de circuncisão era esperada para o final dos tempos99, os cristãos agora cumprem escatologicamente essa expectativa, inseridos plenamente na aliança outrora prometida com exclusividade a Israel. Isto será melhor esclarecido e complementado pelo eco de Gn 17,10­27 em Cl 2,13: a expressão “incircuncisão da carne” ainda é compartilhada por outros textos na Septuaginta, como Lv 12,3 e Jt 14,10. O ponto central é a identificação do status anterior dos leitores não judeus, cuja “incircuncisão” sinalizava sua alienação do pacto estabelecido por Deus100.

É a descrição de um estado “espiritual”, antes do que físico: em Cl 2,13 há uma inversão de palavras (“τῇ ἀκροβυστίᾳ τῆς σαρκὸς ὑμῶν/na incircuncisão da vossa carne”, ao invés de “τὴν σάρκα τῆς ἀκροβυστίας ὑμῶν/a carne da vossa incircuncisão” em Gn 17,11, por exemplo), uma sutileza aparentemente intencional que não mexe substancialmente no sentido original, mas que pretenderia realçar esse estado101.

Em Cl 2,22 numerosos estudiosos detectam um eco de Is 29,13, mediante quatro palavras em comum – “ἔνταλμα/mandamento”, “καί/.”, “διδασκαλία/ ensinamento”, “ἄνθρωπος/homem” – ainda que numa ordem ligeiramente modificada para obter um “grego melhor”: enquanto no hebraico há um verbo, permitindo a tradução “mandamento humano aprendido”, a Septuaginta usa o substantivo “διδασκαλία/ensinamento” que parece quebrar a clareza do texto102. Mais uma vez há a importância da mediação pela tradição da Igreja, uma vez que o texto de Isaías é citado formalmente em Mt 15,8­9 e Mc 8,6­7103. O contexto é o mesmo: condenar ensinamentos alheios à doutrina puramente cristã104.

O texto dos Evangelhos especifica que os ensinamentos dos fariseus são mandamentos humanos, como no contexto original isaiano em que o profeta lamenta a religião israelita não ser um conhecimento pessoal de Deus e sim um conjunto de normas convencionais aprendidas mecanicamente105. Da mesma forma, o ensinamento dos proponentes da “filosofia”: pela menção anterior em Cl 2,16 de “festas, lua nova e sábados”, fica claro que tem­se em mente a lei mosaica, aparentemente defendida por uma minoria que “julga” a maioria pela não observância desta mesma lei106. O texto isaiano estaria sendo utilizado de maneira analógica: assim como Israel no passado, os crentes­judeus estariam “idolatrando” o ritualismo judaico como conditio sine qua non para a comunidade cristã107.

Em Cl 3,1 encontra­se um eco de Sl 110,1 – o texto do Antigo Testamento mais utilizado pelos escritores do Novo Testamento108, ou “mais citado no Novo Testamento”109, sobretudo em temas cristológicos110. São numerosos os estudiosos que veem essa relação entre estes dois textos, que possuem três palavras em comum– “κάθημαι/assentar-se”, “δεξιός/direita” e “θεός/Deus”, sendo que esta última está por trás do pronome possessivo “μου/meu” do texto da Septuaginta111.

Geralmente as referências no Novo Testamento estão relacionadas à posição exaltada de Cristo no céu, como resultado da ressurreição; a noção de um governo inaugurado também se ajusta ao contexto imediato112. Uma vez que os Evangelhos mostram o próprio Senhor Jesus citando este salmo para falar de sua messianidade (cf. Mt 22,44; Mc 12,36; Lc 20,41­44), a Igreja primitiva reconhecia como uma confissão de fé fundamental113.

O pano de fundo “guerreiro” do Sl 110 fornece aos crentes colossenses a certeza de que, apesar do real perigo da “filosofia” ainda presente, a vitoriosa exaltação de Cristo à destra de Deus nos céus e a “teologia da união” entre os fiéis e Cristo garante que estes estão escondidos, ou seja, “protegidos” com Cristo em Deus114.

A referência a Gn 1,26­28 retorna pela última vez na parte parenética em Cl 3,9­10, a qual Beetham enfatiza ser não um eco, e sim uma alusão. Ambos os textos compartilham três palavras em comum – “κατ᾽ εἰκόνα/segundo a imagem” e “ἄνθρωπος/ homem” – e duas semelhanças conceituais: “ὁ Θεός/Deus” e “ἐποίησεν/fazer” de Gênesis correspondem a “τοῦ κτίσαντος αὐτόν/do que criou o mesmo” em Colossenses.

A comparação Adão­Cristo emprega a linguagem do homem “velho” e “novo” numa ótica histórico­redentiva115. O homem recriado à imagem de Deus é uma pessoa escatológica, em processo de conformação às expectativas éticas: a tensão criada entre Gn 1,26 apontando para uma único ato criativo e Colossenses abordando uma contínua renovação do homem recriado expressa a escatologia parcialmente realizada, o “já­ainda não” tipicamente paulino116.

A menção do despir­se do velho homem e vestir­se o novo pode refletir uma prática no rito batismal ou mesmo uma alusão a Gn 3,7­21117. É a “teologia da imagem da imagem”: se Cristo é a imagem de Deus conforme Cl 1,15, os crentes são recriados tendo Cristo como padrão, modelo, tipologicamente o cabeça e protótipo da nova humanidade da nova criação118.

