O uso de Daniel na composição do modelo de revelação no Apocalipse de João *

El uso de Daniel en la composición del modelo de revelación em el Apocalipsis de Juan

Waldecir Gonzaga , Leandro dos Santos Ribeiro

O uso de Daniel na composição do modelo de revelação no Apocalipse de João *

Theologica Xaveriana, vol. 74, 2024

Pontificia Universidad Javeriana

Waldecir Gonzaga a

Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Brasil


Leandro dos Santos Ribeiro

Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Brasil


Recepção: 04 Dezembro 2022

Aprovação: 28 Junho 2023

Resumo: O presente artigo analisa o uso do livro de Daniel na composição de um mode lo revelacional trinitário no Apocalipse. Para a constatação do uso do Antigo Testamento no Novo Testamento, são utilizados os critérios desenvolvidos por Beale e por Hays, em diálogo com as discussões acerca do uso de Daniel em Apocalipse pelo próprio Beale e por Moyise. A partir disso, busca-se entender como Apocalipse empregou as alusões aos textos daniélicos como estruturas básicas para a concepção de seu modelo apocalíptico trinitário.

De um modo próprio, percebe-se como as alusões extraídas de Daniel esboçam como as pessoas do Deus Uno e Trino relacionam-se umas com as outras no processo de autorrevelação divina, particularmente em como Deus Pai revela mistérios apocalípticos; concede iluminação, pelo seu Espírito, para a compreensão de tais mistérios e os executa através do Filho do Homem. Algumas partes de Daniel são notoriamente complexas, até enigmáticas, mas com todos os elementos necessários para um modelo trinitário revelacional, e são precisamente esses elementos de Daniel que o autor de Apocalipse faz uso, desenvolvendo-os, a fim de compor um modelo no qual o Deus Trino se comunica com sua Igreja.

Para se levantar a possibilidade de um uso de Daniel na composição de um modelo revelacional trinitário em Apocalipse são trabalhados alguns tópicos: o método exegético do uso do Antigo Testamento no Novo Testamento; em seguida, é trabalhada a temática do uso do Antigo Testamento, de modo específico, em A p ocalipse, vi sto qu e isso po de va riar de l i vro a livro; dado este passo, examinam-se dois exemplos concretos, a partir da alusão de Dn 2, 28-29.45 em Ap 1,1, procurando entender os contatos entre Dn 2,28-29 e Ap 1,1a; Dn 2,45 e Ap 1,1b. Com isso, busca-se analisar como o autor do Apocalipse teria entendido que poderia usar Dn 2 para falar do Deus Trino, revelador de mistérios.

Palavras-chave:Apocalipse, Daniel, citação, alusões, mistério, Cristo, Deus, Trindade, Antigo Testamento, Novo Testamento.

Resumen: Este artículo analiza el uso del libro del profeta Daniel en la composición de un modelo de revelación trinitaria en el Apocalipsis. Para verificar el uso del Antiguo Testamento en el Nuevo Testamento se utilizan los criterios desarrollados por Beale y por Hays, en diálogo con las discusiones sobre el uso de Daniel en Apocalipsis por el propio Beale y por Moyise. A partir de eso, buscase entender cómo el Apocalipsis utilizó las alusiones a los textos danielicos como estructuras básicas para la concepción de su modelo apocalíptico trinitario.

De manera singular, se ve que las alusiones extraídas de Daniel esbozan cómo las personas del Dios Uno y Trino se relacionan entre sí en el proceso de autorrevelación divina, particularmente en cómo el Padre revela misterios apocalípticos; otorga iluminación, por su Espíritu, la comprensión de cuentos misteriosos y los realiza por medio del Hijo del Hombre. Algunas partes de Daniel son notoriamente complejas, incluso enigmáticas, pero con todos los elementos necesarios para un modelo de revelación trinitaria, y son precisamente estos elementos de Daniel de los que se sirve el autor del Apocalipsis, desarrollándolos, para componer un modelo en que Dios Trino se comunica a su Iglesia.

Para plantear la posibilidad de un uso de Daniel en la composición de un modelo revelacional trinitario en el libro del Apocalipsis, se trabajan algunos temas: el método exegético del uso del Antiguo Testamento en el Nuevo Testamento, con sus varias colaboraciones, pensando en todos los libros del Nuevo Testamento; luego se trabaja el tema del uso del Antiguo Testamento, de una manera específica, en el libro de Apocalipsis, porque esto puede variar de un libro a otro; dado este paso, se examinan dos ejemplos concretos, a partir de la alusión de Dn 2,28-29.45 en Ap 1,1, tratando de comprender los contactos entre Dn 2,28-29 y Ap 1,1a; Dn 2.45 y Ap 1.1b. Con esto, se busca analizar cómo el autor del Apocalipsis habría entendido que podría usar Dn 2 para hablar del Dios Uno y Trino, revelador de misterios.

Palabras clave: Apocalipsis, Daniel, citaciones, alusiones, misterio, Cristo, Dios, Trinidad, Antiguo Testamento, Nuevo Testamento.

Introdução

De todas as fontes disponíveis para o estudo do Novo Testamento, sem dúvida, a mais difundida é o próprio Antigo Testamento. Cada livro neotestamentário, exceto Filemon, 1 e 2João, contém citações, alusões e ecos do Antigo Testamento. No Novo Tstamento, há cerca de 300 citações e literalmente milhares de alusões do Antigo Testamento, sendo o Apocalipse de João (Apocalipse) o livro que possui, indubitavelmente, mais alusões do Antigo Testamento que qualquer outro 1 , embora não apresente nenhuma citação formal, em que pese a aproximação de Zc 12, 10 com Ap 1,7; e Sl 2,9 com Ap 2,27. Beale aponta 394 alusões do Antigo Testamento em Apocalipse 2 . Moyise contabiliza 579 vezes, assim distribuídas 3 : 82 do Pentateuco, 97 dos Salmos, 122 de Isaías, 48 de Jeremias, 83 de Ezequiel, 74 de Daniel e 73 dos Profetas Menores. De acordo com Charles, João alude a 27 versículos diferentes de Daniel, e no Apocalipse estes são extraídos de oito capítulos, de seus 12 capítulos escritos em hebraico 4 . A distribuição é a seguinte: Dn 2 (4), Dn 3 (1), Dn 4 (2), Dn 5 (1), Dn 7 (11), Dn 8 (1), Dn 10 (3) e Dn 12 (4). A diferença em número se deve à dificuldade em determinar as citações parciais, alusões e ecos, e o número de passagens para incluir na categoria de ecos.

Apesar das estatísticas não confirmarem a centralidade de Daniel, a sua influência sobre o texto de Apocalipse é deveras significativa, a tal ponto que alguns estudiosos, seguindo Beale 5 , consideram Apocalipse um Midrash sobre os capítulos 2 e 7 de Daniel; Manns trabalha a ideia de traços de uma Haggadah pascal cristã no livro de Apocalipse 6 . Em face de tal panorama, observa-se a importância desse artigo, que tem como fulcro avançar nas discussões em torno do uso do livro de Daniel (Antico Testamento) no Apocalipse (Novo Testamento), notadamente no uso apocalíptico das estruturas básicas do material daniélico para a concepção de um modelo trinitário revelacional em Apocalipse.

Ainda à guisa de introdução, sua importância também reside no fato de que muitos estudiosos negam a existência de aspectos seminais que viriam a ser formulados a posteriori como a doutrina da Trindade no Antigo Testamento, em virtude de entenderem que eles atingiriam o cerne do monoteísmo judaico. A questão que isto suscita é como o Antigo Testamento não apresentaria traços de uma das doutrinas mais importantes da fé cristã, cujos fundamentos bíblico-exegéticos situam-se com perspicuidade inequívoca no Novo Testamento, embora tenham sido desenvolvidos e formulados em meio às controvérsias trinitárias e cristológicas dos séculos IV e V.

Por um lado, vários elementos daquela que seria posteriormente denominada de doutrina da Trindade se encontram “subdesenvolvidos” no Antigo Testamento. Porém, como argumentam Beale e Gladd 7 , várias passagens apresentam elementos que indicam que elas são intencionalmente enigmáticas e aguardam um esclarecimento trinitário posterior que esteja de acordo com a intenção original do autor do Antigo Testamento. O Evangelho joanino 8 expressa uma das declarações mais contundentes a esse respeito: “Isto disse Isaías porque viu a glória dele e falou a seu respeito” (Jo 12,41); o que indica, para Bauckham 9 , que o profeta Isaías tinha alguma noção colateral da preexistência ou “glória” de Cristo, evidenciando que o pano de fundo da divindade de Jesus está enraizado no monoteísmo judaico, segundo o qual Cristo deve ser identificado ontologicamente com o único Deus de Israel. Isso nos ajuda a entender o uso do profetismo na liturgia, fazendo alusão ao profeta Isaías em Ap 19,1-8, único hino “aleluiático” de todo o Novo Testamento 10 .

Nesse sentido, o livro de Apocalipse contém um dos mais elaborados e sofisticados modelos trinitários do Novo Testamento. O que é sugerido em outros livros torna-se explícito no Apocalipse, e o uso do livro do profeta Daniel fornece as estruturas basilares para a concepção de modelo de revelação apocalíptica. De modo próprio, Daniel esboça como as pessoas do Deus Trino relacionam-se umas com as outras no processo de revelação divina apocalíptica, particularmente em como Deus Pai revela mistérios apocalípticos; concede iluminação, pelo seu Espírito, para a compreensão de tais mistérios; e os executa através do Filho do Homem. Algumas partes de Daniel são notoriamente complexas, até enigmáticas, mas com todos os elementos necessários para um robusto modelo trinitário revelacional, e são precisamente esses elementos de Daniel dos quais Apocalipse faz uso, desenvolvendo-os, a fim de compor um modelo no qual o Deus Trino se comunica com a sua Igreja.