Análise retórica bíblica semítica119

Com relação às seções da Carta aos Colossenses – segundo a Análise Retórica Bíblica Semítica –, a saudação inicial (1,1­2) pode formar junto com a oração inicial (1,3­11) uma “introdução epistolar”120, da mesma forma que a exortação final (4,2­6) pode formar, junto com a saudação final (4,7­18), uma “conclusão epistolar”. Além da equivalência lógica entre a introdução (1,1­11) e a conclusão epistolar (4,2­18), a seção “doutrinária” gira em torno do tema “obras” – mais especificamente, o que Cristo fez por nós –, enquanto a seção “parenética” gira em torno do que o cristão faz em Cristo, evidenciando a centralidade da conclusão doutrinária:






Levando em consideração as sequências, detecta­se a seguinte disposição retórica: a saudação inicial (1,1­2) contrapõe­se à saudação final (4,7­18); a exortação final (4,2­6), incluindo um apelo à perseverar em oração, corresponde à oração inicial (1,3­11); a “nova vida” em Cristo (3,5–4,1) é proporcionada pela obra de Cristo descrita em 1,12­23; a atuação dos proponentes da “heresia colossense” (2,6­19) é combatida pela obra dos apóstolo descrita em 1,24–2,5. Com a única pergunta da carta indicando a conclusão doutrinária em 2,20–3,4, temos o típico centro segundo a Análise Retórica Bíblica Semítica, sustentando a mensagem do texto tal qual a Menorah judaica121. Entretanto, isto representará uma “quebra” na sequência, “deslocando” a menção à obra da “heresia colossense” para depois da conclusão doutrinária:






Este “deslocamento” do centro retórico da posição que seria esperada reflete um “vai e vem” na carta, no qual certos termos criam “ganchos retóricos” entre as di­ versas sequências:

  1. O verbo “εὐχαριστέω/dar graças”, presente em 1,3, para marcar o começo da oração inicial, retorna em 1,12, para introduzir a obra através do Filho.

  2. Se Cristo em sua obra quer apresentar (παρίστημι) os colossenses santos (cf. 1,22), o apóstolo quer apresentar todo homem perfeito em Cristo (1,28)

  3. O mistério se manifestou (φανερόω, cf. 1,26) para que Cristo se manifeste escatologicamente (cf. 3,4); se o mistério (cf. 1,26) e os tesouros do conhecimento (cf. 2,3) estiveram ocultos (ἀποκρύπτω), agora temos acesso pela ressurreição à esta vida oculta juntamente com Cristo, em Deus (cf. 3,3).

  4. A riqueza (πλοῦτος) da glória deste mistério anunciado (cf. 1,27) contribui para a riqueza da plena convicção do entendimento (cf. 2,2).

  5. A admoestação (νουθετέω) apostólica, mediante a palavra (cf. 1,28), visa que os colossenses repliquem essa atitude mutuamente (cf. 3,16).

  6. Para tal não somente o apóstolo luta (ἀγωνίζομαι), se esforça (cf. 1,29), como também Epafras (cf. 4,12).

  7. Se o apóstolo luta pela vinculação (συμβιβάζω) em amor (cf. 2,2), combate os erros para que todo o corpo – a Igreja – esteja bem vinculada, através de suas juntas e ligamentos (σύνδεσμος) (cf. 2,9) – mas o “ligamento perfeito” não é outro senão o amor (cf. 3,14).

  8. Adverte­se contra os “elementais” (στοιχεῖα) do mundo (cf. 2,8), para os quais morreram com Cristo (cf. 2,20).

  9. O despojamento (ἀπεκδύομαι) dos principados e potestades (cf. 2,15) possibilita o despojamento do “velho homem” (cf. 3,9).

  10. A falsa humildade (ταπεινοφροσύνη: cf. 2,18.23) é contraposta à verdadeira humildade cristã (cf. 3,12).

Estes “termos”, os quais podemos chamar também de “ganchos retóricos”, são igualmente detectados nas perícopes que compõem as diferentes sequências: na relação entre a obra e a nova vida de Cristo, a redenção (1,12­14) proporciona o abandonar da velha natureza (3,5­11); o hino cristológico, enfatizando a primazia de Cristo e seu papel na “nova criação” (1,15­20)122, permite o revestimento do cristão (3,12­17); e a reconciliação explicada em 1,21­23 reflete­se nas boas relações familiares recomendadas em 3,18 – 4,1. Na contraposição entre a obra apostólica e a obra dos proponentes da “heresia colossense”, o anúncio do mistério em 1,24­29 é explicado como a “nova circuncisão” em 2,6­15 e a “luta” pelos colossenses anunciada em 2,1­5 é contra a “velha circuncisão” descrita em 2,16­19.

Tabelando as alusões e ecos nas diferentes perícopes identificadas na disposição retórica, observa­se a seguinte distribuição:






O tema veterotestamentário mais explorado é o criacional: das onze alusões e/ ou ecos estudados por Beetham, quatro tocam no assunto: Gn 1,26­18 em Cl 1,3­11. 15­20; 3,5­11 e Is 11,2.9 em Cl 1,3­11. O recurso retórico utilizado no eco de Gn 1,28 em Cl 1,6.10 busca realçar o crescimento exponencial do Evangelho através do mundo e uma tipologia para a nova criação inaugurada em Cristo (cf. Gl 6,15; 2 Cor 5,17)123.

Além disso, a correspondência confirma a ligação retórica detectada supra: a oração apostólica (Cl 1,3­11) para que os colossenses sejam plenos do conhecimento da obra de Cristo (Cl 1,15­20) concretiza­se na vida cotidiana destes (Cl 3,5­11). O “velho homem” em Cl 3,9 é o “corpo de carne” de Cl 2,11, o corpo herdado de Adão, removido pela circuncisão divina124. Esta circuncisão ocorre metaforicamente no momento de crer em Cristo, algo realizado definitivamente – algo indicado pelo uso do verbo περιτέμνω no primeiro aoristo da voz passiva125.

Deste modo, o eco de Is 11,2 em Cl 1,9, com sua exortação aos colossenses para serem cheios do conhecimento de Deus, visa encorajá­los a resistir a qualquer tentação de sucumbir diante da “filosofia” (Cl 2,2­4.8), algo possível pela sua união com Cristo, fonte maior de sabedoria, mas que pede sempre obediência ao projeto do Pai126. Jesus é o cabeça, e a Igreja seu corpo (Cl 1,18.24; 2,19): é mediante esta conexão que os colossenses são preenchidos pela sua “plenitude” (Cl 2,9)127. O hápax legomenon θεότης, literalmente “deidade”, denota a “totalidade absoluta da essência divina”, um recurso retórico que visa eliminar “as pretensões dos falsos mestres que ensinavam a buscar a plenitude fora de Cristo”128.