O presente artigo refletirá sobre essas questões. Tal intento revela, outrossim, seus limites, pois há muitas outras alusões e ecos de Daniel no Apocalipse, o que demandaria uma pesquisa mais complexa e volumosa, que o espaço e o escopo de um artigo não comporta. A etapa do estudo proposto visa aprofundar as discussões sobre o tema e abrir campo para ulteriores pesquisas e amadurecimentos.

O método exegético do uso do Antigo Testamento no Novo Testamento

O ponto inicial para empreendermos uma pesquisa sobre o uso do Antigo Testamento no Novo Testamento, conforme o método de Richard B. Hays, em sua obra Echoes of Scripture in the Letter of Paul, e de G. K. Beale, em seu Manual do uso do Antigo Testamento no Novo Testamento, é entender os critérios e os passos levantados por ambos os autores para atestar o uso de uma passagem do Antigo Testamento no Novo Testamento.

Hays elabora sete critérios indicadores para detectar o uso do Antigo Testamento no Novo Testamento 11 :

  1. Disponibilidade: Se o autor e os destinatários tiveram ou não acesso direto à fonte hebraica ou à fonte grega.

  2. Volume: Qual o grau de repetição de palavras ou padrões sintáticos no texto precursor e na alusão neotestamentária.

  3. Recorrência: É necessário analisar a existência de referências ao texto aludido ou ao contexto veterotestamentário usado.

  4. Coerência temática: Até que ponto a suposta alusão se adapta à linha argumentativa desenvolvida pelo autor do Novo Testamento.

  5. Plausibilidade histórica: Em que medida é plausível constatar a afirmação de que o autor do Novo Testamento usou a alusão para conseguir um determinado efeito de sentido ressonante nos leitores da época.

  6. História da interpretação: Constatar se outros autores e leitores foram capazes de perceber as mesmas referências que teriam percebido os contemporâneos do escrito.

  7. Satisfação: Após os seis itens anteriores, ainda é necessário se perguntar se faz sentido a sua utilização em seu contexto imediato, se esclarece e aumenta o vigor retórico da argumentação 12 .

Beale retoma sete critérios de Hays, amplia sua proposta inicial e elabora nove passos para se trabalhar o uso do Antigo Testamento no Novo Testamento 13 :

  1. Identificação e validação da referência ao Antigo Testamento: citação, alusão ou eco, no qual são retomados os sete critérios de Hays, sendo os demais propostos por Beale;

  2. Análise do contexto geral do Novo Testamento em que ocorre a referência ao Antigo Testamento.

  3. Análise do contexto imediato e do contexto geral do Antigo Testamento, para interpretar atenta e minuciosamente, sobretudo o parágrafo em que a citação ou alusão ocorre.

  4. Pesquisa quanto ao uso do texto do Antigo Testamento no judaísmo anterior e posterior que possa ser importante para a apropriação do texto veterotestamentário pelo Novo Testamento.

  5. Comparação dos textos, inclusive suas variantes textuais: Novo Testamento, Septuaginta, Texto Massorético e os Targumim, citações judaicas antigas (Manuscritos, Pseudoepígrafos, Josefo, Filon).

  6. Análise do uso textual que o autor faz do Antigo Testamento, para se ver em que tradição textual veterotestamentária o autor se apoia, ou se ele está dando sua versão pessoal, e como isso afeta a interpretação do texto do Antigo Testamento.

  7. Análise do uso interpretativo, hermenêutico, que o autor faz do Antigo Testamento.

  8. Análise do uso teológico que o autor faz do Antigo Testamento.

  9. Análise do uso retórico que o autor faz do Antigo Testamento 14 .

Em ambas as propostas, vemos a preocupação quanto à necessidade preliminar de distinção entre citação, alusão e eco, que são as três categorias de uso do Antigo Testamento nas cartas de Paulo propostas por Hays, com regras aplicáveis a todos os livros do Novo Testamento, e assim utilizadas e ampliadas por Beale. Essas são as três formas distintas pelas quais os autores do Novo Testamento se referiram ao Antigo Testamento.

Conforme Beale 15 elucidou em seu manual, a citação de um texto do Antigo Testamento no Novo Testamento é uma reprodução direta de uma passagem do Antigo Testamento facilmente identificável por seu paralelismo vocabular claro e bem característico. Parte dessas citações são iniciadas por uma fórmula indicadora: “para que se cumprisse o que o Senhor havia falado pelo profeta” (Mt 2,15), “está escrito” (Rm 3,4), ou uma expressão semelhante. Outras passagens sem tais indicadores prévios apresentam paralelos tão óbvios com algum texto do Antigo Testamento que se constituem em evidentes citações, como, por exemplo, as que se encontram em Gl 3,6, que cita Gn 15,6; e Ef 6,3, que cita Ex 20,12.

A alusão a um texto do Antigo Testamento no Novo Testamento, por sua vez, é mais difícil de definir que a citação 16 . A contagem varia muito entre os autores 17 . Sinteticamente, define-se a alusão como uma expressão breve deliberadamente pretendida pelo autor para ser dependente de uma passagem do Antigo Testamento, que encontramos de forma implícita 18 . Diferentemente da citação do Antigo Testamento, que é uma referência direta, a alusão faz uma referência de modo indireto. A chave para identificar uma alusão consiste em notar se existe um paralelo incomparável ou único de redação, sintaxe, conceito ou conjunto de motivos na mesma estrutura redacional 19 . Vale a pena ressaltar que dois livros do Novo Testamento se destacam pela quantidade de vezes que recorrem ao material específico do Antigo Testamento mediante a alusão: a Epístola aos Hebreus, composta pelas temáticas constantes no livro de Levítico, e o livro de Apocalipse, que, no texto e na forma, faz várias alusões aos termos e ao imaginário apocalíptico do livro de Daniel, como vemos neste artigo.

Já um eco de um texto do Antigo Testamento no Novo Testamento, por seu turno, implica em uma vaga lembrança de uma passagem ou conceito veterotestamentário, um tipo de alusão possível 20 . Beetham estabelece quatro itens que considera essenciais para a compreensão do que vem a ser um eco: (1) Nem sempre é um ato consciente; (2) tem sempre uma fonte identificável; (3) o autor não intenciona apontar para a sua audiência o precursor daquela mensagem; e (4) pode não vir conectado ao contexto original do texto ecoado 21 . Ainda, para Beetham o eco vem à tona porque a mente do autor está permeada por aquela fonte 22 .

O Uso do Antigo Testamento em Apocalipse de João

O Apocalipse não apresenta nenhuma citação formal (apesar da aproximação de Zc 12,10 em Ap 1,7; e de Sl 2,9 em Ap 2,27) e, no entanto, possui, sem dúvida, mais alusões do que qualquer outro livro do Novo Testamento. Não há nenhuma fórmula introdutória, e as citações e alusões parciais são entrelaçadas numa teia narrativa chamada de “uso composicional” do Antigo Testamento 23 . O resultado é uma expressão teológica rica em alusões veterotestamentárias. Bauckham formula a ideia com competência:

As alusões se destinam a: recordar o contexto do Antigo Testamento que, assim, torna-se parte do significado que o Apocalipse carrega; e a construir, às vezes através de uma rede de alusões à própria passagem do Antigo Testamento em várias partes do Apocalipse, uma interpretação de passagens inteiras de profecias do Antigo Testamento. 24

Tem havido uma explosão de interesse sobre o papel das alusões do Antigo Testamento em Apocalipse, com importantes estudos dos vários livros do Antigo Testamento por trás do Apocalipse. A gama de uso do Antigo Testamento inclui o Pentateuco, Juízes, 1 e 2 Samuel, 1 e 2 Reis, Salmos, Provérbios, Cântico dos Cânticos, Jó, Profetas maiores e menores. Porém, mais da metade das referências são de Salmos, Isaías, Ezequiel e Daniel, e, em proporção à sua extensão, Daniel é o que possui usos mais extensos 25 .

Ainda de acordo com Beale, o uso joanino do Antigo Testamento em Apocalipse possui seis características distintivas quanto à sua intertextualidade 26 :

  1. Protótipos literários: muitas vezes as passagens do Antigo Testamento se tornam modelos para as seções principais. Por exemplo, Dn 2 e 7 para Ap 1,4-5.13.17; Ez 37–48 para Ap 20–22; ou Ez 2,8–3,3 para Ap 10,8-11; as pragas no ȋxodo para as trombetas e as taças nos julgamentos.

  2. Temas análogos: os temas são frequentemente estabelecidos com base nos grupos de material tradicional, como o tema da “guerra santa” 27 , a “antiga serpente”, de Ap 12,9; 20,2, ou os títulos divinos aplicados a Cristo.

  3. Tipologia: no Antigo Testamento, figuras como Leviatã (retomada na figura do dragão) ou o pequeno chifre de Daniel (retomada na besta do mar) são tipologicamente relacionadas da mesma forma que são relacionados os lugares como o tabernáculo/templo (retomado no templo divino) ou as personagens como os cavaleiros de Zc 1,7-11; 6,1-8 (retomados nos cavaleiros de Ap 6,1-8).

  4. Universalização: muitas vezes o que é aplicado a Israel é transposto para o mundo (Zc 12,10, o lamento de Israel, em Ap 1,7) ou para a igreja (Ex 19,6, “Reino e sacerdotes” em Ap 1,6; 5,10).

  5. Cumprimento indireto: nesse caso, as passagens do Antigo Testamento são usadas informalmente para fortalecer o quadro de imagens. Por exemplo, Moisés e Elias como pano de fundo das duas testemunhas de Ap 11,3-13 (com base nos milagres executados) ou o uso inaugurado em Dn 7,13 por detrás de “alguém semelhante a um filho de homem” em Ap 1,12-13 (por isso, o domínio universal dessa passagem para Jesus).

  6. Usos invertidos: isso ocorre quando o significado da passagem do Antigo Testamento é deliberadamente invertido, como em Ap 3,9, prometendo que os perseguidores judeus se curvarão diante dos que creram (o oposto das expectativas em Is 45,14; 49,23; 60,14); ou, em Ap 12,7-8, a destruição do dragão por Miguel (o oposto de Dn 7,21 em que o pequeno chifre derrota os santos).

Um outro aspecto importante quando se analisa o uso do livro de Daniel em Apocalipse é a respeito de qual texto ou fonte João usou, se a partir da Bíblia Hebraica 28 ou se da versão grega da Septuaginta (LXX). Se do Texto Hebraico, a partir de qual manuscrito? Se do texto grego da Septuaginta 29 , a partir de qual manuscrito? Beale acentua que a identificação do texto das referências do Antigo Testamento no Apocalipse necessita de uma discussão aprofundada 30 , pois não há citações formais e a maioria das referências são alusões, um elemento textual que, muitas vezes, dificulta a identificação textual para a identificação da fonte utilizada pelo autor do livro do Apocalipse. Quando se trata de citação explícita se torna mais fácil averiguar a fonte e majoritariamente se dá a partir da fonte grega. Mas em se tratamento de alusão ou de eco, falta a materialidade para se conferir, com maior exatidão, qual foi a possível fonte utilizada: se hebraica ou grega.

Segundo Beale 31 , muitos estudiosos não seguem a visão de que João dependia principalmente da Septuaginta, mas segue a conclusão da análise de Charles 32 de que João foi mais influenciado pelo Texto Hebraico do que pelo Antigo Testamento grego, uma conclusão baseada principalmente na observação de que as alusões de João se distanciam da redação da Septuaginta. Por outro lado, Moyise 33 constata que as alusões também se afastam do Texto Hebraico em pontos significativos, o que reforça o entendimento em Beale de que a maior probabilidade é de que João tenha se baseado em fontes bíblicas semíticas e gregas, e, em muitos casos, modifique ambas. O próprio Charles reconhece que, embora o padrão de João fosse traduzir do Texto Hebraico e não citar a Septuaginta, no entanto, admite ele, muitas vezes João foi influenciado pela própria Septuaginta 34 , o que evidencia o risco de se afirmar a tese de Beale em favor do Texto Hebraico.

A complexa relação do Texto Hebraico com as primeiras versões gregas torna difícil saber se João depende do Texto Hebraico ou da Septuaginta. Cimosa é da mesma opinião de que não é tarefa fácil dar uma resposta precisa sobre a questão do uso da fonte do Antigo Testamento para o livro do Apocalipse, se do hebraico ou do grego 35 ; a mesma opinião se encontra estudos anteriores, a exemplo Vanhoye 36 , Lancellotti 37 , Gangemi 38 e de Marconcini 39 , que levantam esta mesma dificuldade, seja em geral, seja a partir de textos específicos, como o caso do profeta Ezequiel e do Deutero-Isaías. Isso não se aplica ao uso de citações do Antigo Testamento em todo o Novo Testamento, que preponderantemente se dá a partir da Septuaginta e não do Texto Hebraico, em uma relação de 90% (fonte grega da Septuaginta) a 10% (fonte hebraica), sobretudo se se toma como critério a comparação com o Texto Hebraico da fonte massorética, que é muito tardio enquanto vocalização, entre os séculos V-VII. Porém, para alusões ou ecos, dar esta precisão não é tarefa fácil, pelo contrário, muito mais difícil, pela falta da materialidade do objeto do estudo, o que pede mais prudência nas afirmações.

Por outro lado, o uso do livro de Daniel no Apocalipse tem sido objeto de muitas outras discussões. O que é unânime nelas, inobstante, é a preponderância da literatura daniélica na composição de grande parte da imaginação apocalíptica de João, e isto a tal ponto que, como observamos, alguns estudiosos, seguindo Beale, consideram Apocalipse um Midrash 40 sobre Dn 2 e 7.

O que se constata, portanto, é que o texto de Apocalipse foi tecido e emoldurado com alusões ao Antigo Testamento. Sendo assim, deteremos nossa atenção para o uso que João faz do livro de Daniel, com o fim de compor um modelo apocalíptico no qual o Deus Trino se comunica com a sua Igreja.

Deus como revelador dos mistérios

Pode ser tentador passar por Ap 1,1 e prosseguir para as partes mais dramáticas do livro, porém, melhor não sucumbir a essa tentação. O primeiro versículo do Apocalipse divulga com sutileza como Deus Pai transmite a revelação ao próprio Cristo 41 . João abre seu livro com uma “cadeia” de revelação: “Revelação de Jesus Cristo, que Deus lhe deu (⸂ἣν ἔδωκεν αὐτῷ ὁ θεὸς) para mostrar aos seus servos as coisas que em breve devem acontecer (ἃ δεῖ γενέσθαι ἐν τάχει) e que ele, enviando por intermédio do seu anjo, notificou (ἐσήμανεν) ao seu servo João” (Ap 1,1). João não explica em detalhes como Deus revela o conteúdo da visão a Cristo, mas ele sugere o que o conteúdo da visão implicará. Além disso, esta é a primeira vez que a expressão “Ἀποκάλυψις Ἰησοῦ Χριστοῦ” (revelação de Jesus Cristo”) (Ap 1,1a) é usada como título de um livro, indicando, de per si, “uma sua originalidade” 42 , mesmo entre os livros de gênero apocalíptico, “é algo que não se encontra antes”43.

A expressão “ἣν ἔδωκεν αὐτῷ ὁ θεὸς” (“a qual Deus lhe deu”) e o verbo-chave ἐσήμανεν (notificou) recordam o livro de Daniel, particularmente o Capítulo 2 44 . O lugar de Ap 1,1, no contexto do livro, é entendido como a introdução e provavelmente também o seu título. A alusão ao texto de Dn 2,28-29.45 fornece ao leitor atento uma pista para o propósito de Apocalipse 45 . Os paralelos entre Ap 1,1 e Dn 2,28-29 são altamente prováveis:






Primeiro, δείκνυμι (Ap 1,1: δεῖξαι (para mostrar, um infinitivo aoristo ativo) e δηλόω (Dn 2,28: ἐδήλωσε [mostrou]) são equivalentes semânticos 48 (ambos significam “mostrar”, “anunciar”, “fazer saber” 49 ). Segundo, e mais importante, a mudança de “ἐπʼ ἐσχάτων τῶν ἡμερῶν” (no fim dos dias/tempos) para “ἐν τάχει” (“em breve”) não é aleatória nem sem propósito, mas fornece uma visão da relação que João enxerga entre Apocalipse e Daniel 50 . A expressão “ἐν τάχει” (“em breve”) pode designar o modo rápido do cumprimento ou pode se referir ao tempo iminente do cumprimento. A frase parece indicar o cumprimento que já começou (que está sendo cumprido) ou que começará em um futuro próximo. Isto implica no fato de que João entende a referência de Daniel a um tempo distante como se referindo à sua própria era e atualiza o texto de acordo com sua compreensão. O que Daniel esperava que ocorresse nos distantes “últimos dias” (a derrota do mal cósmico e o estabelecimento do Reino divino eterno), João espera começar “em breve”, em sua própria geração, se ainda não começou a acontecer.

Por assim dizer, se João entende as palavras em Ap 1,1 à luz do contexto escatológico de Dn 2, então ele pode estar afirmando que o que está por vir em seu livro deve ser visto como uma extensão significativa dentro da estrutura temática de Dn 2 (e os capítulos apocalípticos paralelos, como Dn 7). De fato, há várias evidências em Ap 1 para sugerir que este é o caso: referências ao Reino (vv.6.9; Dn 7,14), que é governado por um “semelhante a filho de homem” (Ap 1,7.13; Dn 7,13-14), descrito em uma visão teofânica (Ap 1,13-15; Dn 7,9-10). São alusões que sugerem fortemente que Dn 2 e Ap 1 estariam descrevendo o mesmo evento e estariam ligados pela relação de promessa e cumprimento. Além disso, o fato dos eventos de Ap 1,6.9.13-15 serem todos realidades presentes indica que o cumprimento de Dn 2 não seria meramente iminente, mas estaria ocorrendo na própria presença de João.