O uso do Sl 68 em Cl 1,19 e de “πλήρωμα/plenitude”, tanto neste quanto em 2,9, ajuda a esclarecer este último: se a divindade habita no corpo de Cristo – não meramente antes da encarnação, mas acima de tudo no homem que morreu em uma cruz – a Igreja, que é “o corpo”, mediante sua união orgânica com o cabeça, a saber Cristo, está plenificada com a presença divina (cf. Cl 1,18.24; 2,19)129. Como recurso retórico possibilita­se reforçar a confiança dos colossenses na suficiência e preeminência de Cristo como revelação de Deus, e sua superioridade em relação à falsa “filosofia”130. Obviamente não há um menosprezo ao conhecimento intelectual investigativo: o problema não é a filosofia em si, e sim à filosofia contrária ou não conforme com Cristo131.

O contexto de Dt 30,6 (30,1­10) precede a perícope de 30,11­20, a qual pode ser compreendida como o “clímax retórico” de todo o livro de Deuteronômio pela sua ênfase na chamada à uma decisão, algo importante para o Pentateuco como um todo. A chamada à “nova circuncisão”, em Cl 2,6­15, portanto, é uma decisão premente, a qual antecipa o “centro retórico” que inicia em Cl 2,20­23, no qual o uso de Is 29,13 é contundente contra os proponentes da “filosofia” na Carta aos Colossenses: as estipulações específicas do pacto mosaico são meros “preceitos humanos” se impostas sobre os membros da “nova aliança”, e não devem ser “guardadas” coercitivamente132. A expressão “ὁ συλαγωγῶν/o que escraviza”, em 2,8, fornece uma “dramática imagem” do poder desses que propagam os falsos ensinos, e Pao vê um “trocadilho desdenhoso” com a palavra “συναγωγή/sinagoga133 – o que apontaria para um possível recurso retórico.

Portanto, em 3,1­4 o recurso retórico procura identificar Cristo com o prometido rei davídico de Sl 110, enquanto os inimigos deste mesmo salmo são interpretados como representados por todos os seres espirituais demoníacos que suscitam filosofias enganadoras que rivalizam com a genuína mensagem do Evangelho, o que está de acordo com a menção a 2Sm 7, feita em Cl 1,13.

Entretanto, aqui em Cl 3,1­4 o tom é mais escatológico, enfatizando o cumprimento final e definitivo do que foi anunciado anteriormente mediante 2Sm 7134. A “centralidade” retórica corresponde ao “fato central histórico da fé e esperança cristãs”: Cristo ressuscitado e sentado à direita do Pai135. Isso se dá pelo fato de que em Paulo o uso da retórica “é inseparável da construção e da progressão de seus pensamentos”136.

As duas alusões encontradas por Beetham – Pr 8,22­31 em Cl 1,15­20 (para Beale, o “tema da sabedoria”) e Gn 1,26­28 em Cl 3,9­10 – providenciam uma “moldura” que confirma a disposição retórica encontrada para as seções, pois Gn 1,26­28 aparece como eco ainda em Cl 1,15­20. Se o termo “ἀπεκδυσάμενοι/ tendo-vos despojados”, em 3,9, é entendido por muitos como um particípio imperativo, segundo Pao é melhor compreendê­lo como particípio causal adverbial, providenciando a “base” para o que foi dito previamente137. A temática “criacional” mais uma vez aponta para a centralidade de Is 29,13 e Sl 110,1 na abordagem acerca da “nova circuncisão”.






Sendo detectadas tantas alusões e ecos do Antigo Testamento, isto aponta para uma identificação do caráter judaico da “filosofia” enganadora, o que faz entender que os “oponentes” são judaizantes ao extremo, no mínimo138. Isto explicaria a ausência de citações explícitas do Antigo Testamento como um recurso retórico, uma vez que o autor não desejaria argumentar como um escriba utilizando a Torah, a qual poderia estar sendo usada contra o cristianismo139.

É significativo que a única passagem do Antigo Testamento utilizada possivelmente mediante o texto hebraico, e não pela Septuaginta, seja justamente Dt 30,6: o ritual da circuncisão, tão central no pensamento judaico, obtém sua real ressignificação somente com Cristo140. Por isso, embora Cl 3,18–4,1 seja conhecido desde Lutero como Haustafel, um “código doméstico” tomado de empréstimo do contexto da cultura helênica, em especial do estoicismo, mais recentemente pesquisadores salientam como fonte o judaísmo helenista141, e as referências encontradas por Sumney (cf. tabela supra) parecem confirmar esse dado.

Entretanto, um importante recurso retórico subjaz onde na Carta aos Colossenses há ausência total, seja de citações, alusões ou ecos. Sumney identifica que seria na obra apostólica em Cl 1,24–2,5, onde se esperaria algum recurso à tradição veterotestamentária do sofrimento dos profetas que proclamam a palavra divina para ilustrar o sofrimento apostólico pela comunidade – o autor de Colossenses parece analisar que líderes ou profetas de Israel não forneceriam uma “boa recomendação”142.

Mas aqui Beale identifica uma alusão à Dn 2 através da palavra μυστήριον, a qual é utilizada para mostrar que a profecia do Antigo Testamento está começando a se cumprir, e que esse cumprimento não era previsto pela perspectiva do Antigo Testamento143. Este mistério, outrora escondido, agora foi revelado: a participação dos gentios na riqueza da glória, ou seja, os privilégios da aliança salvífica outrora exclusiva de Israel (cf. Cl 1,26­27). Algo que não foi anunciado ou explicado anteriormente pelos profetas e pelos escritos bíblicos, por ser algo que escapa à revelação, que a supera144 Este mistério, que supera tudo o que poderia ser dito, é a reconciliação, mencionada em Cl 1,21­23 – a passagem que de fato não possui nenhuma alusão ou eco identificado pelos estudiosos mencionados nesse artigo.