Uma evidência adicional de que Ap 1,1 descreve o início do cumprimento do que é prometido em Dn 2 é encontrada em Ap 1,3, na declaração “ὁ γὰρ καιρὸς ἐγγύς” (“pois o tempo está próximo”). Isso pode ser tomado como uma expressão exagerada de iminência: o tempo não estaria simplesmente chegando, mas estaria realmente aqui. Em apoio a tal noção de proximidade de Ap 1,3, o texto de Mc 1,15 afirma: “πεπλήρωται ὁ καιρὸς καὶ ἤγγικεν ἡ βασιλεία τοῦ θεοῦ” (“está cumprido o tempo e aproximou-se o Reino de Deus”). Jesus usa essa frase para descrever não apenas a proximidade de seu ministério e do Reino, mas a inauguração real deles. Em outras palavras, se o Reino realmente se começou durante o ministério terreno de Cristo, então João discerniu que ele estava presente em seus dias, especialmente porque ele usa uma fórmula de cumprimento semelhante, presente em outros livros bíblicos para se referir à maturidade do tempo em que o Verbo de Deus se fez carne, a exemplo de Paulo, em Gl 4,4-5 51 .

Tendo em vista essas alusões e paralelos textuais e temáticos entre Ap 1,1.3 e Dn 2,28.29; 7,13.14, o mínimo que se pode dizer é que a redação desses textos se refere ao futuro imediato. João viu a morte e ressurreição de Cristo como inauguração do tão esperado Reino do fim dos tempos, predito em Dn 2. Em resumo, entender Ap 1,1 à luz de Dn 2 faz sentido por razões textuais (o v. 1 é uma alusão clara a Dn 2), razões contextuais (os vv.1,3.6.9.13-15 compartilham uma visão comum de Dn 2 e 7), e razões temáticas (o v. 1 descreve o princípio do fim que é predito em Dn 2).

Entretanto, parcela significativa dos comentadores ainda não explorou a frase “ἣν ἔδωκεν αὐτῷ ὁ θεὸς” (a qual Deus lhe deu”) em sua aplicação no prólogo do livro 52 . Nesse sentido, para Beale 53 , o fato de Deus “dar” as visões a Cristo deve ser entendido especialmente à luz das alusões ao livro de Daniel, muitas vezes negligenciadas na interpretação desse prólogo.

Deus como fonte da revelação em Daniel

O livro do profeta Daniel, em grande parte, retrata Deus como a fonte incomparável da sabedoria. Cada capítulo acentua este ponto, culminando no retrato simbólico de Deus como o “Ancião de Dias”, com cabelo branco, provavelmente uma referência à sua sabedoria insuperável em Dn 7,9 – algo característico da literatura veterotestamentária (Lv 19,32; Pr 16,31; 20,29). Central para o livro de Daniel é a capacidade de Deus de revelar sua sabedoria ou mistérios para pessoas específicas (Nabucodonosor e Daniel). Em seu nível mais básico, o termo escatológico técnico (mistério) diz respeito à revelação de Deus e de sua própria sabedoria, no sentido de uma revelação anteriormente oculta que é posteriormente revelada, como demonstram Beale e Gladd 54 , em sua teologia bíblica acerca do mistério. João uso o termo μυστήριον (mistério) quatro vezes em Apocalipse (1,20; 10,7; 17,5.7).

A presença deste vocábulo escatológico técnico não é surpreendente, dada a natureza do fim dos tempos do livro e sua dependência literária em relação ao livro de Daniel. Segundo Beale 55 , em Dn 2, μυστήριον é claramente utilizado em um contexto escatológico, já que a visão diz respeito ao cumprimento inaugurado do ofício do “filho do homem” de rei messiânico, e o “mistério” diz respeito ao Reino escatológico, cujo cumprimento é visto na forma da Igreja, dos santos e dos anjos da guarda (Ap 1,6.9); ainda, μυστήριον também é usado em estreita associação com a ideia de “interpretação”, pois introduz a interpretação da visão no v. 20, o que também se vê em Dn 2.

Isto explica por que a raiz verbal גלה aparece oito vezes em Daniel, referindo-se à “revelação” divina de “mistérios” (Dn 2,19.28-30) 56 , de “coisas profundas e ocultas” (Dn 2,22) e de uma visão profética (Dn 10,1), que no livro do Apocalipse tem um grande peso 57 . Em Dn 2, Deus “revela” um “mistério” para Daniel que diz respeito à destruição de nações hostis e pagãs e ao estabelecimento do Reino divino no fim dos tempos (Dn 2,28.44-45). Embora o termo “revelação” esteja faltando em Dn 4, ainda é válido chamar o sonho de Nabucodonosor, neste capítulo, de uma revelação (4,9). A mesma caracterização pode ser aplicada às visões de Dn 7–12. Além disso, Daniel teve “sonho e visões” (7,1), que provavelmente são análogas aos sonhos de Nabucodonosor, em Dn 2 e 4. Assim como Deus compartilha de sua sabedoria com Daniel, a fim de que ele conhecesse e interpretasse os sonhos de Nabucodonosor (Dn 2 e 4), Deus revela diretamente sua sabedoria a Daniel (Dn 7–12), e concede a Daniel sabedoria para entendê-la. Deus, inicialmente, revela sua sabedoria e, posteriormente, revela a interpretação da revelação.

Nabucodonosor sonha e deseja conhecer a interpretação (Dn 2,1-13). Deus revela o “mistério a Daniel numa visão de noite” (Dn 2,19), isto é, tanto o sonho quanto a interpretação, detalhados em Dn 2,31-45. Esta revelação da sabedoria de Deus é marcada pelo termo interpretação (Hebraico: ַׁשר ְּפ ; e Aramaico: ֵּפֶשׁר, que transmite a ideia de uma solução divina para um mistério e ocorre trinta e quatro vezes em Daniel 58 .

Em Dn 2 e 4, o rei Nabucodonosor recebe o mistério e Daniel interpreta as visões, enquanto em Dn 7–12, o profeta recebe o relato inicial do sonho e o anjo interpreta as visões. Uma marca distinta e apocalíptica de Daniel é a natureza da revelação dupla em contraste com outros lugares no Antigo Testamento nos quais os profetas recebem diretamente a revelação de Deus. Nesse ponto, Deus, de acordo com o livro de Daniel, é a fonte da sabedoria divina e oculta, e escolhe transmitir essa sabedoria a certas pessoas, e, após isso, também entrega a parte interpretativa das visões para outros destinatários.

Deus como fonte última da revelação em Apocalipse

O modelo descrito no tópico anterior se encaixa notavelmente em Ap 1,1, no qual Deus Pai entrega a revelação a Cristo sobre “as coisas que em breve devem acontecer”. Embora a palavra μυστήριον (mistério) não seja encontrada no prólogo, repete-se ao longo do livro (Ap 1,20; 10,7; 17,5.7), tendo em vista que o livro se encaixa dentro do gênero de “apocalipses”. Dentro da literatura apocalíptica, a palavra mistério é o meio pelo qual Deus transmite sua mensagem 59 . De acordo com o Ap 1,1, Deus revela seus mistérios sobre o fim dos tempos para Cristo, que então os comunica ao anjo. No final do Apocalipse, no epílogo (Ap 22,6-21), Deus é descrito de maneira idêntica. O início do epílogo reforça e refina os temas introduzidos em Ap 1,1. Nele, Deus é caracterizado como a fonte da revelação final, uma caracterização que descreve a interação do Apocalipse com outros profetas.

Além disso, como demonstra Beale 60 , João explora essa conexão ao aludir mais uma vez a Dn 2,28,45, em Ap 22,6: “Estas palavras são fiéis e verdadeiras. O Senhor, o Deus dos espíritos dos profetas, enviou seu anjo para mostrar aos seus servos as coisas que em breve devem acontecer”. As palavras de Daniel a Nabucodonosor podem ser ouvidas aqui: “...há um Deus no céu, o qual revela os mistérios, pois fez saber ao rei Nabucodonosor o que há de ser nos últimos dias” (Dn 2,28); e: “certo é o sonho, e fiel, a sua interpretação” (Dn 2,45).

É nítido que, desse modo, Apocalipse tece essas alusões a Daniel no epílogo, não somente porque sinalizam o cumprimento inicial da chegada do Reino eterno, como descrito em Dn 2, mas também porque afirmam o caráter de Deus como a única fonte de revelação de mistérios. Em contraste com as “bestas” em Apocalipse, que tentam imitar a verdade de Deus através de difamações e blasfêmias (Ap 13,5-18), a revelação de Deus é sem corrupção e genuinamente digna de confiança. Ao emoldurar o Apocalipse com a capacidade de Deus de revelar mistérios no prólogo e no epílogo, João reforça a autenticidade da revelação, de modo que as igrejas serão encorajadas a perseverar na verdade em meio às falsificações da verdade que as assediam.

Cristo como revelador dos mistérios

Neste ponto, avançamos para a análise de que não somente Deus Pai é apresentado como fonte de revelação em Ap 1,1 61 . Cristo ocupa um papel distinto, mas crucial. João abre o livro com uma frase um tanto ambígua “Ἀποκάλυψις Ἰησοῦ Χριστοῦ” (“revelação de Jesus Cristo”) (Ap 1,1a). As opiniões diferem quanto ao tipo de construção genitiva. Por um lado, poderíamos tornar isso como “uma revelação sobre Jesus Cristo” (genitivo objetivo). Por outro lado, poderia ser “uma revelação de Cristo” (genitivo subjetivo). Este último é o mais provável, seguindo Na opinião de Osborne, este último “é o mais provável” 62 . Segundo Kistemaker, “no momento em que Jesus Cristo compartilha a revelação por ele recebida, ela se transforma em sua própria revelação” 63 .

Se as visões contidas no Apocalipse são de fato “de Cristo”, o prólogo conduz o leitor a pausar e contemplar como o Cristo. Ele desempenha um papel único na transmissão da revelação. Ap 1,1, em sua última frase, afirma: “...ele, enviando por intermédio do seu anjo, notificou (ἐσήμανεν) ao seu servo João”. O verbo não é óbvio e pode referir-se a Deus ou a Cristo, mas alguns argumentam que Cristo é o sujeito 64 . Talvez não coincidentemente, de acordo com a Septuaginta (com exceção de Dn 2,15), Deus é o único que mostra o significado das visões (Dn 2,23.30.45), como demonstra a seguinte tabela, com ênfases que acentuam o paralelismo verbal:






Outro aspecto a ser ressaltado, em Ap 1,1, é que Cristo comunica as visões simbólicas ao anjo. Uma das descrições mais fascinantes no prólogo ocorre em Ap 1,14, em que João descreve o Filho do Homem a partir dos elementos corporais do “Ancião de Dias”, encontrado em Dn 7,9: “...os cabelos da cabeça, como a pura lã...”

Ao descrever graficamente o Filho do Homem como possuidor de cabelos brancos, João ressalta a sabedoria inimitável de Cristo, a mesma sabedoria que somente Deus possui. Some-se a isto o fato de que uma das principais características da literatura apocalíptica é a mediação da revelação por seres angelicais 67 . Tipicamente, Deus concede uma revelação, e um anjo transmite essa revelação a um indivíduo. Conforma explica Keener 68 , essa cena remete ao retrato de Deus em Dn 7,9 (o cabelo branco simbolizando a dignidade e a sabedoria resultante da idade), às características do anjo poderoso, em Dn 10,5-6, e ao título “parecido com um filho de homem”, de Dn 7,13, que governaria as nações.

Por isso, em Ap 1,1 a “cadeia” de comunicação é tradicional e única 69 . Não surpreende que Deus seja a fonte última da revelação, mas Cristo ocupa um papel único na sequência: “...Deus lhe deu (a Cristo) para mostrar aos seus servos as coisas que em breve devem acontecer e que ele, enviando por intermédio do seu anjo, notificou ao seu servo João”, que, por sua vez, as transmite às sete igrejas do Apocalipse (Ap 2–3). A sequência da cadeia de comunicação é a seguinte:






No Ap 1,2, João “atestou a palavra de Deus e o testemunho de Jesus Cristo, quanto a tudo o que viu”, demonstrando que Cristo desempenha um papel único na comunicação das visões, já que esta é uma “Ἀποκάλυψις Ἰησοῦ Χριστοῦ” (“revelação de Jesus Cristo”) (Ap 1,1a) 70 . Cristo também é a suprema testemunha da revelação de Deus, a qual ele comunica fielmente aos anjos e garante sua veracidade. O epílogo também toca no papel de Cristo como testemunha suprema da revelação de Deus: “Aquele que dá testemunho destas coisas diz: Certamente, venho sem demora” (Ap 22,20a).

Essas observações sugerem que o livro de Daniel apresenta Deus como o incomparavelmente sábio e o revelador supremo dos mistérios. Ao aludir a partes-chave do livro de Daniel no prólogo e no epílogo de Apocalipse, João retrata a primeira pessoa da Trindade como trabalhando de forma idêntica: o grande e soberano Senhor revelou sua sabedoria mais uma vez a um indivíduo escolhido. Mas João também desenvolve a perspectiva de Daniel do processo de revelação, alegando que a revelação é “Ἰησοῦ Χριστοῦ (de Jesus Cristo) (Ap 1,1a), retratando Cristo em uma posição proeminente em sua cadeia de comunicação. Cristo faz mais do que simplesmente mediar a revelação. Ele é a “testemunha” suprema, por desempenhar um papel fontal na revelação de Deus 71 .

O Espírito como iluminador da revelação

O Espírito também é introduzido no prólogo e desempenha um papel notável no livro do Apocalipse. Primeiro, João menciona o Espírito na fórmula trinitária de 1,4-5b: “Graça e paz a vós outros, da parte daquele que é, que era e que há de vir, da parte dos sete Espíritos que se acham diante do seu trono”. De acordo com Monari, o Pai é aquele que era e que vem; o Filho é a testemunha fiel e os sete espíritos diante do trono representa o Espírito 72 . O título “os sete Espíritos” é único, e Zc 4 é o pano de fundo para este título (“sete lâmpadas”, Zc 4,2; “Espírito”, Zc 4,6; “sete olhos são os olhos do Senhor, que percorrem toda a terra”, Zc 4,10; Ap 5,6). A conexão com Zc 4 em Ap 1,4-5 é forte, sendo a passagem dominante do Antigo Testamento.

No entanto, o livro de Daniel pode ser considerado como um pano de fundo secundário para esta descrição incomum em Apocalipse. O número “sete” carrega conotações simbólicas dentro de Daniel, particularmente no que diz respeito a um período completo de tempo. Por exemplo, “sete tempos” passarão até que Nabucodonosor seja restaurado (Dn 4,16.23.25.32). Talvez a ocorrência mais notável de “sete” seja encontrada em Dn 9, onde, no Texto Hebraico, lê-se que são decretadas “setenta setes” (Dn 9,24). O restante da visão faz uso intenso desse número simbólico: “sete setes”, e “sessenta e dois setes” (Dn 9,25), “sessenta e dois setes” (Dn 9,26), e “um sete” e “metade de sete” (Dn 9,27). Isto implica em dizer que, conceitualmente, o papel do Espírito na revelação ressoa dentro do livro de Daniel, particularmente na maneira como o Espírito ilumina o significado da revelação divina do fim dos tempos.

O Espírito como iluminador em Daniel

Não somente o número “sete” assume tons apocalípticos em Daniel, mas o Espírito também desempenha um papel fundamental no livro de Daniel, particularmente como aquele que ilumina a revelação de Deus sobre o fim dos tempos. O que torna Daniel único em contraste com outra literatura profética, como Isaías, Jeremias e Ezequiel, é a relação entre a presença do Espírito de Deus e a iluminação dos “mistérios” ou da “sabedoria” oculta de Deus. O livro de Daniel cunha o termo “mistério” e insiste que apenas o Espírito pode transmitir a devida compreensão deles. Uma leitura cuidadosa da narrativa de Daniel lança luz sobre a obra do Espírito em proporcionar compreensão ao destinatário da revelação apocalíptica.

Walton, Mattews e Victor reconhecem os elementos literários das disputas de sabedoria em narrativas da corte imperial no Antigo Oriente Próximo presentes no livro de Daniel 73 . Essas narrativas da corte no livro de Daniel são semelhantes às narrativas da corte imperial presentes no livro de Gênesis, nos eventos em torno da personagem José, e também no livro de Ester, com sua principal personagem, que empresta o nome ao livro. No livro de Daniel, elas contam a história de um cortesão sábio, cuja sabedoria excede a de todas as outras pessoas da corte. Esta história de sucesso está em oposição direta à sabedoria de seus oponentes.

Dentro dessas narrativas da corte, a pessoa de Daniel, que possui o Espírito, contrasta com os sábios babilônicos. Em Dn 1, a sabedoria é usada para caracterizar os jovens exilados de Jerusalém, pois eram “jovens... instruídos em toda a sabedoria, doutos em ciência, versados no conhecimento e que fossem competentes para assistirem no palácio do rei...” (Dn 1,4). Tal descrição também aparece mais uma vez em Dn 1,17, retratando Daniel e outros três jovens, mas aqui Deus é a fonte de tal sabedoria: “Ora a estes quatro jovens Deus deu o conhecimento e a inteligência em toda cultura e sabedoria; mas a Daniel deu inteligência de todas as visões e sonhos”. Collins observa que este versículo é paradigmático para o livro de Daniel e prepara o leitor para o papel de Daniel, no Capítulo 2 74 . Por isso, Daniel é apresentado como muito mais sábio que os babilônicos já em Dn 1,20.

O trecho de Dn 2,2-13 constitui o discurso mais longo sobre a futilidade da sabedoria babilônica. Não é coincidência que Daniel e seus amigos tenham recebido superiores “sabedoria” e “inteligência”, em Dn 1,17-20, uma passagem que precede imediatamente uma situação embaraçosa dos chamados sábios babilônicos (Dn 4,6; 5,8). Nabucodonosor, usando todo os seus recursos, acena a todos os seus sábios, em Dn 2,2: “...o rei mandou chamar os magos, os encantadores, os feiticeiros e os caldeus, para que declarassem ao rei quais lhe foram os sonhos...” A lista de homens sábios é extensa: mágicos, encantadores, feiticeiros e astrólogos, certamente represen tando o epítome da sabedoria babilônica, a fim de revelar e interpretar os sonhos de Nabucodonosor 75 .

Os sábios babilônicos veem-se inúteis. A menos que tenham informações sobre o conteúdo do sonho, eles não serão capazes de emitir uma interpretação. Eles imploram duas vezes para que o rei narre o sonho (Dn 2,4.7). Uma passagem um tanto paradigmática ocorre quando os sábios reclamam que o rei convocou os mágicos, encantadores, feiticeiros e astrólogos para lhe dizer o que ele tinha sonhado, mas “ninguém há que a possa revelar diante do rei, senão os deuses, e estes não moram com os homens” (Dn 2,2-11). Os sábios babilônicos declaram que não têm conhecimento de revelação direta. Eles são incapazes de explicar o sonho.