Conclusão

Duas metodologias tão distintas quanto o Uso do Antigo pelo Novo Testamento e a Análise Retórica Bíblica Semítica foram entrelaçadas para evidenciar que a ausência de citações veterotestamentárias foi um recurso retórico utilizado pelo autor, no qual as alusões . ecos são distribuídos não de forma aleatória e sim uniforme, para brindar o leitor com um magnífico texto unindo cristologia, eclesiologia e uso do Antigo Testamento. Um método complementou e confirmou o outro, concedendo mais argumentos a Beale em detrimento de Foster na polêmica levantada.

Se a conjugação das metodologias não logrou êxito em apontar se de fato a carta é ou não autenticamente paulina, e não era esse o objetivo, sublinhou um dado: se a carta é da lavra de um paulinista, este soube magistralmente emular os recursos retóricos usados por Paulo nas suas cartas indisputadas. Mas esta mesma conjugação enfatizou como a temática da criação, marcada pelas alusões detectadas por Beale, proporcionaram uma belíssima moldura literária para o tema central da carta: a “nova circuncisão”.

Se o estudo apontou para a total ausência de referências veterotestamentárias na perícope acerca da reconciliação, sua possível ligação com o tema do mistério detectado por Beale na sequência da obra apostólica aponta para o caráter único desse evento, sem paralelos no Antigo Testamento. Algo que superou todas as expectativas. Ou não: haveria talvez um paralelo, usando a terminologia proposta por Beetham, de uma temática já insinuada nos livros de Rute e Jonas? Como diria Hays, qual seria o “volume” dessa intertextualidade? De qualquer forma, a Carta aos Colossenses mostra que apesar do ataque contundente às práticas judaicas impostas, isto não pressupõe nenhum “antissemitismo” de qualquer espécie, mas sim a definitiva reconciliação de todos num só corpo, tendo Cristo como cabeça. Uma contundente mensagem contra o preconceito e a intolerância tão em voga nos tempos hodiernos.

Referências

Aletti, Jean­Noël. Lettera ai Colessesi. Bologna: EDB, 1994.

_______. “Uma retórica paulina: construção e comunicação de um pensamento”. En Paulo, uma teologia em construção, Vários autores, 51­71. São Paulo: Loyola, 2011.

Barth, Markus; Helmut Blanke; e Astrid B. Beck. Colossians. A New Translation with Introduction and Commentary. New Haven­London: Yale University Press, 2008.

Beale, Gregory K. “Colossenses”. En Comentário do uso do Antigo no Novo Testamento, organizado por G. K. Beale e Donald A. Carson, 1039­1075. São Paulo: Vida Nova, 2014.

_______. Manual do uso do Antigo Testamento no Novo Testamento. Exegese e interpretação. São Paulo: Vida Nova, 2013.

_______. “The Old Testament in Colossians: A Response to Paul Foster”. Journal for the Study of the New Testament 41/2 (2018): 261­274.

Beetham, Cristopher A. Echoes of Scripture in the Letter of Paul to the Colossians. Leiden­Boston: Brill, 2008.

Belli, Filippo; Ignacio Carbajosa; Carlos Jódar Estrella; e Luis Sánchez Navarro. Vetus in Novo. El recurso a la escritura en el Nuevo Testamento. Madrid: Encuentro, 2006.

Boring, M. Eugene. Introdução ao Novo Testamento. História, literatura e teologia. Vol. 1. Quest.es introductórias do Novo Testamento e escritos paulinos. São Paulo: Paulus, 2016.

Bujard, Walter. Stilanalytische Untersuchungen zum Kolosserbrief: als Beitrag zur Methodik von Sprachvergleichen. Göttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 1973.

Buscemi, A. M.. Una sinfonia. Gli inni di Paolo a Cristo Signore. Jerusalem: Franciscan Printing Press, 2000.

Clark, Bruce T. Completing Christ’s Afflictions: Christ, Paul, and the Reconciliation of All Things. Tübingen: Mohr Siebeck, 2015.

Copenhaver, Adam. Reconstructing the Historical Background of Paul’s Rhetoric in the Letter to the Colossians. London: Bloomsbury T&T Clark, 2018.

Del Páramo, Severiano. “Las citas de los Salmos en San Pablo”. En Analecta biblica 17-18. Studiorum Paulinorum Congressus Internatinalis Catholicus 1961, organizado por Pontificio Instituto Bíblico, 229­241. Roma: Pontificio Instituto Bíblico, 1963.

Dunn, James D. G. The Epistles to the Colossians and to Philemon. A Commentary on the Greek Text. Grand Rapids (MI)­Carlisle: William B. Eerdmans Publishing­ Paternoster Press, 1996.

Fee, Gordon D. “Old Testament Intertextuality in Colossians: Reflections on Pauline Christology and Gentile Inclusion in God’s Story”. En History and Exegesis. New Testament Essays in Honor of Dr. E. Earle Ellis for His 80th Birthday, organizado por S.­W. Son, 201­221. New York: T&T Clark, 2006.

Foster, Paul. “Critiquing Certain Aspects of Recent Scholarly Trends in the Study of the Jewish Scriptures in the New Testament”. Journal for the Study of the New Testament 38/1 (2015): 96­111.

Frank, Nicole. Der Kolosserbrief im Kontext des paulinischen Erbes: eine intertextuelle Studie zur Auslegung und Fortschreibung der Paulustradition. Tübingen: Mohr Siebeck, 2009.