As divindades babilônicas simplesmente não divulgam tais informações aos sábios. Mas o Deus de Daniel não é como os falsos deuses; ele é caracterizado por revelar os mistérios, afirma Daniel (Dn 2,27.28.47). Em contraste direto com Dn 2,10-11, Daniel afirma que “há um Deus no céu, o qual revela os mistérios, pois fez saber ao rei Nabucodonosor o que há de ser nos últimos dias”. Portanto, essas duas passagens (Dn 2,10-11.27-28) são significativas para a interpretação geral do livro, pois estabelecem a disputa entre Daniel e os sábios da Babilônia. A natureza da disputa entre essas duas partes não é principalmente sobre o método de Daniel contra a adivinhação babilônica, mas a sabedoria divina de Daniel em contraste com a sabedoria idólatra dos babilônicos. Nesta conjuntura, quando Daniel entra em conflito com os babilônicos, o Espírito é apresentado como uma pessoa chave na narrativa de Daniel.

É impossível que os sábios babilônicos recebam revelação direta dessa maneira, pois os presságios interpretam o que já está revelado. Mas o Deus de Daniel concede revelação direta (Dn 2,28). Portanto, Daniel é verdadeiramente sábio porque sua sabedoria vem diretamente do verdadeiro Deus. Pode-se, assim, afirmar que Daniel não é sábio por conta própria, mas por causa do seu Deus e da ação do Espírito.

Nabucodonosor convoca mais uma vez seus sábios para interpretar o sonho (Dn 4,6-7). Mas esta passagem difere do Dn 2, pois nela Nabucodonosor narra explicitamente seu sonho. Agora os sábios babilônicos têm sua chance – os livros dos sonhos estão abertos e os intérpretes estão prontos. Mas, para o grande descontentamento do rei, os sábios falharam novamente, mesmo depois que ele lhes contou seu sonho. Neste ponto, a narrativa aponta a total fraqueza dos sábios babilônicos. Por fim, Nabucodonosor chama Daniel, em Dn 4,8. Daniel agora é chamado de Beltessazar, por ter o espírito dos deuses. Mesmo na perspectiva de uma cultura idólatra, vê-se uma clara referência à ação sobrenatural da pessoa do Espírito, sendo uma explicação possível para a capacidade de Daniel interpretar os sonhos de Nabucodonosor.

Daniel e os sábios babilônicos colidirão mais uma vez, mas sob Belsazar (Dn 5). O rei celebra um grande banquete com utensílios consagrados do Templo de Jerusalém, saqueado por seu pai. De repente, os dedos de uma mão humana apareceram e escreveram na parede (Dn 5,5). Belsazar procura os encantadores, os caldeus e os feiticeiros (Dn 5,7), mas essa escrita enigmática não pode ser lida e interpretada por eles (Dn 5,8). Sua sabedoria falha mais uma vez, mas Daniel novamente consegue, justamente quando os sábios babilônicos não conseguiram (Dn 5,25-28). Daniel pode decifrar a escrita enigmática porque tem o “espírito dos deuses santos” (Dn 5,11). Em seguida, a rainha lembra Belsazar que foi por essa sabedoria de origem divina que Daniel foi promovido no Reino (Dn 5,12).

Na visão final do livro de Daniel, este tema de compreensão dos mistérios continua, mas é aplicado a muitos dentro de Israel. Dn 11,33 é o mais explícito: “Os sábios entre o povo ensinarão a muitos; todavia, cairão pela espada e pelo fogo, pelo cativeiro e pelo roubo, por algum tempo”, reiterado em Dn 12,3.10). Embora enigmáticos em vários níveis, é possível discernir que alguns dentro de Israel serão “sábios” e ensinarão o remanescente dentro de Israel (ou seja, os muitos). Pela narrativa do livro de Daniel, a o retrato de Daniel deve ser considerado como um dos sábios. O significado dessa conexão é que os israelitas justos serão todos, de alguma forma, pequenos Daniéis e entenderão a sabedoria de Deus sobre os eventos dos últimos dias.

Ao examinar-se, em alguns detalhes, a narrativa mais ampla de Daniel, salien- tam-se três aspectos: (1) A capacidade dada por Deus a ele de entender mistérios contrasta com os sábios babilônicos. Daniel consegue e eles falham; (2) a origem da capacidade de Daniel é atribuída explicitamente ao Espírito que habitava nele; e (3) nos últimos dias, os israelitas justos entenderão a sabedoria apocalíptica de Deus, pela capacitação do Espírito, como se desenhou em todo o livro.

Os Sete Espíritos em Apocalipse

Como explicado anteriormente, o prólogo de Apocalipse (1,1-4) é peculiar em alguns aspectos 76 . Deus e Cristo são mencionados em Ap 1,1. O Espírito não é mencionado até 1,4, dentro do trecho de saudação da carta às sete igrejas: “João, às sete igrejas que se encontram na Ásia, graça e paz a vós outros, da parte daquele que é, que era e que há de vir, da parte dos sete Espíritos que se acham diante do seu trono” (Ap 1,4). Segundo Monari, em Ap 1,4, há “uma saudação ‘trinitária’” 77 , ainda, “aqui tem a Trindade: esta saudação de paz e de graça vem do Deus uno e trino”78. O Espírito é apresentado, aqui, juntamente com Deus Pai e Cristo: “e da parte de Jesus Cristo, a Fiel Testemunha, o Primogênito dos mortos e o Soberano dos reis da terra” (Ap 1,5), um padrão encontrado em porções introdutórias em outros trechos do Novo Testamento.

O Espírito desempenha um papel proeminente em Ap 2–3, trecho que é pontuado por uma expressão repetitiva: “Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas” (2,7.17.29; 3,6.13.22). Essas referências ao papel do Espírito no processo de revelação são mais peculiares à luz da cadeia de comunicação já vista em Ap 1,1. Por que João omite o Espírito na cadeia de comunicação em Ap 1,1, mas o inclui proeminentemente nos capítulos seguintes, tem sido objeto de discussão 79 , porém uma compressão do Espírito no livro do Apocalipse auxilia no esclarecimento dessa questão. Referências explícitas ao Espírito tendem a ser agrupadas no livro do Apocalipse. O termo πνεῦμα (espírito) é encontrado vinte vezes no Apocalipse, sendo oito das quais nesses capítulos.

Determinar o significado dessas constatações não é uma tarefa óbvia. Uma pista é encontrada, no entanto, no início e no final de cada carta às igrejas da Ásia. Cada carta começa e termina de forma quase idêntica: “Ao anjo da igreja...” e “quem tem ouvidos ouça o que o Espírito diz às igrejas” (2,1.7; 2,8.11-12.17-18.29; 3,1.6). Cada carta é prefaciada com uma mensagem introdutória do Filho do Homem e culmina com o papel do Espírito na proclamação da carta. O Espírito permite a recepção da mensagem profética do Filho do Homem e ajuda a aplicar suas verdades às sete igrejas. É possível, assim, sintetizar essa configuração com a cadeia de comunicação em Ap 1,1: a revelação se origina de Deus, é mediada pelo testemunho de Cristo, que foi transmitida a um anjo, depois a João, e, por fim, às sete igrejas, as quais dependem da obra do Espírito para compreender e aplicar a revelação. Sem o auxílio do Espírito, as revelações seriam incompreensíveis 80 . Como comenta Bauckham, “o Espírito traz às igrejas a potente palavra de Cristo, repreendendo, encorajando, prometendo e admoestando, tocando e moldando os corações, mentes e consciências de seus ouvintes” 81 .

Um dos temas centrais do livro do Apocalipse é a admoestação para que as igrejas entendam as visões e seus símbolos (Ap 1,3). O macarismo de Ap 1,3 (“bemaventurança, felicidade”), μακάριος (bem-aventurado, feliz), o primeiro dos sete macarismos presentes no livro do Apocalipse (1,3; 14,13; 16,15; 19,9; 20,6, 22,7.14), é destinado àqueles que leem, ouvem e guardam as palavras da profecia apocalíptica 82 , ou seja, àqueles que a recebem com discernimento espiritual e aplicam em suas vidas as verdades contidas na revelação 83 . Além disso, o Apocalipse indica as pessoas divididas em seu comportamento e opções vitais, entre aquelas que seguem o Cordeiro e aquelas que seguem a besta. Pessoas que adoram o Cordeiro entendem a verdade sobre Deus e seu plano para o cosmos, enquanto que aquelas que adoram a besta são enganadas e acreditam em suas mentiras. Um elemento divisório entre esses dois comportamentos é a obra do Espírito na vida dos crentes. Sem a ajuda do Espírito, os crentes são incapazes de perceber os mistérios do Apocalipse. O título “sete Espíritos” (1,4; 3,1; 4,5) corresponde às sete cartas de Ap 2–3. O significado é que a mensagem do Apocalipse, como um todo, está ligada ao papel do Espírito em capacitar e aplicar suas verdades aos crentes.

O resultado dessas constatações em Apocalipse é bastante claro. O Espírito trabalha da mesma maneira no Apocalipse como no livro de Daniel. Em ambos os casos, o Espírito dá aos indivíduos a capacidade de compreender mistérios apocalípticos. Assim como a disputa entre Daniel e os sábios babilônicos, os crentes capacitados pelo Espírito no Apocalipse estão em forte contraste com aqueles incapazes de compreender e obedecer à verdade. Como mencionado antes, Dn 11 preconiza que os sábios ensinarão os muitos, ou seja, os israelitas justos. O Apocalipse retoma esse padrão, considerando João como um sábio que instrui os muitos, ou seja, as sete igrejas. Todos os crentes agora possuem a capacidade concedida pelo Espírito de compreender os mistérios divinos do Apocalipse (1Cor 2,6-16).

Conclusão

Conforme proposto inicialmente, foi desenvolvido o uso do livro de Daniel (Septuaginta) no livro do Apocalipse de João (NA28), notadamente na tecitura de seu modelo trinitário apocalíptico, seja mediante citações, alusões ou ecos, a partir dos critérios desenvolvidos por Gregory K. Beale, em seu Manual do uso do Antigo Testamento no Novo Testamento, e por Richard B. Hays, em Echoes of Scripture in the Letter of Paul, em diálogo com as discussões acerca do uso de Daniel em Apocalipse pelo próprio Gregory K. Beale, em The Use of Daniel in Jewish Apocalyptic Literature and in the Revelation of St. John, e por Steve Moyise, em The Old Testament in the Book of Revelation.

No Apocalipse, não há citação explícita do Antigo Testamento, mas apenas alusões e ecos. Aliás, trata-se do livro do Novo Testamento que possui, sem dúvida, mais alusões do Antigo Testamento, podendo ser tanto a partir de fontes bíblicas hebraicas como das gregas, e, em muitos casos, modificadas. Tendo presente as variadas opiniões dos estudiosos, há certa dificuldade em se chegar a uma precisão maior sobre as fontes empregadas pelo autor do livro do Apocalipse. Isto se dá justamente pelo fato de que em não se tratando de citação explícita, isso dificulta e muito checar a equivalência textual.

No livro do Apocalipse de João, pelo contrário, trata-se de um campo mais limitado para a análise, que é o fato de contar com alusão e/ou eco, o que dificulta averiguar e decidir com exatidão sobre uma possível fonte, pois não tem a mesma materialidade textual que se encontra em uma citação. Neste sentido, realmente não é tarefa simples realizar afirmações acerca da origem da fonte tomada pelo autor do Apocalipse para as alusões presentes em seu livro, se a partir de um texto hebraico ou da versão grega da Septuaginta, pois, sendo alusão e não citação, falta justamente a materialidade para se fazer a comparação entre os textos e ver seu possível uso no livro do Novo Testamento. Além disso, como visto e indicado, pode estar em jogo um uso livre e uma intenção teológica do autor de Apocalipse, que pode ter tomado a fonte do Antigo Testamento e usado de acordo com sua finalidade, modificando alguma coisa consciente e intencionalmente.

Seja pela dificuldade de se indicar com precisão a fonte usada, se a partir de um texto hebraico ou de um texto grego, seja pelo fato de que também pode existir uma intenção teológico no manuseio da fonte, constatou-se que o uso do livro de Daniel no livro do Apocalipse de João tem sido objeto de muitas discussões. O que é unânime nas discussões e reflexões, entretanto, é a preponderância da literatura daniélica na composição de parte da imaginação do livro do Apocalipse, e isto a tal ponto que, como se observou, alguns estudiosos consideram o livro do Apocalipse como sendo um Midrash sobre Dn 2 e 7 84 .

Talvez uma das razões para o alto grau de influência do livro de Daniel na composição de um modelo trinitário revelacional no livro do Apocalipse é que o autor, diante de toda a situação em que se encontravam os cristãos, lançou mão da literatura do livro de Daniel como melhor forma para descrever algumas de suas visões que eram difíceis de serem explicadas se não com a linguagem já usada no imaginário apocalíptico desse autor do Antigo Testamento (Daniel), a fim de descrever visões semelhantes no processo de revelação divina. O tipo de literatura fez com que o autor do Novo Testamento lançasse mão da literatura do Antigo Testamento, do mesmo gênero (apocalíptico) para se construir se pensando e dar uma base para sua visão trinitária da revelação, no contexto do final do século I.

O desenvolvimento do presente estudo possibilitou, portanto, uma análise de como o livro do Apocalipse empregou as alusões . ecos dos textos daniélicos para a concepção do seu modelo de revelação apocalíptica. De forma própria, Daniel esboça como as pessoas do Deus Uno e Trino relacionam-se umas com as outras no processo de revelação divina apocalíptica, particularmente em como Deus Pai revela mistérios apocalípticos; concede iluminação, pelo seu Espírito, para a compreensão de tais mistérios; e os executa através do Filho do Homem. São precisamente esses elementos do livro de Daniel dos quais o autor do livro Apocalipse faz uso, desenvolvendo-os, a fim de compor um modelo trinitário apocalíptico, no qual Deus se comunica com a sua Igreja.

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Notas

* Artículo de reflexión.

1 Osborne, A espiral hermenêutica: uma nova abordagem à interpretação bíblica, 412.

2 Beale, John’s Use of the Old Testament in Revelation, 77.

3 Moyise, The Old Testament in the Book of Revelation, 16.

4 Charles, A Critical and Exegetical Commentary on the Revelation of St. John. Vol. 1: International Critical Commentary, xviii–xxxi.

5 Beale, John’s Use of the Old Testament in Revelation, 79; Beale, “A Reconsideration of the Text of Daniel in the Apocalypse”, 539-543.

6 Manns, “Traces d’une Haggadah pascale chrétienne dan l’Apocalypse de Jean”, 265-295.

7 Beale e Gladd, Hidden but Now Revealed: A Biblical Theology of Mystery, 257-259.

8 A fim de se ter uma visão mais ampla do corpus joanino, indicamos a obra Gonzaga, “A acolhida e o lugar do corpus joanino no Cânon do Novo Testamento”, 681-704.

9 Bauckham, Jesus and the God of Israel: God Crucified and Other Essays on the New Testament’s Christology of Divine Identity, 18-32.

10 Gonzaga, “Ap 19,1-8: Profetismo na Liturgia”, 566-585.

11 Hays, Echoes of Scripture in the Letters of Paul, 29-32.

12 Gonzaga e Belem, “O uso retórico do Antigo Testamento na Carta aos Colossenses”, 5-6.

13 Beale, Manual do uso do Antigo Testamento no Novo Testamento: Exegese e Interpretação, 57-58.

14 Ibid, 13; Gonzaga e Belem, “O Uso Retórico do Antigo Testamento na Carta aos Colossenses”, 6-7.

15 Beale, Manual do uso do Antigo Testamento no Novo Testamento: Exegese e Interpretação, 53.

16 Gonzaga e Almeida Filho, “O uso do Antigo Testamento na Carta de Paulo aos Filipenses”, 1-18.

17 Beale, Manual do uso do Antigo Testamento no Novo Testamento: Exegese e Interpretação, 55.

18 Ibid., 56.

19 Ibid., 55-56.

20 Ibid., 56.

21 Beetham, Echoes of Scripture in the Letter of Paul to the Colossians, 20-24.

22 Ibid., 21.

23 Paulien, “Dreading the Whirlwind Intertextuality and the Use of the Old Testament in Revelation”, 9-10.

24 Bauckham, The Climax of Prophecy: Studies in the Book of Revelation, xi.

25 Beale, “The Use of the Old Testament in the Apocalypse”, 127-145.

26 Beale, John’s Use of the Old Testament in Revelation, 60-128; Beale, The Book of Revelation, 86-96.

27 Bauckham, The Climax of Prophecy: Studies in the Book of Revelation, 210-237.

28 A Bíblia Hebraica usada aqui para se fazer a comparação entre o texto hebraico e o grego, é a edição de Elliger e Rudolph (eds.), Biblia Hebraica Stuttgartensia (1997), a qual conttém o Texto Massorético, com a vocalização e sinais gráficos diacríticos de leitura.

29 Silva, “O Antigo Testamento em Paulo”, 79.

30 Beale, John’s Use of the Old Testament in Revelation, 61-62.

31 Ibid., 62.

32 Charles, A Critical and Exegetical Commentary on the Revelation of St. John. Vol. 1: International Critical Commentary, xvi-xxxii.

33 Moyise, The Old Testament in the Book of Revelation, 17.

34 Charles, A Critical and Exegetical Commentary on the Revelation of St. John. Vol. 1: International Critical Commentary, xvii.