Gonzaga, Waldecir. Compêndio do Cânon Bíblico. Listas dos Catálogos Bíblicos: Antigo Testamento, Novo Testamento e Apócrifos. Petrópolis RJ­Rio de Janeiro: Editora PUC­ Vozes, 2019.

_______. “O Corpus Paulinumno Cânon do Novo Testamento”. Atualidade Teológica 54 (2001): 19­41.

_______. “O Salmo 150 à luz da Análise Retórica Bíblica Semítica”. Revista Brasileira de Interpretação Bíblica 1/2 (2018): 155­170.

Hays, Richard B. Echoes of Scripture in the Letters of Paul. New Haven­London: Yale University Press, 1989.

Kalvesmaki, Joel. Old Testament Quotations in the New Testament. Ann Arbor (MI): Cushing­Malloy Inc., 1967.

Kittel, Rudolf (ed.). Biblia Hebraica Stuttgartensia. Editio quarta emendata opera H. P. Rüger. Stuttgart: Deutsche Bibelgesellschaft, 1997.

Lohse, Eduard. Colossians and Philemon. Philadelphia: Fortress Press, 1971.

Meynet, Roland. L’Analise Retorica. Brescia: Queriniana, 1992.

________. Trattato di Retorica Biblica. Bologna: EDB, 2008.

Nestle­Aland. Novum Testamentum Graece (ed. 27). Stuttgart: Deutsche Bibelgesellchaft, 1993.

_______. Novum Testamentum Graece (ed. 28). Stuttgart: Deutsche Bibelgesellchaft, 2012.

O’Brien, Peter T. “Cartas aos Colossenses”. En Dicionário de Paulo e suas Cartas (2a. ed.), organizado por Gerald F. Hawthorne, Ralph P. Martin e Daniel G. Reid, 247­255. São Paulo: Vida Nova­Paulus­Loyola, 2008.

_______. Colossians, Philemon. Dallas (TX): Word Inc., 1998.

Pao, David W. Colossians and Philemon. Grand Rapids (MI): Zondervan, 2012.

Paulinas. A Bíblia TEB. Nova edição revista e corrigida. São Paulo: Loyola, 1995.

Paulus Editora. Bíblia de Jerusalém. Nova ed. rev e ampl. São Paulo: Paulus, 2019.

Pérez Millos, Samuel. Comentario exegético al texto griego del Nuevo Testamento. Colosenses. Barcelona: Clie, 2015.

Proença, Eduardo. “O Uso do Antigo Testamento pelo Novo Testamento”. En O uso que o Novo Testamento faz do Antigo Testamento. Bíblia: introdução e hermenêutica, editado por Eduardo Proença, 83­103. São Paulo: Fonte Editorial, 2009.

Rahlfs, Alfred, e Robert Hanhart (eds.). Septuaginta. Stuttgart: Deutsche Bibelgesellschaft, 2006.

Robertson, A. W. El Antiguo Testamento en el Nuevo. Buenos Aires­Grand Rapids: Nueva Creación­William B. Eerdmans Publishing Co., 1996.

Silva, Moisés. “Antigo Testamento em Paulo”. En Dicionário de Paulo e suas Cartas (2a. ed.), organizado por por Gerald F. Hawthorne, Ralph P. Martin e Daniel G. Reid, 76­92. São Paulo: Vida Nova; Paulus; Edições Loyola, 2008.

Schenk, Wolfgang, “Der Kolosserbrief in der neueren Forschung (1945­1985)”. Auftieg und Niedergang der Römischen Welt 2.25.4 (1987): 3327­3365.

Schweizer, Eduard. La Carta a los Colosenses. Salamanca: Sígueme, 1987.

Standhartinger, Angela. Studien zur Entstehungsgeschichte und Intention des Kolosserbriefs. Leiden: Brill, 1999.

Sumney, Jerry L. “Writing ‘In the Image’ of Scripture: The Form and Function of References to Scripture in Colossians”. En Paul and Scripture: Extending the Conversation, organizado por Cristopher D. Stanley, 185­229. Atlanta (GA): Society of Biblical Literature, 2012.

Notas

* Articulo de investigação

1 Gonzaga, “O Corpus Paulinum no Cânon do Novo Testamento”, 23.

2 Hays, Echoes of Scripture in the Letters of Paul.

3 Beetham, Echoes of Scripture in the Letter of Paul to the Colossians, 2­5.

4 Proença, “O Uso do Antigo Testamento pelo Novo Testamento”, 85.

5 Ibid., 85­86.

6 Silva, “Antigo Testamento em Paulo”, 76.

7 Meynet, Trattato di Retorica Bíblica, 132­209; Meynet, L’Analise Retorica, 159­249. Nestas duas obras, Meynet explica o Método da Análise Retórica Bíblica Semítica, fazendo uma exposição sobre os níveis de composição de um texto e os frutos da aplicação do método em cada um dos níveis de um texto ou livro bíblico: 1. Níveis ou figuras de composição de um texto: (1.1) membro (1.2) segmento; (1.3) trecho; (1.4) parte; (1.5) perícope ou passagem; (1.6) sequência; (1.7) seção; 8) livro. 2. Frutos da aplicação da Análise Retórica: (2.1) delimitar as unidades literárias e textuais; (2.2) auxiliar na interpretação; (2.3) ler junto as diversas perícopes; (2.4) auxiliar na tradução do texto; (2.5) ajudar na critica textus; (2.6) fornecer procedimentos e critérios científicos – de tipo linguístico – para a delimitação das unidades literárias aos diversos níveis da organização do texto.