35 Cimosa, “L’autore dell’Apocalisse hà usato la Bibbia Greca?”, 63-67.

36 Vanhoye, “L’utilization du livre d’Ezequie dans l’Apocalyse”, 436-476.

37 Lancellotti, “L’Antico Testamento nell’Apocalisse”, 369-384.

38 Gangemi, “L’utilizzazione del Deutero-Isaia nell’Apocalisse”, 109-144.

39 Marconcini, “L’utilizzazione del Testo Masoretico nelle citazione dell’Apocalisse”, 113-136.

40 Beale, John’s Use of the Old Testament in Revelation, 79. Midrash, termo judaico usado em relação à interpretação ou explicação de um texto. Refere-se ao processo pelo qual os antigos rabinos procuravam explicar o significado dos textos bíblicos ao povo judeu do período anterior ao Novo Testamento. A crença era que havia significados além dos que estavam obviamente determinados. Eles representavam a verdadeira ideia central de um texto; esse era o objetivo dos Midrash. Os mestres judeus empregavam tanto os padrões do Peshat (literal) quanto do Midrash (significado subjacente ao texto). Poderiam ser de dois aspectos: os oriundos da academia e concentrados nas regras para a vida diária, e os oriundos das sinagogas e concentrados nos caminhos do povo de Deus através de abordagens homiléticas. Havia ainda dois tipos de literatura: as obras de exposição, na forma de comentários sobre um texto, e homilias, que desenvolviam um tema ou assunto. As sete middoth ou regras de interpretação foram atribuídas, no Talmude, a Hillel (Osborne, A espiral hermenêutica: uma nova abordagem à interpretação bíblica, 415-416), um rabino em cuja escola tradicionalmente considera-se que se formaram Gamaliel e Paulo: “(1) Qal wachomer: O que é verdadeiro numa situação menos importante, também será verdadeiro numa situação mais importante. (2) Gezerah shawah: construindo uma família a partir de um texto — uma analogia verbal entre versículos significa que, se uma expressão é encontrada em mais de uma passagem, as mesmas considerações se aplicam a todas. (3) Binyan ab mikathub ‘ehad: Quando uma frase é encontrada em várias passagens, o significado de uma se aplica a todas. (4) Binyan ab mishene kethubim: Construindo uma família a partir de dois textos — quando um princípio for estabelecido relacionando dois textos, ele pode ser aplicado a outras passagens. (5) Kelal upherat: O geral e o particular — uma regra geral pode ser estendida em casos particulares, e, da mesma forma, uma regra particular pode ser estendida no geral. (6) Kayoze bo bemaqom ‘aher: Conforme encontrado em outro caso — uma dificuldade num texto pode ser resolvida pela comparação com uma passagem clara, que apresenta em geral aspectos similares. (7) Dabar halamed me’ inyano: O significado é estabelecido pelo contexto” (Osborne, A espiral hermenêutica: uma nova abordagem à interpretação bíblica, 416; as sete regras de Hilles podem ser conferidas na obra Schnelle, Introdução à Exegese do Novo Testamento, 152-153, inclusive com seus nomes em hebraico).

41 Boring, Apocalisse, 84; Corsini, O Apocalipse de São João, 73-74.

42 Vanni, Apocalisse di Giovanni 2, 33.

43 Prigent, O Apocalipse, 110.

44 Pikaza, Apocalipsis 17, 35; Beale, The Book of Revelation, 181-183.

45 Boring, Apocalisse, 87.

46 Ver Rahlfs e Hanhart (eds.), Septuaginta. Editio Altera.

47 Ver Nestle-Aland, Novum Testamentum Graece (ed. XXVIII).

48 Ibid., 37.

49 Pode-se constatar que δείκνυμι ocorre outras seis vezes em Apocalipse (4,1; 17,1; 21,9; 22,1,6,8). O termo adquire significado teológico nos casos em que Deus é o sujeito, sugerindo o sentido de “revelar” ou “tornar conhecido” na Septuaginta: Dn 9,23; Gn 41,25; Nm 23,3; Dt 5,24; 2Rs 8,10; Am 7,1 (Quell,“Deiknymi”, 640-641).

50 Pohl, Apocalipse de João, 63; Pérez Millos, Comentario Exegético al Texto Griego del N.T Apocalipsis, 53-54; Osborne, A espiral hermenêutica: uma nova abordagem à interpretação bíblica., 59-60.

51 Gonzaga, “‘Nascido de Mulher’ (Gl 4,4)”, 1194-1216

52 O termo “δίδωμι (dar, conceder) assume um uso levemente técnico em Apocalipse, particularmente entre os capítulos 6 a 21. Na maioria das ocorrências, Deus é o sujeito explícito ou implícito do verbo. Muitas vezes aos inimigos de Deus é dada (sujeito implícito com a voz passiva) autoridade para executar alguma forma de julgamento (Ap 6,2.4.8; 7,2; etc.). Esta observação é significativa pela razão de que o verbo está ligado ao poder soberano inigualável de Deus. Portanto, as visões contidas no Apocalipse foram dadas por Deus, que possui sabedoria e poder incomparáveis.

53 Beale, The Book of Revelation, 154.

54 Beale e Gladd, Hidden but Now Revealed: A Biblical Theology of Mystery, 20-43.

55 Beale, The Use of Daniel in Jewish Apocalyptic Literature and in the Revelation of St. John, 186-169.

56 Vanni, Apocalisse di Giovanni 2, 34.

57 Prigent, O Apocalipse, 110.

58 Para uma análise sobre o uso especializado de ֵּפֶשׁר (pešǎr) na linguagem escatológica daniélica, ver Koehler e Baumgartner (orgs.), The Hebrew and Aramaic Lexicon of the Old Testament. Vol. 5: Aramaic .

59 Pohl, Apocalipse de João. Vol. 1: Comentário Esperança, 60-61.

60 Beale, The Book of Revelation, 1124-1126.

61 Biguzzi, Apocalisse. Nuova introduzione e comento, 59; Pérez Millos, Apocalipsis. Comentario exegético al texto griego del Nuovo Testamento, 51.

62 Osborne, Apocalipse. Comentário Exegético, 57.

63 Kistemaker, Apocalipse. Comentário do Novo Testamento, 106.

64 Aune, Apocalipse 1-5, 15

65 Ver Rahlfs e Hanhart (eds.), Septuaginta. Editio Altera.

66 Nestle-Aland, Novum Testamentum Graece (ed. XXVIII).

67 Corsini, O Apocalipse de São João, 75-76.

68 Keener, Comentário Histórico-Cultural da Bíblia: Novo Testamento, 858.

69 Ladd, Apocalipse. Introdução e Comentário, 17-20.

70 Pérez Millos, Apocalipsis. Comentario exegético al texto griego del Nuovo Testamento, 51; Osborne, Apocalipse. Comentário Exegético, 57.

71 Bauckham, The Climax of Prophecy: Studies in the Book of Revelation, 135.

72 Monari, Apocalisse, 15-16.

73 Walton, Matthews e Chavalas, Comentário Histórico-Cultural da Bíblia: Antigo Testamento, 942-943.

74 Collins, Daniel: A Commentary on the Book of Daniel (Hermeneia: A Critical & Historical Commentary on the Bible), 144.

75 Em Israel, no período do Antigo Testamento e do Novo Testamento, e em outros lugares do Antigo Oriente Próximo, os sonhos aparecem tanto como experiências humanas comuns quanto como meios de comunicação divina. Deste último tipo, alguns trazem uma mensagem direta e verbal, enquanto outros transmitem a mensagem em símbolos que exigem interpretação. Para sua interpretação, pode ser necessária uma revelação divina adicional, a intuição de um adivinho ou as coleções de presságios onirológicos que podem fornecer um precedente relevante. Nem Israel nem outras culturas dão aos sonhos um lugar central como meio de comunicação divina, mas também não assumem uma atitude negativa em relação ao fenômeno como tal. Schnittjer, Old Testament Use of Old Testament: A Book-by-Book Guide, 617, nos recentes estudos sobre o uso do Antigo Testamento no próprio Antigo Testamento, avalia que Dn 2,28-29 é uma alusão a Gn 41,25.28.32, ao retomar o papel destacado da revelação divina por sonhos. A convocação dos sábios por Nabucodonosor implica que se supõe que o sonho real seja de importância estatal, não meramente que ele seja perturbado por um sonho privado comum. Sua suposição é paralela às implicações de relatos de outros sonhos reais no Antigo Oriente Próximo, incluindo o do Faraó no Antigo Testamento (Gn 41). É responsabilidade dos sábios interpretar sonhos de vários tipos para o rei e aconselhá-lo sobre como evitar qualquer infortúnio ameaçado por eles. Seu papel na Babilônia é paralelo ao dos profetas em Israel, como em 2Rs 23 (Goldingay, Daniel, 196).

76 Fiorenza, Apocalipsis. Visión de un mundo justo, 63.

77 Monari, Apocalisse, 14.

78 Ibid., 15.

79 Bauckham, The Climax of Prophecy: Studies in the Book of Revelation, 92-117; Beale, The Book of Revelation, 236-239.

80 Em Ap 13,18, João sugere mais uma vez o papel do Espírito na compreensão das visões: “Aqui está a sabedoria. Aquele que tem entendimento calcule o número da besta...” (vide também Ap 17,9: “Aqui a mente que tem sabedoria...”). Isso se assemelha à insistência no livro de Daniel, de que somente aqueles que possuem o “Espírito” de Deus compreendem a sabedoria divina.

81 Bauckham, The Climax of Prophecy: Studies in the Book of Revelation, 161.

82 Vanni, Apocalisse di Giovanni, Vol. 2, 39; Biguzzi, Apocalisse. Nuova introduzione e commento, 61; Boring, Apocalisse, 86; Ladd, Apocalipse. Introdução e Comentário, 20.

83 Mounce, The Book of Revelation, 43; Pikaza, Apocalipsis 17, 36; Prigent, O Apocalipse, 116.

84 Beale, John’s Use of the Old Testament in Revelation, 79.

Autor notes

a Autor correspondente: Waldecir Gonzaga. Correio eletrônico: waldecir@hotmail.com

Informação adicional

Cómo citar: Gonzaga, Waldecir, e Leandro dos Santos Ribeiro. “O uso de Daniel na composição do modelo de revelação no apocalipse de João”. Theologica Xaveriana vol. 74 (2024): 1-29. https://doi.org/10.11144/javeriana.tx74.udcmr

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