8 Gonzaga, “O Salmo 150 à luz da Análise Retórica Bíblica Semítica”, 159­160.

9 Aletti, “Uma retórica paulina: construção e comunicação de um pensamento”, 51.

10 Hays, Echoes of Scripture in the Letters of Paul, 6­9.

11 Rahlfs e Hanhart (eds.), Septuaginta.

12 Hays, Echoes of Scripture in the Letters of Paul, xi.

13 Segundo Frank, em sua obra Der Kolosserbrief im Kontext des paulinischen Erbes: eine intertextuelle Studie zur Auslegung und Fortschreibung der Paulustradition, 327­369, a Carta aos Colossenses, tomada como o mais antigo dos textos pseudoepígrafos paulinos, também chamados de deuteropaulinos, é um testemunho bíblico estruturado essencialmente de forma intertextual, onde ele examina as estratégias e mecanismos intertextuais que são eficazes, enquanto meios literários, para a transmissão da teologia paulina. Nesta carta, segundo este autor, o recurso ao conteúdo, à linguagem e aos demais dados que encontramos nas cartas autenticamente paulinas, por ele chamadas de protopaulinas, como a própria teologia paulina, constitui um pré­requisito a partir do qual o autor da mesma possa ter acesso e a transmitir a autêntica tradição paulina, que, por sua vez, está sempre sujeita a uma reinterpretação, onde ele elabora e transmite a herança paulina. Neste sentido, Frank defende que a Carta aos Colossenses, embora não sendo autenticamente paulina, está mergulhada no contexto da herança paulina, bebe da intertextualidade das cartas protopaulinas e, mais ainda, ela leva adiante a tradição paulina.

14 Hays, Echoes of Scripture in the Letters of Paul., 15­19.

15 Ibid., 20­24.

16 Ibid., 29­32.

17 Beale, Manual do uso do Antigo Testamento no Novo Testamento. Exegese e interpretação, 27.

18 Ibid., 42.

19 Ibid., 53.

20 Ibid., 55.

21 Ibid., 56.

22 Beale, Manual do uso do Antigo Testamento no Novo Testamento. Exegese e interpretação, 68­69.

23 Beetham, Echoes of Scripture in the Letter of Paul to the Colossians, 15­17.

24 Ibid., 17­20.

25 Ibid., 20­24.

26 Beetham, Echoes of Scripture in the Letter of Paul to the Colossians, 24; cf. também Sumney, “Writing ‘In the Image’ of Scripture: The Form and Function of References to Scripture in Colossians”, 216­217.

27 Beetham, Echoes of Scripture in the Letter of Paul to the Colossians, 23.

28 O’Brien, Colossians, Philemon, xli.

29 Schweizer, La Carta a los Colosenses, 22.

30 Aletti, Lettera ai Colessesi, 26.

31 Gonzaga, Compêndio do Cânon Bíblico. Listas dos Catálogos Bíblicos: Antigo Testamento, Novo Testamento e Apócrifos, 406­407.

32 Beale, “Colossenses”, 1039.

33 Beetham, Echoes of Scripture in the Letter of Paul to the Colossians, 9.

34 O’Brien, Carta aos Colossenses, 251.

35 Pérez Millos, Comentario exegético al texto griego del Nuevo Testamento. Colosenses, 217.

36 Dunn, The Epistles to the Colossians and to Philemon. A Commentary on the Greek Text, 18; 38.

37 Pao, Colossians and Philemon, 23.

38 Boring, Introdução ao Novo Testamento. História, literatura e teologia. Vol. 1. Questões introductórias do Novo Testamento e escritos paulinos, 558­560

39 Ibid., 555­557; 565.

40 Aletti, Lettera ai Colessesi, 24. Para maiores detalhes sobre as pesquisas referentes à Carta aos Colossenses, ainda que não tão atual, pois foi publicada em 1987 e traz os dados das pesquisas entre 1945­1985, mas com bom status quaestionis sobre a temática, indicamos o ensaio de Schenk, “Der Kolosserbrief in der neueren Forschung (1945­1985)”, 3327­3365.

41 Gonzaga, “O Corpus Paulinum no Cânon do Novo Testamento”, 22.

42 Schweizer, La Carta a los Colosenses, 148.

43 Boring, Introdução ao Novo Testamento. História, literatura e teologia. Vol. 1. Questões introductórias do Novo Testamento e escritos paulinos, 563­564.

44 Dunn, The Epistles to the Colossians and to Philemon. A Commentary on the Greek Text, 25.

45 Ibid., 27; O’Brien, Colossians, Philemon, xxxiii.

46 Barth, Blanke e Beck, Colossians. A New Translation with Introduction and Commentary, 33­34.

47 O’Brien, Colossians, Philemon, xxxiv.

48 Dunn, The Epistles to the Colossians and to Philemon. A Commentary on the Greek Text, 29; 33­34.

49 Lohse, Colossians and Philemon, 120.

50 Dunn, The Epistles to the Colossians and to Philemon. A Commentary on the Greek Text, 28.

51 Beale, “Colossenses”, 1072.

52 Nestle­Aland, Novum Testamentum Graece (ed. 28).

53 Quando tomamos uma Bíblia de Jerusalém em mãos e percorremos os olhos pelas notas de fontes do uso do Antigo Testamento e de paralelos do Novo Testamento na Carta aos Colossenses, é interessante observar que a equipe de biblistas que trabalhou na tradução da mesma, ao colocar possíveis textos usados como fontes, cita alguns textos do Antigo Testamento, reconhecendo assim a possiblidade de pelo menos alusões indiretas às fontes veterotestamentárias, nas seguintes relações: Sb 7,26 em Cl 1,15­20; Pr 8,22 em Cl 1,18; Is 45,3 e Pr 2,4­5 em Cl 2,3; Jr 4,4 em Cl 2,11; Is 29,13 em Cl 2,22; Sl 110,1 em Cl 3,1; Gn 1,26­27; 11,1 em Cl 3,9; e Sb 8,9 em Cl 4,5­6. A Bíblia TEB, por sua vez, reconhece menos relações entre o Antigo Testamento e a Carta aos Colossenses que a Bíblia de Jerusalém. Enquanto a Bíblia de Jerusalém reconhece todas as acima mencionadas, a . Bíblia TEB reconhece apenas as seguintes: Is 45,3; Pr 2,2 em Cl 2,3; Is 229,13 (LXX) em Cl 2,22; e Sl 110,1 em Cl 3,1.

54 Beetham, Echoes of Scripture in the Letter of Paul to the Colossians, 3­6.

55 Fee, “Old Testament Intertextuality in Colossians: Reflections on Pauline Christology and Gentile Inclusion in God’s Story”, 201­221.

56 Beale, “Colossenses”, 1039.

57 Sumney, “Writing ‘In the Image’ of Scripture: The Form and Function of References to Scripture in Colossians”, 185­229.

58 Robertson, El Antiguo Testamento en el Nuevo, 175.

59 Kalvesmaki, Old Testament Quotations in the New Testament, 54.

60 Belli, Carbajosa, Jódar Estrella, Sánchez Navarro, Vetus in Novo. El recurso a la escritura en el Nuevo Testamento, 202­203.

61 Foster, “Critiquing Certain Aspects of Recent Scholarly Trends in the Study of the Jewish Scriptures in the New Testament”, 104­107.

62 Beale, “The Old Testament in Colossians: A Response to Paul Foster”, 265­270. Para uma análise detalhada sobre a linguagem da Carta aos Colossenses, indicamos a obra Bujard, Stilanalytische Untersuchungen zum Kolosserbrief: als Beitrag zur Methodik von Sprachvergleichen, onde o autor apresenta um estudo e análise do estilo linguístico presente em Colossenses, realmente oferecendo uma grande contribuição à metodologia de comparação de idiomas. O autor demonstra que, embora a Carta aos Colossenses seja tida como deuteropaulina, ela contém numerosos exemplos de vocabulário e fraseologias típicos de cartas paulinas autênticas. Porém, o autor reforça que uma coisa que impressiona muito nesta carta é a diferença entre a linguagem de Paulo, em suas cartas autênticas, e a de Colossenses, inclusive com um alto número de hápax legomena.

63 Foster, “Critiquing Certain Aspects of Recent Scholarly Trends in the Study of the Jewish Scriptures in the New Testament”, 106.

64 Nestle­Aland, Novum Testamentum Graece (ed. 27).

65 Segundo Buscemi, Una Sinfonia. Gli Inni di Paolo a Cristo Signore, 56­60, existe uma ligação muito profunda entre os textos sapienciais e o hino de Cl 1,15­21. Ele elenca três: Pr 8,22­31; Eclo 24,3­12 e Sb 7,22–8,1. Buscemi traça um paralelo temático entre o hino paulino e estes três textos sapienciais, realçando seus vários aspectos que ele vê como confluentes.

66 Silva, “Antigo Testamento em Paulo”, 76.

67 Ibid., 78­79.

68 Schweizer, La Carta a los Colosenses, 41.

69 Kittel (ed.), Biblia Hebraica Stuttgartensia.

70 Beale, “Colossenses”, 1040­1041; Beetham, Echoes of Scripture in the Letter of Paul to the Colossians, 41.

71 Sumney, “Writing ‘In the Image’ of Scripture: The Form and Function of References to Scripture in Colossians”, 190. Sobre a tradição da Igreja dos colossenses, inclusive oral, indicamos a obra Standhartinger, Studien zur Entstehungsgeschichte und Intention des Kolosserbriefs, onde a autora realiza um estudo sobre as origens e intenções da Carta aos Colossenses, apresentando um estudo sobre a razão e a intenção da mesma (cf. 1999, 16­26), e, em seguida, levanta a temática da tradição oral paulina, tocando no tema em Paulo (seu epistolário) e na Carta aos Colossenses, ou seja, na tradição da comunidade dos colossenses, que ela nos ajuda a perceber de forma magistral (cf. 1999, 102­116).

72 Beale, “Colossenses”, 1042­1044.

73 Beetham, Echoes of Scripture in the Letter of Paul to the Colossians, 61.

74 Beale, “Colossenses”, 1046.

75 Beetham, Echoes of Scripture in the Letter of Paul to the Colossians, 65­66.

76 Beale, “Colossenses”, 1047.

77 Sumney, “Writing ‘In the Image’ of Scripture: The Form and Function of References to Scripture in Colossians”, 192.

78 Beale, “Colossenses”, 1048.

79 Beetham, Echoes of Scripture in the Letter of Paul to the Colossians, 81.

80 Sumney, “Writing ‘In the Image’ of Scripture: The Form and Function of References to Scripture in Colossians”, 194.

81 Beale, “Colossenses”, 1049.

82 Beetham, Echoes of Scripture in the Letter of Paul to the Colossians, 85­92.

83 Ibid., 97.

84 Beale, “Colossenses”, 1050.

85 Beetham, Echoes of Scripture in the Letter of Paul to the Colossians, 108­110.

86 Beale, “Colossenses”, 1051.

87 Sumney, “Writing ‘In the Image’ of Scripture: The Form and Function of References to Scripture in Colossians”, 197; Schweizer, La Carta a los Colosenses, 65.

88 Buscemi, Una Sinfonia. Gli Inni di Paolo a Cristo Signore, 56.

89 Beetham, Echoes of Scripture in the Letter of Paul to the Colossians, 113­114.

90 Ibid., 120­121.

91 Aletti, Lettera ai Colessesi, 84.

92 Beetham, Echoes of Scripture in the Letter of Paul to the Colossians, 115­117.

93 Sumney, “Writing ‘In the Image’ of Scripture: The Form and Function of References to Scripture in Colossians”, 198.

94 Beetham, Echoes of Scripture in the Letter of Paul to the Colossians, 125­126.

95 Sumney, “Writing ‘In the Image’ of Scripture: The Form and Function of References to Scripture in Colossians”, 199­200.

96 Beale, “Colossenses”, 1058.

97 Beetham, Echoes of Scripture in the Letter of Paul to the Colossians, 157.

98 Sumney, “Writing ‘In the Image’ of Scripture: The Form and Function of References to Scripture in Colossians”, 201­202.

99 Beetham, Echoes of Scripture in the Letter of Paul to the Colossians, 170­171.

100 Sumney, “Writing ‘In the Image’ of Scripture: The Form and Function of References to Scripture in Colossians”, 203­204.

101 Beetham, Echoes of Scripture in the Letter of Paul to the Colossians, 189.

102 Ibid., 193.

103 Schweizer, La Carta a los Colosenses, 145.

104 Sumney, “Writing ‘In the Image’ of Scripture: The Form and Function of References to Scripture in Colossians”, 207­208.

105 O’Brien, Colossians, Philemon, 151.

106 Beetham, Echoes of Scripture in the Letter of Paul to the Colossians, 197­198.

107 Beale, “Colossenses”, 1064

108 Sumney, “Writing ‘In the Image’ of Scripture: The Form and Function of References to Scripture in Colossians”, 209; Proença, “O Uso do Antigo Testamento pelo Novo Testamento”, 86.

109 Schweizer, La Carta a los Colosenses, 151.

110 Del Páramo, “Las citas de los Salmos en San Pablo”, 231.

111 Beetham, Echoes of Scripture in the Letter of Paul to the Colossians, 219.

112 Beale, “Colossenses”, 1067.

113 Sumney, “Writing ‘In the Image’ of Scripture: The Form and Function of References to Scripture in Colossians”, 210.

114 Beetham, Echoes of Scripture in the Letter of Paul to the Colossians, 227.

115 Ibid., 231.

116 Sumney, “Writing ‘In the Image’ of Scripture: The Form and Function of References to Scripture in Colossians”, 210­212.

117 Beale, “Colossenses”, 1069­1070.

118 Beetham, Echoes of Scripture in the Letter of Paul to the Colossians, 242­244.

119 Para uma análise do ponto de vista do “criticismo retórico”, com pressupostos metodológicos diferentes daqueles colocados por Roland Meynet, indicamos conferir o texto da tese de Copenhaver, Reconstructing the Historical Background of Paul’s Rhetoric in the Letter to the Colossians, 81­143, onde o autor tenta reconstruir um panorama da retórica de Paulo na Carta aos Colossenses, diante do contexto em que o apóstolo estava vivendo ao escrever esta sua carta aos cristãos de Colossos, como que numa “retórica de oposição”, contrastando as práticas que eles tinham com as de Cristo, que ele estava anunciando a eles, inclusive com várias admoestações e advertências, visto que ele tinha que lidar contemporaneamente com o judaísmo e com religiões pagãs. Diante de tudo isso, Copenhaver busca demonstrar que a Carta aos Colossenes assume, justamente, uma nova relação diante deste contexto histórico que Paulo encontra na comunidade e história de Colossos.

120 Boring, Introdução ao Novo Testamento. História, literatura e teologia. Vol. 1. Questões introductórias do Novo Testamento e escritos paulinos, que mantém 4,2­6 fora da conclusão epistolar.

121 Gonzaga, “O Salmo 150 à luz da Análise Retórica Bíblica Semítica”, 159­161.

122 Schweizer, La Carta a los Colosenses, 56­57.

123 Beetham, Echoes of Scripture in the Letter of Paul to the Colossians, 59; 247.

124 Ibid., 241.

125 Pérez Millos, Comentario exegético al texto griego del Nuevo Testamento. Colosenses, 217.

126 Schweizer, La Carta a los Colosenses, 44.

127 Beetham, Echoes of Scripture in the Letter of Paul to the Colossians, 72; 78.

128 Pérez Millos, Comentario Exegético al Texto Griego del Nuevo Testamento. Colosenses, 213.

129 Schweizer, La Carta a los Colosenses, 73.

130 Beetham, Echoes of Scripture in the Letter of Paul to the Colossians, 152­156.

131 Pérez Millos, Comentario Exegético al Texto Griego del Nuevo Testamento. Colosenses, 213­214.

132 Beetham, Echoes of Scripture in the Letter of Paul to the Colossians, 158; 216.

133 Pao, Colossians and Philemon, 158.

134 Beetham, Echoes of Scripture in the Letter of Paul to the Colossians, 230.

135 Del Páramo, “Las citas de los Salmos en San Pablo”, 232.

136 Aletti, “Uma retórica paulina: construção e comunicação de um pensamento”, 65.

137 Pao, Colossians and Philemon, 225.

138 Beetham, Echoes of Scripture in the Letter of Paul to the Colossians, 250.

139 Barth, Blanke e Beck, Colossians. A New Translation with Introduction and Commentary, 66.

140 Cf. tabela em Beetham, Echoes of Scripture in the Letter of Paul to the Colossians, 275.

141 O’Brien, Colossians, Philemon, 214­217.

142 Sumney, “Writing ‘In the Image’ of Scripture: The Form and Function of References to Scripture in Colossians”, 219. Para um histórico acerca da interpretação de Cl 1,24 como um “versículo sem contexto”, ver o texto da Tese de Clark, Completing Christ’s Afflictions: Christ, Paul, and the Reconciliation of All Things, 2­8, onde o autor faz uma análise do referido versículo indicando a dificuldade de intepretação dentro do contexto da perícope desta carta deuteropaulina, indicando que Cl 1,24 estaria fora de contexto.

143 Beale, “Colossenses”, 1059.

144 Belli, Carbajosa, Jódar Estrella e Sánchez Navarro, Vetus in Novo. El recurso a la escritura en el Nuevo Testamento, 203.

Autor notes

a Autor de correspondencia. Correio eletrônico: waldecir@hotmail.com

Informação adicional

Como citar: Gonzaga, Waldecir, y Doaldo Ferreira Belem. “O Uso Retórico do Antigo Testamento na Carta aos Colossenses”. Theologica Xaveriana (2021): 1­35. https://doi.org/10.11144/javeriana.tx71.uratcc

Contexto
Descargar
Todas